Conceição Lima
Uma língua
é o lugar
donde se vê
o mundo
Vergílio Ferreira
Vozes 
Poéticas da 
Lusofonia
Na minha língua...
cada verso é uma
outra geografia.
Manuel Alegre
 
Conceição Lima

Quando o luar caiu

 


Quando o luar caiu e
tingiu de escuro os verdes da ilha 
cheguei, mas tu já não eras.

Cheguei quando as sombras revelavam 
os murmúrios do teu corpo 
e não eras.
Cheguei para despojar de limites o teu nome.
Não eras.

As nuvens estão densas de ti 
sustentam a tua ausência 
recusam o ocaso do teu corpo 
mas não és.

Pedra a pedra encho a noite 
do teu rosto sem medida 
para te construir convoco os dias 
pedra a pedra 
no teu tempo consumido.

As pedras crescem como ondas 
no silêncio do teu corpo. 
Jorram e rolam 
como flores violentas.
E sangram como pássaros exaustos 
no silêncio do teu corpo 
onde a noite e o vento se entrelaçam 
no vazio que te espera.

Súbito e transparente chegaste 
quando falsos deuses subornavam o tempo, 
chegaste sem aviso 
para despedir o defeso e o frio, 
chegaste quando a estrada se abria 
como um rio,
chegaste para resgatar sem demora o principio.

Grave o silêncio agarra-se ao teu corpo, 
hostil o silêncio agarra-se ao teu corpo 
mas já tomaste horas e caminhos 
já venceste matos e abismos
já a espessura do obô resplandece em tua testa.

E não me bastam pombas dementes no teu rosto 
não bastam consciências soluçante em teu rasto 
não basta o delírio das lágrimas libertas.

Cantarei em pranto teu regresso sem idade 
teu retorno do exílio na saudade 
cantarei sobre esta terra teu destino de rebelde.

Para te saudar no mar e no palma 
na manhã dos cantos sem represas 
saudarei a praia lisa e o pomar.
Direi teu nome e tu serás.
1986
 


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... 
Conceição Lima

DESCOBERTA



Após o ardor da reconquista 
não caíram manás sobre os nossos campos.  
E na dura travessia do deserto
Aprendemos que a terra prometida 
era aqui.
Ainda aqui e sempre aqui.
Duas ilhas indómitas a desbravar.  
O padrão a ser erguido 
pela nudez insepulta dos nossos punhos.
 


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