Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

 

 

 

 

 

 

 

 

Eleonora Cajahyba


 


Lampejos da meia-noite

Gérson Pereira dos Santos


 

Não gosto de prefácios. Eles dizem, quase sempre, sobre um livro do autor, um momento de sua criação literária, mas olvida os outros momentos de outros livros que, como o prefaciado, integram a mensagem do autor, o seu trânsito pela vida, os seus fantasmas, mortos ou vivos, as paisagens que sucederam como se vistas pela janela de um trem, seus sonhos e seus anelos. Não gosto de prefácios. Gosto, no entanto, de Eleonora Cajahyba, alma irmã, amiga e partícipe dos caminhos do viver, do sonhar e do sofrer, como demonstrou diante do sofrimento que culminaria com a morte de um amigo querido: “Escasseiam-me as palavras ante a beleza e a profundidade do seu sentimento e da sua dor. Tropeço nas vascas de sua agonia e caio vertiginosamente na impossibilidade de atingir o seu mundo, muito além do nosso, o céu de seu amor a todos”.

Eleonora, após os exaustivos reclamos da atividade judicante, buscava, nas noites longas, seus snug resorts, seus lugares silenciosos, para deixar que lhe saíssem da alma os encantos e desencantos que se ocultam no silêncio do verso. Quando a noite se vai, Eleonora, cansada, desabafa: “Adeus sonhos! Adeus luares!/ Onde estais, onde vos perdestes?” Depois, sozinha, celebra a epifania do novo alvorecer.

Antes das breves considerações, que pretendo entretecer, quero lembrar a autora destes “LAMPEJOSDA MEIA-NOITE”, há algumas décadas, quando freqüentávamos a Faculdade Livre de Direito da Bahia, hoje parte da Universidade Federal. O nosso “templo” se localizava, então, na Piedade, guardado por dois leões de pedra que foram parar na Escola de Teatro da mesma UFBa. Ali, Eleonora, após a graduação, faria, com brilhantismo, o curso de Doutorado em Direito.

Era uma jovem altiva, linda, alta e elegante, que se dedicava com entusiasmo aos estudos da ciência jurídica; pálida, parecia uma lady que fugira da tela de Rosetti, mas já defendia, de maneira intimorata, seus pontos de vista sobre qualquer tema, inclusive quando se tratava de literatura. A cidade de Salvador era para todos nós uma das mais bonitas do mundo. A rua Chile, o point dos fins de tarde, as praias de areias brancas acariciadas pelo mar, os nostálgicos bondes elétricos, os monumentos bem cuidados, as ruas festivas, o povo alegre e educado, tudo parecia transformar Salvador numa cidade de magia e encanto.

Em versos de seu primeiro livro (TEMAS E RIMAS) a nostalgia estava presente: “A chuva tamborila na vidraça / compondo uma elegia. É madrugada, / e o vento forma o coro das saudades”.... e, também, versos de sua constante ingenuidade: “Três pontos, um dia, surgiram / Reticências.../ Mas, o inexplicável da vida baniu um. / Ficaram Dois pontos: Depois o Destino invejou tal união / e cortou, então, mais um: Surgiu o Ponto Final”.

Indo a seu segundo livro (ESTRUTURA METÁLICA), encontro o poema “Reflorescimento”, cuja primeira estrofe vale lembrada: “Sairei pelos campos, / despida de tudo, / vestida de simplicidade. / Trocarei o meu diadema de brilhante / por uma guirlanda de flores silvestre. Vestir-me-ei de uma túnica branca / que exala o perfume dos lírios...”

Para Nathan Coutinho a poesia de Eleonora Cajahyba é “moderna na estrutura, lírica na essência e profunda nos conceitos”. Concordo. Em Silêncio do Verso ela trabalha, com talento, lindos sonetos como o que dá o título ao livro, bem assim “ Louvação do Amor”, “O Perfume e a Rosa” e “Transmutação”, no qual, nos tercetos, ela conclui melancólica, mas iluminada: “Quem mais aquela dor embalaria / apagando a tristeza, se quisesse / transportar das estrelas a alegria?”... “Se exilar o passado alguém pudesse, / o pranto da saudade beijaria / este silêncio que jamais se esquece”.

De repente, na vida de Eleonora, algo ocorreu: a morte de um querido amigo. Isso a fez reviver recordações de Joseph Leydenbach, sua esposa, filho e, até, dos netinhos Nicolau e Clara. Joseph era um conhecido escritor e banqueiro que residia em Luxemburgo. De certa forma, sem esquecer a sua poesia, Eleonora apresentou-nos uma “quase” dupla autobiografia com o seu livro MIL ANOS DE AMIZADE.

Depois de duzentas e quarenta e sete páginas e vinte cinco anos de correspondência, que fluíram como as águas de um rio, Eleonora quis fazer apenas o que lhe era possível plantar um buquê de lágrimas no jardim da saudade e do coração, pois, como própria diz: “as lágrimas adubam as rosas, a dor, a lembrança e o nosso Adeus”.

Com LAMPEJOS DA MEIA-NOITE, Eleonora dá início a uma nova fase em sua poemática. Apenas sonetos contêm esta nova obra. A atemporalidade da forma torna-a, por assim dizer, eterna. Para Miguel Sanches Neto, “o soneto foi e continuará sendo um elemento de identidade da língua e um território de provação para os poetas que queiram ultrapassar os horizontes de recepção mais imediatos”. Por isso, ousadamente, Eleonora abre o volume querendo homenagear a própria estrutura do soneto: “És lógico na síntese da idéia, / no ritmo e perfeição da pura forma, / além de ter o encanto de Frinéia, / tens conceito, rigor, cadência e norma”.

Em “Enganos”, em rimas paralelas, Eleonora retoma o tema da solidão e da tristeza: “Somos a solidão dos vastos mares”, e completa esclarescedoramente: “muitos fingem que a é sem pesares, / escondendo de todos a desdita / de sofrer do vazio que aflige e grita”. Na “Balada do Ontem e do Hoje” ela revela que já cantou o amor, o vento afável, a tristeza, a saudade, a comoção, a fria morte, o sentimento e as rosas rubras da paixão. No quarteto seguinte arremata: “ Joguei-as lá no caos do esquecimento / e colhi-as no enlevo da oração; / mas chega tão pungente o desalento / e dói na alma e tritura o coração”.

Comprimento, rejubilado, a autora de LAMPEJOS DA MEIA-NOITE. Encontrei na poesia de Eleonora Cajahyba a mesma alegria que nunca deixou florescer em sua alma dulcíssima. A sua sensilidade é tanta que, ao crer ter perdido o seu relojinho, terno companheiro do seu leito, ela diz de sua saudade, da falta que ele faz nas noites e nos amanheceres quando, dedicado, a acordava. Mas, em novo soneto, ela o encontra e a emoção toma-lhe todo o ser. Sensível, fala-nos a poestisa de Eleonorinha, pingo meigüíssimo de gente, sua netinha, “rósea e terna como uma flor”. Falando da mulher de “talhe perfeito na simetria da forma longa, esbelta e majestosa”, lembra que tudo isso só vale quando a alma é luminosa.Que Eleonora Cajahyba continue a sonhar e escrever, percorrendo sempre as estradas enluaradas e retemperando-se nos mais belos e tranqüilos sonhos.

“Não é exato que poetas devem ser lidos apenas por poetas. Tanto assim que, embora sem privilégio de ser poeta, foi com encantamento extraordinário que li os belos versos de Maria Eleonora Cajahyba, poetisa cuja arte desabrocha cheia de sensibilidade e vigor, afirmando-se como das melhores de sua geração. A renovada poesia, que ela agora nos revela, enaltece as melhores tradições da Arte Poética na Bahia”.

In Luiz Viana Filho
Da Academia Brasileira de Letras

 



“Maria Eleonora é uma poetisa de raça. Corre nas suas veias o sangue de Castro Alves- o maior poeta das Américas, quiçá do mundo. Inteligente e culta, poetisa inspirada, por si só desmentiria a afirmativa do desajustado Schopenhauer. Os que vão ler o belo poema de Maria Eleonora, que adiante publico, encarte-se-ão, como eu me encantei, com seu talento que um amigo do lugar comum chamaria de escol....”
In Camilo de Jesus Lima

“Seus versos não são vazios ou estéreis. Eles têm alma, calor e humanidade. E dizem muito. Dizem coisas que vivem dentro de nós e que nós mesmos não sabíamos de sua existência. É nesse sentido quase divinatório, que marca o grande poeta. Ele está presente à poesia de Maria Eleonora”
Mário Cabral
In Jornal A Tarde (Salvador)

“Revelam (os versos de Maria Eleonora Cajahyba) uma sensibilidade artística aprimorada pela cultura, transmitem beleza e emoção (...) É uma poetisa personalíssima (...) moderna na estrutura, lírica na essência, profunda nos conceitos”.
In Nathan Coutinho

“Maria Eleonora Cajahyba, grande expressão da Bahia intelectual, ocupa lugar honroso no quadro dos que têm sabido elevar o verso às alturas onde residem os anseios e os sonhos, que impulsionam e alimentam os poetas. Em muitos dos seus versos, o tom filosófico deixa antever a preocupação do futuro, como no Canto do Amanhã (...) no silêncio rumoroso dos seus versos, que relembram dias ensolarados, horas sombrias, tempos idos e vividos”.
In Jayme de Sá Menezes

“(...) busca transmitir nos seus versos, como Cecília Meireles o fazia, tudo o que sente da vida, (...) e sai cantando, pela estrada luminosa, embriagada de sonho e beleza”.
In Antônio Loureiro de Souza

 

 

 


 

17/11/2005