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50 anos de poesia concreta

Décio Pignatari muda de cidade e declara estar concluindo segundo romance - sua obra definitiva

Alexandre Machado
Do correio braziliense

Foram 23 anos de ardorosa dedicação ao Corinthians. Outras três décadas de futebol jogado na várzea. Coisas de um paulista típico, que morou em Osasco durante 23 anos e mais outros 43 em São Paulo, capital. Mas a soma de tantos anos provocou fissura no coração concreto de Décio Pignatari, 72 anos.

O escritor cansou do tom cinza do monóxido de carbono. Trocou-o pelo cinza das nuvens baixas do céu curitibano. "Eu, na verdade, já havia muito tempo que não suportava São Paulo, a poluição", reclama Pignatari, um dos criadores da poesia concreta e agora expoente deslocado da cultura paulistana.

"Já nos anos 70, eu comecei a deixar São Paulo", admite. E, se as contas dos tantos anos na paulicéia não mais interessam, Décio antecipa-se na comemoração de 50 anos de criação literária. E, como presente, nada melhor que ver reeditada sua obra.

"Para minha surpresa, quando pensei que a editora Brasiliense, aparentemente, iria encerrar as atividades, recebi um contato dizendo que não, a editora iria retomar as atividades e queria fazer novos contratos com antigos autores". Décio aceitou.

Fez apenas uma ressalva. "Disse: que a obra criativa venha primeiro. Faço 50 anos de estréia do meu primeiro livro de poemas, em 1950. Para comemorar, quero meus poemas todos, reunidos. Os que eu fiz antes e outros vinte e poucos, de 1987 para cá, coligidos, numa edição só chamada: Poesia Pois É Poesia. Depois, os contos. E, talvez, Pantéros, o meu único romance publicado até agora."

Em abril, durante a Bienal do Livro de São Paulo, Pignatari lançou o livro Errâncias, coletânea de 30 imagens, nas quais apresenta lugares e personalidades que fizeram parte, direta ou indiretamente. da vida dele.

"É livro de memórias até certo ponto. Só que diferente. Tem fotos ruins". A fotobiografia acaba com esperanças de alguma autobiografia, para quem, porventura, a esperasse. Falar do passado, para o concretista, não vale a pena. É perda de tempo. "Ainda vou viver até 2015", antecipa. 

CIDADE ESTÉTICA - E, sem tempo a perder, mostra-se revigorado em Curitiba, cidade para a qual só tem elogios: "É caso estranho de um lugar que se projetou graças a um projeto urbanístico e arquitetônico, a um projeto estético. E o povo foi aderindo pouco a pouco à idéia de cidade bela, bonita. Aqui, ao que parece, eles estão crescendo, e sabendo crescer. Acho que a cidade vai se tornar um importante centro cultural do Ppaís".

E nesta cidade que adotou há mais de um ano, tem vários projetos em mente. Um, entretanto, é definitivo. Terminar o livro Obras em Obras: O Brasil (título provisório). "É o meu grande romance", confidencia. E profetiza: "Se finalizar este trabalho, dou minha obra por concluída."

Décio Pignatari começou a escrever a obra depois de se aposentar, em 1994, após dar aulas na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Usp. Isolava-se no sítio Valdevinos, em Morongaba, 100 quilômetros a nordeste de São Paulo.

"Mas o romance não avançava. Falei: alguma coisa está errada. Fiquei praticamente isolado para poder escrever. E, de vez em quando, ia a SãoPaulo. Mas não avançava. Então falei: não está nada bem aqui. Voltei à atividade. Voltei a conviver com pessoas. Já tinha me aposentado, mas a Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo me convidou. Foi em 1997", recorda-se. De volta às aulas, começou outro romance, com a atual mulher, Soraia Ferreira Alves.

Ela, com dois filhos sempre às voltas com doenças respiratórias; ele, com um romance por finalizar. O final Décio ainda está escrevendo. Mas a rima, qualquer que seja, dessa vez termina com a palavra Curitiba.

 "Sou contra nacionalismos estreitos"

CORREIO BRASILIENSE - Além da poluição, houve outros motivos para o senhor deixar São Paulo?

DÉCIO PIGNATARI - Achava que o intelectual brasileiro não tinha condições de ser intelectual. Quer dizer, ter um lugar onde pudesse trabalhar e pensar, mesmo. O intelectual sempre mistura tudo, tudo na mesma cidade, casa, família... Eu sempre preferi o modo europeu de ser intelectual. Ou seja, tem-se uma vida cotidiana e, se precisa trabalhar, escolhe-se um lugar, procura-se um lugar. Já nos anos 70, comecei a deixar São Paulo. Tinha agência de publicidade e tinha que tomar decisão: ou me tornava publicitário ou virava escritor. A questão era: como iria sobreviver na vida? Aí, falei: não vou ficar mais correndo atrás de clientes. Fechei a agência e o Antônio Candido aceitou minha orientação para o doutorado. Então, reformei garagem na casa do meu sogro, em Carapicuíba, cidade que fica a 30 quilômetros de São Paulo. Lá montei meu estúdio, para lá levei meus livros. Ficava lá nas férias, nos finais fim de semana, lá concluí minha tese de doutorado, intitulada Semiótica e Literatura. Mas São Paulo então já era insuportável. Começava a ficar feia, caótica.

CORREIO - São Paulo, então, é um projeto esgotado?

Pignatari - Não é que esteja esgotada, vai ter que sofrer cirurgias drásticas. A única coisa nos últimos anos que tentou pôr um pouco de ordem no meio do caos foi o metrô. Era a única coisa organizada. O resto, por desgraça de maus governantes, vai levar algum tempo e custará alguns bilhões de dólares para entrar em ordem. Já não suportava mais a poluição, comecei a fugir. E, graças à universidade - eu lecionava em duas, na Universidade de São Paulo (FAU) e na PUC-SP, no curso de Pós-Graduação - pude fazer o que queria: não ganhava muito dinheiro, mas tinha o suficiente, um ambiente minimamente organizado e um tempo organizado. Então, podia trabalhar no contrafluxo, fugir daquele trânsito pavoroso. Ia e voltava e, nos fins de semana, fugia para meu estúdio. Em seguida, me cansei e resolvi: não queria mais viver numa cidade assim. Tratei de comprar um terreno, longe, achei algo que me agradou em Morongaba, 100 quilômetros a nordeste de São Paulo, às margens do rio Jaguari. Lá ergui a minha casa, o meu estúdio, onde costumava pintar meus quadros, e pude acomodar meus dois mil livros e meus discos. Praticamente, não ficava mais em São Paulo.

CORREIO - O senhor utiliza computador para produzir?

Pignatari - Minha companheira é quem opera com agilidade o computador. Quando preciso de algo, ela faz para mim. Continuo, por enquanto, escrevendo à máquina. O que parece ser grande contradição, afinal sempre preguei esse negócio do computador. A verdade é que não gosto de trabalhar com amadores. E não gosto de ser amador. Trabalho com profissionais. Então tenho amigos que são programadores visuais, que são designers, que operam computadores muito bem. Então, prefiro fazer o layout de meus trabalhos e eles, gente como Chico Homem de Mello, resolvem.

CORREIO - Curitiba, para quem vem de São Paulo, não pode parecer um tanto quanto isolada?

Pignatari - E é mesmo. Mas hoje, não se esqueça, você vive em rede, e Curitiba não é retiro, não é ilha. Depois, digamos assim, para esnobar... eu não tenho interesse em ir a São Paulo ou ao Rio. Ver o quê? Uma orquestra? Meu prazer é ir a Paris. Eu gosto de viajar para o Exterior. Ano passado, fiquei lá em Paris, na Provença, no norte da Itália. E, como os museus de lá compram poesia visual, acabei vendendo certos poemas. Ganhei US$ 3 mil com o trabalho e pude passear em Veneza à vontade.

CORREIO - E Curitiba supre todas as suas necessidades? Como o senhor conheceu a cidade?

Pignatari - Eu não podia ir para um lugarejo qualquer, me fechar no mato, quando saí de São Paulo. Não sou bem do tipo. Nem minha mulher. Precisava ir para um lugar que tivesse infra-estrutura escolar, bons serviços de saúde. Vi Curitiba crescer, em 1967. Era uma cidadezinha provinciana. Vinha muito para cá. Fazia conferências. E também tinha o poeta Paulo Leminski. Eu o conhecia desde os 17 anos, quando fizemos uma grande exposição de poesia de vanguarda em Minas Gerais, na Universidade Federal de Minas Gerais, que foi organizada pelo Afonso Ávila. Foram mais de 100 trabalhos, era 1963, 1964. E o Leminski apareceu lá, moleque ainda. Foi em busca da informação. Pegando ônibus, carona. E nos conhecemos. Depois, aparecia em São Paulo, às vezes vestido de judoca, às vezes puxando um fumo. E de vez em quando eu vinha aqui, visitá-lo. A gente era amigo, estávamos sempre juntos. Depois, ele se ligou a outras coisas, começou a fazer sucesso, a compor letras para a música popular. E, quando ele foi a última vez à TV Bandeirantes, ele era produtor de textos e eu participava do Jornal de Vanguarda, que estava começando. Mas ele sumiu e morreu poucos meses depois... bebida, álcool. Ele bebia tudo que era porcaria, bebidas horríveis, drogas.

CORREIO - O senhor vê algum momento na história das duas cidades, São Paulo e Curitiba, que as aproxime?

Pignatari - Há uma momento, sim. O momento durante a última guerra em que, logo depois, comecei a publicar ascoisas. São Paulo tinha então seis jornais, hoje praticamente só tem dois - O Estadão e a Folha. São Paulo tinha um certo jeito ainda europeu e se americanizava aos poucos. Mas havia uma linguagem comum. O viaduto do Chá falava a mesma linguagem arquitetônica do estádio do Pacaembu. E quando a guerra terminou, São Paulo tinha a mesma população que Curitiba tem hoje.

CORREIO - E Curitiba pode ser o que São Paulo foi, neste momento?

Pignatari - Curitiba não tem ainda um elevado público consumidor de arte. O público não tem grande repertório. São Paulo sempre teve uma elite. Logo depois da guerra, havia grandes movimentos de retomada da arte e da liberdade e São Paulo liderou essas movimentações e atraía muita gente. E, apesar disso, a cidade nunca foi favorável à poesia concreta, necessariamente não. Quando se expôs arte concreta pela primeira vez, em dezembro de 1956, não houve grande repercussão. Foi no Rio de Janeiro, em fevereiro de 1957, em mostra no Ministério da Educação e Cultura, que o concretismo explodiu. Teve grande cobertura do Jornal do Brasil, graças ao Mário Faustino e a uma visão nova que o jornal trazia para Imprensa cultural brasileira. Quanto a Curitiba, acho que está vivendo um momento de boom. Acredito que esta cidade se torne brevemente um grande centro cultural.

CORREIO - Brasília poderia desenvolver-se de forma semelhante?

Pignatari - O problema no Brasil, como sempre, é que o país não sabe crescer bem. As pessoas não percebem que crescimento implica crise. Quem não sabe, se estoura. Veja os casos de Maradona, do Edmundo, casos exemplares de figuras públicas que não souberam lidar com a fama, com o crescimento. E as cidades sabem menos ainda lidar com o crescimento. Brasília ainda preserva o Plano Piloto, mas não conseguiu desenvolver projeto que consiga comportar os 2 milhões de habitantes que tem hoje.

CORREIO - Qual o seu propósito atualmente?

Pignatari - Vivo em função da obra e, por destino, ou por propósito, tenho que realizá-la. Então, é um jogo contínuo, que já dura décadas e décadas, entre tentar viver e tentar fazer a obra. Uma obra que eu me proponho a fazer no sentido de inovação. Não é inovar a obra. Meu reinado é o mundo da linguagem, verbal e não-verbal. Quero tentar colocar a literatura e o pensamento do Brasil em nível internacional. Quero o Brasil internacional, como o futebol é. Sem medo de encarar ninguém. Sou contra os nacionalismos estreitos.

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