Camilo
Martins Neto
Um saco para comprar carvão e
algumas chicotadas
Presentes de natal
Era cedo da
manhã, eu, meus irmãos e meus primos, brincávamos, felizes da vida,
com os brinquedos de natal que havíamos ganhado dos nossos pais e
tios.
Havia tempos que
não ganhávamos brinquedos de verdade, tendo que nos contentar em
fazer nossos próprios brinquedos... “Carrinhos” feitos de latas de
sardinhas com rodas de borracha de chinelos velhos ou “carretas
tanques”, que eram feitas com latas de óleo vazias ou ainda
“cavalinhos de pau”, “espadas” feitas de madeiras, daí era só pegar
um lençol amarrar no pescoço e pronto, estava feita a capa e a
brincadeira de zorro, Super-Homem, ou até mesmo ir até o rio
parnaíba, que ficava a três quadras abaixo de nossas casas, gritar
de cima de uma enorme pedra à beira do rio, feito o Tarzan dos
filmes e mergulhar nas águas gostosas do nosso rio, o que sempre era
arriscado e perigoso, dentre tantas outras brincadeiras... Criança
tem muita imaginação!
Mas, naquela
manhã era diferente! Tínhamos brinquedos mesmo! Lindos carrinhos,
tinha até um de fricção, ah, que emoção! Havia sorriso em todos os
rostos e a brincadeira se prolongou por muitas e felizes horas, não
lembrávamos nem da hora das refeições!
No entanto, não
foi por isso que aquele Natal se tornou inesquecível, pois um fato a
certa altura da brincadeira me chamou a atenção e eu nunca pude
esquecê-lo, um fato comovente e real, que me marcou muito e olha que
já faz tempo e foi muito longe daqui, lá no meu pobre Piauí.
Havia um garoto
pobre que morava na outra rua, não tinha pai e a mãe havia perdido o
filho mais velho, que lhe auxiliava, mas que caiu e afogou-se,
enquanto estavam no rio pescando, pois era o que ela fazia para
sustentar a família, ela era pescadora e chamava-se D.Tinoca, eu me
lembro muito bem dela, pois muitas vezes eu ia lá na sua casa
comprar ou às vezes pedir( pois, éramos pobres também ) peixes para
a nossa família.
Vicente, o
garoto pobre, estava passando por nossa rua com um saco de estopa
nas costas e quando nos viu brincando, com os olhos brilhantes de
admiração, parou e ficou ali a nos observar as brincadeiras...
Quando eu o notei ele já deixava cair algumas lágrimas, então eu
comovido perguntei:
- O que aconteceu, Vicente?
- Nada, não! – foi a resposta.
- Mas, porque então você está chorando? É porque você não ganhou um
presente de natal? – insisti com Vicente já com os meus olhos cheios
d’água também
- Sabe, - disse ele – tudo o que eu ganhei foi este saco de estopa
vazio para ir comprar carvão e acender o fogo lá em casa e algumas
chicotadas nas costas, porque eu não queria ir comprar esse bendito
carvão!
Depois que ele
disse isso, ia saindo cabisbaixo e chorando baixinho, meus amigos
que observavam o diálogo sorriram, pois foi até engraçado a maneira
como ele falou e seria cômico, se não fosse real, então eu,
comovido, corri ao seu encontro e dei para ele um dos meus carrinhos
que havia ganhado de presente, sem dizer nada, meus primos e amigos
ficaram com “cara de goiaba com tosse”, como diria a Emília, do
sítio do pica pau amarelo, pois não acreditavam no que viam, logo
eu, que gostava tanto de carrinhos e de brincar e há tempos não
ganhava um brinquedo de verdade e agora dar aquele brinquedo... e o
Vicente saiu em disparada, mas, tão rápido que em segundos eu não o
vi mais e eu fiquei tão feliz com aquela cena que parecia que tinha
sido eu a ganhar o presente. E quando os meus pais souberam o que eu
tinha feito, pois todos os meus amiguinhos tinham visto e ouvido e
foram contar à eles, me deram mais brinquedos e eu brinquei mais
ainda e contente por ter deixado uma criança também muito contente.
Como disse São Francisco de Assis: é dando que se recebe.
E você, vai
fazer alguém feliz neste NATAL? Lembre-se: as coisas boas a gente
nunca esquece! Mesmo que tenha acontecido quando éramos ainda
criança! Há muito tempo.
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