João Soares Neto
As casas que li
“As casas onde eu morei”, livro da
poeta carioca/bahiana Vanessa Buffone, Editora Casa de Palavras, vem
de ganhar o Prêmio Brasken Cultura e Arte, da Fundação Casa de Jorge
Amado. O livro é uma caixa de segredos pretensamente ocultos e
disfarçadamente revelados. Ou será o contrário? Ou nada disso?
Sei, por não ser crítico, que percorri
todas elas, alerta, assombrado, gostando, questionando, grifando,
mastigando e parando.
É claro que houve uma menina. Ela está
aí em cada verso, metáfora, alumiando o pensar do leitor
desprevenido e colocando, ao mesmo tempo, minhoca em sua cabeça.
Todos chegamos neste mundo sem senha
de acesso. A senha é a da mãe e é cortada umbilicalmente, jogada
fora. É poesia da boa, pós-neo-realista, seja lá o que isso
significa. Não é nada de velho, é “nau a seguir seu prumo”. Nau
nova, mesmo que a timoneira se queixe de ter “mar nos olhos, sempre
úmidos”. É, assim mesmo, gente tem que apresentar olhos úmidos. Só
os fortes podem ser fracos revelados.
Confessional ou intimador, pois a
“sedução que vem da tinta” será mesmo de amantes? Ou serão outros,
os que gera(ra)m as letras poéticas? “Cada saudade tem seu abrigo” é
afirmação de que foram várias e os escaninhos da alma da
poeta/poetisa abriga diversidades, como a epígrafe de Safo de Lesbos
deixa pensar ou não pensar. “Seria uma mulher” ou homens sutis?
“Em toda parte, espaços que foram
seus, vazios que hoje habito sozinha”. É duro, saber-se acompanhada
de pensamentos que não preenchem os espaços da solidão imposta ou
conquistada. Duro, mas real é a vida como um pêndulo, não o Foucalt,
mas o do nosso vagueio entre o desejo, a fantasia, o chão da terra e
a briga com ou sem lençóis.
“Não sei por quem mais chorar”, mas se
chora por nós mesmos. Pelo remoto, vestígio, música, cheiro,
silêncio, (des) encontro e pela cabeça que perdeu o norte afetivo,
pois “besta-fera que caminha à tua boca”.
Não importa quem monta quem, nem
importa a montada, importa o instante permanecer e engrandecer,
mesmo que seja mentira gerada pela loucura da sanidade que nos puxa
o tapete. Se foi infeliz montaria, parta com novos ou velhos arreios
para o animal não ficar no mesmo cocho onde a ração já não o
alimenta.
As verdades sem limite são palavras de poeta, pois relativas nesse
porto que é o mundo onde a nau pessoal precisa de um prático que não
sabe ler a carta marinha.
“Talvez seja só isso”, poderia dizer
mais. Mais seria o dizer de novo, o que foi dito, verso a verso,
como fotogramas reimaginários e há tempo, muito tempo, para outras
casas, outros devaneios.
João Soares Neto, 18.01.2006
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