Fernando Pessoa

Oiço passar o vento na noite
 
OIÇO PASSAR o vento na noite.
Sente-se no ar, alto, o açoute
De não sei quem em não sei quê.
Tudo se ouve, nada se vê.

Ah, tudo é igualdade e analogia.
O vento que passa, esta noite fria.
São outra coisa que a noite e o vento - 
Sonhos de Ser e de Pensamento.

Tudo no narra o que nos não diz.
Não sei que drama a pensar desfiz
Que a noite e o vento passados são.
Ouvi. Pensando-o, ouvi-o em vão.

Tudo é uníssono e semelhante.
O vento cessa e, noite adiante,
Começa o dia e ignorado existo.
Mas o que foi não é nada isto.

   
Remetente : Angela Campanha 
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