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Cego Aderaldo

 

Alguma notícia da poeta:

  1. Um ensaio de Mário Pontes

  2. Prefácio de Raquel de Queiroz

  3. Peleja com o Zé Pretinho dos Tucuns

  4. Contracapa do livro "Eu sou o Cego Aderaldo"

  5. Biografia, causos, cantorias e presepadas:contados por ele mesmo

 

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Raquel de Queiroz

APRESENTAÇÃO
DO LIVRO "EU SOU O CEGO ADERALDO"
ED. MALTESE, 1994
 

CEGO ADERALDO: 

 

É como ele se assina: Cego Aderaldo. Creio até que registrou a marca, pois é como “Cego Aderaldo” que o povo o conhece e ama.

O último dos grandes cantadores – hoje já não se conhecem cantadores como ele foi e como ele é. Ou se os há de inspiração idêntica, as novas gerações, distraídas com a música comercializada do rádio, com os cantores enlatados, já não os idêntica, as novas gerações, distraídas com a música comercializada do rádio, com os cantores enlatados, já não os identificam nem lhes conferem esse halo de glória que nimbava os famosos cantadores do passado.

 Hoje, o prestígio da profissão de cantar improvisado, á rebeca ou á viola, e cantar e, desafio, vai diminuindo, em vias de desaparecer. Só maldo como causa a música dos rádios, que, através dos transistores, chega até aos lugares mais escondidos do sertão.

Onde nunca chegou trem, ou ainda não chegou automóvel nem avião, o rádio já chega. E fica, e grita, e enerva. E porque não tem mais esperança de fama, os moços de inspiração não se dedicam a cantar, não estimulam a veia poética nem se apuram  na escola dos desafios.

Nessa decadência geral do oficio de cantador, cego Aderaldo mantém, contudo, o seu prestígio intacto. O povo o adora, o cerca e o festeja onde quer que ele vá. Quando chega a uma fazenda, venha embora o cego sozinho com seu guia, é como se com ele houvesse começado a novena, os foguetes e o leilão.

Aderaldo sentar-se e começa a cantar e até comove ver como a gente o cerca, e ri com ele, e lhe bebe as palavras.

Não aplaudem porque sertanejo não está habituado  aplaudir: o artista tem que pressentir, no silencio emocionado que se segue ao se trabalho, o grau de aprovação que suscitou.

Aderaldo é hoje um velho de mais de oitenta anos, espigados, rijo, fala sonora de homem habituado a dominar auditórios.

Tem o riso muito fácil – é um cego alegre. Seu repertório, porque os cantadores não apenas improvisam, mas também cantam versos de lavra alheia, especialmente os da musa popular - seu repertório, com poucas exceções, é bem humorado, quase humorístico.

Isso se verá, aliás, nas páginas adiante, onde o Cego Aderaldo conta a sua vida e dá uma mostra de sua poesia.

Sei que é muito difícil por num caderno de lembranças essa coisa ilusiva e perecível que é a arte de um cantador.

A palavra impressa, coisa de medida, de premeditação e efeito calculado, não conseguirá transmitir ao leitor o impacto produzido pela ação de presença, pela mágica do improviso, pela música do acompanhamento, pelo embalo da cantoria; mas ao menos registrar um pouco, para não perder tudo.

Pelo menos isso – memória da vida, fragmentos de desafios e romances – nos guardado de tudo que ele espalhou por aí em mais de sessenta anos de cantoria. É um documento da sua passagem, uma referencia para futuros estudiosos, e uma pre texto de aproximação e reconhecimento para o povo que o ama e que, quando um dia o perder, gostará de conservar ao menos uma parte dos tesouros lançados ao vento dos desafios, aos pequenos auditórios longínquos e memória, ao caso, das peregrinações do violeiro e cantor.

 

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CONTRACAPA DO LIVRO
EU SOU O CEGO ADERALDO
ED. MALTESE, 1994

Aderaldo Ferreira de Araújo é uma legenda de cantoria nordestina. Cego, tradição de um Homero ou de um Tirésias, cumpriria o destino traçado pelos deuses de ser privado da visão para ser apenas voz. Mas que conheceu a luz e a cor até aos 18 anos.

É a permanência da oralidade que está em foco.
Seu cantar flui, interminável, como uma litania sertaneja.
Ele está sempre apto para a peleja. Maneja voz e viola como armas, com uma destreza de mestre.

O sertão inteiro repete, ainda, de cor, o seu improviso e sabe histórias de repentes com a marca do gênio.
Os grandes nomes da cantoria cantam com ele. Até mesmo pegas que nunca existiram ganharam transmissão oral ou foram transcritos para folhetos de cordel.

Um cego andarilho, que não vendia histórias, papel reservado a eles na tradição européia, mas que ganhava a vida como um “performer” medieval.

O importante não era apenas o que ele dizia, mas como dizia, a eloqüência da voz, ao artifícios da retórica, a verve de quem sempre tinha um argumento a mais para exibir no ultimo instante e fazer calar o rival.

O Cego Aderaldo foi o maior jogral que o Nordeste já teve. E este livro é um esforço de registrar o que se perderia no eco das palavras ou que se transformaria em sementes na recriação deste canto que é de homem e ao mesmo tempo de todas as vozes sertanejas. Um livro para ser lido em voz alta.
Nos mercados, nos patamares das igrejas em tempo de festas, nos terreiros das fazendas, ainda se faz ouvir o tom plangente de sua viola e o matraquear de sua poética.
Aderaldo está cada vez mais vivo no coração e na lembrança de todos os que sabem puxar os fios e tecer essa histórias feita de mil-e-uma noites de rimas, ritmo e agilidade. É um saber tradicional que se cristaliza e se torna monumento feito de palavras e sons.

 

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MÁRIO PONTES

O Cego, a viagem, o vôo
 
"...lança-te para cima, livre como o ar,
tornar-te-ás matéria de liberdade."
(Gaston Bachelard, L’Air et les Songes)
 

Meu pai, de profissão marceneiro, sabia fazer muitas coisas belas e boas, entre elas instrumentos musicais: violões, cavaquinhos, rabecas, bandurras. Certo dia — eu teria então cinco anos — parou à porta de sua oficina um homem alto e forte, chefiando uma pequena caravana. Um dos membros do grupo segurava-lhe a mão, guiando seus passos incertos pela rua esburacada. Os outros seguiam-no, e todos eram jovens, à exceção do próprio homem alto, cujo rosto começava a envelhecer. Ele se protegia do sol com um chapéu de abas largas, escondia os olhos atrás de vidros negros e, como os demais, trazia a tiracolo um instrumento musical. Quando meu pai perguntou com quem falava, o desconhecido respondeu numa voz que daria para ouvir-se a cem metros de distância:

— Com o Cego Aderaldo.

Tão forte a emoção se estampou no rosto de meu pai, ao se saber honrado com a visita do lendário cantador, que até eu, uma criança, pude notar sua perturbação. Aderaldo explicou que viera trazer-lhe uma rabeca para conserto: instrumento de estimação, presente já antigo de um admirador. Meu pai tomou carinhosamente a rabeca em suas mãos de artesão, examinou-a com olho crítico e prometeu fazer o que estivesse ao seu alcance. Dias depois o cego veio apanhar o instrumento: e satisfeito por reencontrar a qualidade do som original, perguntou quanto devia pelo trabalho.

— Nada — respondeu meu pai.

Corno o cego insistisse, meu pai propôs que, em pagamento, fosse fazer uma cantoria na pequena fazenda, a uns 3O quilômetros da cidade, onde viviam sua mãe e vários dos seus irmãos, quase todos notavelmente dotados para a música. Aceita a forma de pagamento, para lá nos dirigimos, meu pai, eu, Aderaldo e sua pequena comitiva de músicos ambulantes. E de todas as viagens que fiz em minha vida, aquela foi a única realmente inesquecível: a que permaneceu não como uma viagem que foi, mas ainda é; não como uma lembrança, mas como um sonho que continua.

Íamos a cavalo, por uma estrada obediente aos caprichos do terreno, contornando colinas, estirando-se por várzeas arenosas. Cada vez que o caminho vencia uma elevação e desembocava numa pequena planície, os cavalos lançavam-se a galope. por puro gosto, por pura vontade de chegar ao término da viagem — e nessas ocasiões eu não podia despregar os olhos de Aderaldo. A princípio, por medo de que algum mal lhe sucedesse; depois, por simples deslumbramento. Andasse o cavalo como andasse, ele permanecia firme e elegante na sela — e mais que firme, indisfarçavelmente feliz com o vento a bater-lhe no rosto, a rapidez e o ritmo ondulante do galope.

Aliás, iam todos alegres: todos falavam, riam, contavam histórias, faziam piadas. E sempre que alguém dizia qualquer coisa que o cego julgasse interessante, suas palavras eram apanhadas como mote e imediatamente glosadas com improvisos. Aderaldo improvisou sobre muitas e muitas coisas: sobre o perfume dos imbuzeiros que ladeavam a estrada; sobre o pio assustado de aves que fugiam do tropel; sobre o seu chapéu que em determinado momento foi arrancado pela ventania e rolou muitos metros pela estrada — e quando a noite desceu, sem luar porém rica de milhares de estrelas, improvisou sobre a Via Láctea, que não podia ver, mas cujo curso, ele bem sabia, orientava a nossa caminhada.

Rindo, galopando e improvisando, Aderaldo era a imagem da liberdade. Decerto, estava acorrentado pelas cadeias de sua cegueira; mas, como Prometeu, era no alto de um monte a que fora acorrentado - muito acima de nós, lá onde não podíamos chegar, e tinha a cabeça erguida e os olhos da voltados para regiões ainda mais elevadas e de acesso ainda mais difícil. Nós, os que enxergávamos, tínhamos consciência da terra sob as patas dos nossos cavalos. Para ele, ao contrário, a terra não era uma prisão: quando o seu cavalo se lançava a galope era nos ares que galopava, era pelo altíssimo Caminho de São Tiago que galopava. E foi assim, quase fantástico, que eu o retive na memória.

O que retive na memória, do visto naquela viagem, creio agora que foi a própria encarnação da poesia do povo nordestino. Essa poesia pode, naturalmente, ser pensada de muitos ângulos; mas para o que no momento me interessa, importa constatar, antes de tudo, que para a ela a terra também é estranha, a terra como símbolo de imobilidade, de duro realismo, de rigidez falsamente racional. Como Aderaldo, ela pode ser cega, mas é num corcel fogoso que cavalga, um corcel cuja marcha normal é o galope disparado.

Eu diria, pois, que ela é sobretudo uma poesia do movimento. Poesia da viagem. E do vôo.

Nada é estático na poesia dos Aderaldos. Tudo nela é dinâmico, em particular a narrativa, que freqüentemente se move em ziguezague, tomando por veredas e caminhos secundários, num alegre desconhecimento — eu ia dizer: desprezo — das estradas reais da coerência.

Muitas vezes, o começo do poema é a captação de um movimento já em curso:

                        Quando Jesus e São Pedro
                        pelo mundo viajaram
                        em casa de um ferreiro
                        uma tarde eles chegaram...

                      
                                (Francisco Sales Areda: Jesus,
                                São Pedro e o Ferreiro da Maldição)
 

Em outros, o próprio poema dá início ao movimento:

                        Para me certificar
                        da Morte de Lampião
                        arrumei o matulão
                        andei para me acabar...

                                (José Pacheco: O grande
                                Debate de Lampião com São Pedro)
Se a Primeira estrofe é uma introdução, uma sinopse da história ou unia "invocação às musas", o movimento virá na estrofe seguinte:
                        Tudo se deu com um moço 
                        do Rio Grande do Norte 
                        que foi para o Amazonas 
                        para melhorar de sorte...

                        (Manoel Camilo dos Santos.


                                São  Francisco  do Caníndé
                                um Grande Milagre)

Mesmo quando o poema obedece (casualmente, é certo) às clássicas unidades de tempo, lugar e ação, a força que dispara é movimento anterior, e freqüentemente o final é apenas o descer do pano sobre um movimento que continua. Uma peleja entre contadores parece à primeira vista estática: apresenta-nos duas pessoas sentadas, uma diante da outra, a dedilhar violas e fazer improvisos. Mas ainda que consideremos apenas esse aspecto exterior, a peleja será simples pausa de um movimento que chegou até aqui e que prosseguirá não se sabe onde. Nem Riachão nem o Negro com quem trava o seu famoso duelo eram de Assu; estavam apenas de passagem pela cidade onde se deu o encontro. No folheto em que narra sua peleja com Zé Pretinho (real ou imaginária, não importa) Aderaldo começa por informar:

                        Um dia determinei 
                        a sair do Quixadá 
                        fui até ao Piauí ver 
                        os cantores de lá.
Severino Milanez não é de Floresta, e também não é de lá o seu adversário Manoel Raymundo; Severino Simeão e Ana Roxinha não são de Petrolina, onde se batem; Severino Borges e a Negra Furacão vieram de longe para cantar no município de Bom Jardim. E assim em todas as pelejas. Terminado o desafio, os cantadores põem o pé no caminho e vão em busca de nova aventura, que este é o seu destino de menestréis: mover-se.

E que dizer da dinâmica interna da peleja? Para bem compará-la, seria necessário evocar a tempestade. O seu começo é, em geral, lento e quase frio. com os dois cantadores fazendo as "louvações" de estilo, exaltando as virtudes do dono da casa que os acolheu, as virtudes e a beleza da senhora e suas filhas, a amabilidade dos espectadores que vieram de longe para vê-los, ouvi-los, aplaudi-los, decorar seus versos e repeti-los pelo sertão afora, num movimento de expansão circular do ato criador. Em dado momento, cessa o capítulo dos louvores e um dos dois julga chegada a hora da provocação. Atirada a luva, o adversário se agita, agita-se o público, um arrepio nervoso percorre as cordas das violas. A cantoria sobe de temperatura, vai ganhando um novo ritmo. Antes que os ouvintes tenham tempo de habituar-se a essa segunda velocidade do vento poético, uma terceira é inaugurada - salta-se da meia-quadra para o quadrão, deste para o beira-mar, formas progressivamente mais complicadas de poesia — e assim até a peleja adquirir características de furacão, resolvendo-se não com um lento retorno à calmaria, mas com o súbito e necessário naufrágio de um dos contendores.

Poesia da viagem. O Camões de Severino G. de Oliveira (As Perguntas do Rei e as Respostas de Camões) aos sete anos de idade:


                        Começou a viajar
                        pelo mundo abertamente...
e é por isso que se transforma num sábio, capaz de conhecer o passado das pessoas e até de profetizar o seu futuro. Certas pelejas, como a de Manoel Xudu versus Severino Pereira e a de Zé Monteiro versus Cachimbinho, são verdadeiros tratados de Geografia (arrevesada e incorreta, é verdade) através dos quais se expressa o anseio de conhecer todos os acidentes e conviver com todos os povos. E como ocorre nas pelejas, nos romances também não há fronteiras, as histórias se passam nos lugares mais distantes e exóticos — O Pavão Misterioso, na Grécia; o drama de Aprígio Coutinho e Neusa, no Japão.

É viajando que o poeta vem a saber dos casos e conhecer aqueles que os viveram:

                Tenho visto muitas coisas 
                nesta vida de ambulante 
                e vendendo meus folhetos 
                já tenho andado bastante. 


                                (José João dos Santos, Azulão: Os
                                Matutos na Feira)


                O homem quando vigia
                sempre encontra presepadas...


                                (Manoel de Assis Campina: Discussão
                                de um Fiscal com uma Fateira)



                E viajando este mês 
                pela linha do Agreste 
                fui parar numa feira... 


                               (Vicente Vitorino: Discussão
                               (de um Crente com um  Cachaceiro)

Todo personagem importante do romance de cordel está partindo ou chegando. A ação sempre dispersa os atores ou, como um catalisador, os atrai para o centro do drama. A celebridade do boi do coronel Sesinando (O Boi Misterioso, de Leandro Gomes de Barros) traz à sua fazenda vaqueiros dos mais distantes lugares. Um deles vem de Minas Gerais, o que, considerando-se os meios de comunicação e os sistemas de transporte da época em que se passa a história (início do século XIX) é quase uma odisséia, dois mil quilômetros de distância. Mas não tinha aventura impossível para a imaginação do poeta, que, como o próprio boi por ele criado, não admite peias nem currais.

Viajar é preciso. Para saber e agir é preciso viajar. Os próprios espíritos, quando querem comunicar-se entre si, deslocam-se de suas moradas. Para falar com Deus, o Diabo é obrigado a sair dos "antros negros da terra" e viajar até às alturas. Trata-se, certamente, de uma viagem longa e cansativa, pois só de tempos em tempos a empreende:
                Em quarenta o Satanás 
                foi ao céu ligeiramente 
                do que havia no mundo 
                ele a Cristo fez ciente 
                e agora resolveu 
                fazer queixa novamente
informa José Vila-Nova em Segunda Queixa de Satanás a Cristo, escrita muitos anos depois da primeira.

Viagens com as mais diferentes finalidades, ou mesmo,sem finalidade. Viagens iniciatórias, muitas vezes, plenas de peripécias e dificuldades, de perigos e obstáculos que se ,avolumam à medida em que o herói se aproxima de seu destino. onde o esperam, finalmente, o amor, a felicidade ou o conhecimento. Viagens para a liberdade, quantas! Raptos de donzelas que são perseguidas pelo pai tirânico, destinado no final a ser humilhado em seu orgulho (p. ex., Mariquinha e José de Souza Leão). Bem sucedidas fugas de heróis solitários e sempre nômades, que conseguiram derrotar, com inteligência e bravura, a força de latifundiários malvados (p. ex., Zé Mendonça, o Sertanejo Valente) Fugas desesperadas de.jovens amorosos, contra os quais se levanta não apenas o ódio dos homens, mas também a fúria dos elementos, transformando longo trecho de sua vidas em uma luta constante com a morte (p. ex., as intermináveis peripécias de Aprígio e de Alonso).

Viagens por terra, a pé, a cavalo. em veículos antigos ou modernos; lentas. com paradas freqüentes, ou às carreiras, em disputa com o tempo sempre inimigo da integridade física e da liberdade do herói. Viagens por mar, entre portos de um mesmo país da terra natal ao estrangeiro, do lar ao exílio, dos campos aos campos da guerra, do familiar ao exótico, do certo ao duvidoso, do aqui ao fim do inundo, do presente ao passado do longínquo ao futuro. Viagens às montanhas, ascensão aos lugares elevados, onde está a salvação e às vezes a realização do senhor. Como voam os personagens do romance de cordel! Com que facilidade e prazer os seus corpos se libertam do peso da gravidade.

Poesia do vôo, portanto. Quase obcecados pelo vôo, eles usam de todos os recursos para se elevarem acima da terra e se deslocarem com rapidez através das distâncias, por maiores que sejam. Voam escanchados no dorso de pássaros, como João Cambadinho na última etapa de sua longa peregrinação em busca do Reino do Miramar, onde o aguarda uma princesa que prometeu ser sua mulher. Cambadinho, que apesar de sua ignorância de pastor de cabras aspira as alturas e estremece de alegria ao ver montes azuis no horizonte., pois sabe que eles representam a luz e e são a morada natural daqueles que podem voar.

Não havendo pássaros de carne e de penas, os heróis recorrem à habilidade dos mecânicos e voam com o auxílio de máquinas engenhosas. Tão engenhosas. às vezes. que apesar de criados há dezenas de anos por poetas semi-analfabetos até hoje não puderam ser de fato construídos pelos técnicos em aeronáutica. Como o já referido pavão de João Martins de Athayde:

                que levantou vôo da Grécia 
                com um rapaz corajoso 
                raptando uma condessa 
                filha de um conde orgulhoso.

Belo pássaro de metal, que além do inusitado da forma tinha toda uma série de vantagens sobre os aviões convencionais: era movido a eletricidade, não fazia ruído, não trepidava, podia ser desarmado com um simples toque de botão, decolava verticalmente, descia com suavidade no teto de uma casa qualquer, era rápido como uma flecha e 

                voava igual ao vento
                para qualquer direção.

E se não houver aeronaves fantásticas? E se não for possível construir uma com a leveza do alumínio? Nem por isso o herói deixará de voar. Tudo o que ele necessita é de uma rica, poderosa e ardente imaginação, pois esta se encarregará alegremente de prover o transporte para qualquer tipo de viagem. Para ter a certeza da morte de Lampião, José Pacheco percorre as sete partes do mundo, e chegando à conclusão de que o cangaceiro já não se encontra na face da Terra, solta as asas da criatividade a fim de continuar a busca:

                ... atravessei os mares 
                montado em um planeta 
                que ao som de uma trombeta 
                vinha descendo dos ares 
                visitando aqueles ares 
                terra de santos e fadas... 

                        (O Grande Debate de Lampião com São Pedro)
Por meios e caminhos semelhantes, José Camilo dos Santos voou até a sua ilha da felicidade, o País de São Saruê, aonde o manda Mestre Pensamento. Para lá chegar, o poeta viaja sucessivamente no "carro da brisa", no "carro do mormaço" e nas costas da "neve fria". É voando que se pode chegar ao lugar onde rompe a "nova aurora".

Poesia do movimento, da viagem, do vôo. Poesia da imaginação sem travas e sem fronteiras. Poesia da liberdade, apesar de tudo o que se opõe à liberdade. Presa pelas cadeias da cegueira, da pobreza, do analfabetismo, das superstições, do preconceitos — é certo, mas não a um rochedo imóvel e sem vida, e sim ao lombo de um cavalo fogoso, cuja marcha normal é o galope e cujo roteiro preferido é o altíssimo Caminho de São Tiago.

 

 

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