Soares Feitosa
  

Homenagem  em  Pedra-Lispe
 
  
 
    Se eu fosse um escultor,   
    pegaria a banda oeste  
    da Serra das Matas, 
    e lá,  
    daquele talhado  de granito azul, 
    ao corisco ligeiro faria cair 
    vertical, uma figura 
    em  Galo-e-ferro, 
    Ferreira, 
    e os cabelos 
    que os talhos faciais, 
    descidos do sofrer, 
    subidos do amar, 
    em tons de córnea rija, 
    cemento de armadura medieva 

          ¿onde, na última face, o risco? 

    e Cervantes, 
    Gullar Galo-Galo Ferreira e Poeta, 
    quando o poema 
    mostrar-se-ia à aurora rubra 
    de Toda Poesia e livro 
    em pedra e Galo e bronze. 


Salvador, BA., noite alta, 11.07.1995.
Notas para Homenagem em Pedra Lispe: 

1. - Pedra-lispe, da mitologia nordestina, a pedra, de cor azulada, que desce junto com o corisco, que a rigor é o próprio corisco, na forma de machado,  e se enterra a sete palmos depois de brilhar, ribombar e destruir. É atraída,  durante as raras tempestades, por espelhos, ferragens, arreios de prata e  esporas de metal... óculos de coronel, se forem de ouro;  até  mesmo os  dentes - se de ouro - podem atrair a pedra-lispe. Por isso é que aqui ninguém  fala durante a  tempestade. 

2. - Banda oeste da Serra Matas: terra natal do autor, poema Antífona. 

3. - Galo-Galo,  belíssimo poema de Ferreira Gullar. 

4. - Toda Poesia, obras completas do poeta brasileiro Ferreira Gullar. 

5. - Bronze:  ære perennius - perene como o bronze, expressão do também  poeta, Horácio.