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Sérgio Mattos


 

NONATO MARQUES, O POETA DA BAIXINHA
 

Palavras pronunciadas pelo Acadêmico Sérgio Mattos em homenagem a Antonio Nonato Marques, na Sessão Saudade promovida pela ALAS – Academia de Letras e Artes do Salvador, no dia 12 de junho de 2006.
 

Meus confrades, minhas confreiras,
meus senhores, minhas senhoras,
parentes do homenageado:
 

Como epigrafe do resumo de seu curriculum vitae, intitulado por ele mesmo como “Síntese de uma vida”, Nonato Marques escolheu uma citação de Leon Dénis que se aplica e muito bem para a homenagem que lhe prestamos na noite de hoje. Senão vejamos:
 

“Cada um constrói, dia por dia, hora por hora, muitas vezes sem mesmo o saber, seu próprio futuro. A sorte que nos cabe na vida atual foi preparada pelas nossas ações anteriores, da mesma forma edificamos no presente as condições da existência”.
 

É isso mesmo Nonato Marques, você soube, ao longo de 96 anos bem vividos, construir a poesia que foi a sua vida, no dia-a-dia, tecendo, laboriosamente os caminhos e as edificações de sua existência. Ao escolher a poesia como arte para transmitir seus sentimentos e observações, você metrificou suavemente o seu viver diário, com o ritmo e a sonoridade das palavras trabalhadas como se jóias fossem, marcando o seu compasso, suas ações e determinando o futuro que você ainda terá na história da vida literária baiana.
 

Ao optar pela carreira agronômica, você fez a escolha pelo meio ambiente, pela natureza, pela preservação da vida, pela ecologia. Não deixou aqui também de ser poeta. Isto porque ao fazer a opção profissional de trabalhar com os quatro elementos – terra, ar, água e fogo – você se aproximou mais ainda do sentido da própria vida, da necessidade do registro, do resgate e da preservação da natureza e do próprio homem.
 

Ao exercer cargos públicos, inclusive eletivos, você demonstrou sua capacidade de contribuir pela edificação de um mundo melhor, pelo menos aquele sonhado pelo poeta que você foi e continuará sendo, buscando encontrar as alternativas necessárias para a melhoria do nosso povo, sertanejo e sofrido.
 

Como homem deixou sua marca, registrando sua passagem, sua existência nesta terra: Pensou e escreveu inúmeros livros e trabalhos, repercutindo sua experiência de vida e transmitindo conhecimentos para as novas gerações. Viveu seu tempo, quase um século, e nele deixou sua marca. Plantou não uma, mas inúmeras árvores. Deixou uma extensa prole e inúmeros amigos que saberão reproduzir sua obra que haverá de permanecer porque tem um cunho universal.
 

É isso Nonato Marques, você foi um homem e um amigo leal, mas também um Grande Poeta. Você já não é mais do Grupo da Baixinha, pois a partir de agora passou a integrar o Grupo dos Poetas Encantados, como Castro Alves, Drumonnd, Bandeira e muitos outros.
 

Ao poeta Antonio Nonato Marques, ocupante da cadeira nº 40, dessa ALAS que tem como patrono Guilard Muniz, que foi o grande jardineiro de Salvador, é dedicada esta sessão especial, que com muita propriedade é intitulada Sessão Saudade. Coube-me a missão de falar sobre o poeta, meu amigo por mais de 35 anos e por quem desenvolvi profunda admiração.
 

Conheci Nonato Marques pessoalmente quando, no início da década de 70, editando o suplemento “Jornal de Utilidades”, um dos projetos editoriais que desenvolvi para o Jornal A TARDE, ele comparecia semanalmente para levar sua contribuição para o caderno: o conteúdo de nossa página agrícola. Com uma voz grave e empostada, com os olhos pequenos e faiscantes de inteligência, Nonato me passava os artigos e as notícias com as quais eu deveria editar a página agrícola. Ele sempre manifestava sua opinião e recomendava o que era mais importante a ser destacado na página, com a autoridade de quem havia sido o homem responsável pelo desenvolvimento da agricultura do estado da Bahia.
 

Foi a partir destes encontros semanais que surgiu nossa amizade. Mais tarde, a partir de 1985, quando à frente de outros projetos editoriais de A Tarde, os suplementos A Tarde Municípios e A Tarde Rural, dos quais também fui idealizador e editor, Nonato se aproximou mais ainda. Aí já não colaborava apenas no suplemento rural, mas também com seus artigos e crônicas que publicávamos em A Tarde Municípios, sempre abordando temas de interesse regionais, fossem eles sobre economia agrícola, ou de resgate da cultura da região sisaleira. Não faltavam, naturalmente, seus poemas e artigos sobre Santo Antônio de Queimadas e muitas outras histórias.
 

Ele não se satisfazia apenas com o fato de entregar pessoalmente o artigo em minhas nas mãos. Ele queria ter a certeza de que o editor-amigo iria lê-lo antes de publicá-lo e, para não deixar dúvidas sobre isto, levava-me a um canto da sala da redação, onde com sua voz empolgada, lia o texto em voz alta, dando a ênfase necessária às palavras ou trechos que achava serem os mais importantes. Isso sem contar com os poemas de época. Ele não deixava passar uma data importante (Dia das Mães, Dia dos Pais, da Criança, Natal, Quaresma etc) sem levar um poema com a temática do dia, sempre tentando garantir sua publicação, não importava onde, em que caderno, o importante é que fosse publicado. Se não conseguia espaço no caderno Cultural ou no Caderno 2 de A Tarde, me procurava e quando possível eu publicava suas colaborações tanto em Municípios como em Rural.
 

Só no período em que fui editor de A Tarde Municípios e de A Tarde Rural, convivi com a visita semanal de Nonato por mais de 18 anos, entre 1985 a 2003. Esta convivência foi ampliada a partir do ano de 1999, quando começamos, no salão de festas do prédio do acadêmico Rozendo Ferreira, as reuniões semanais que deliberaram a constituição desta ALAS –Academia de Letras e Artes do Salvador, instalada oficialmente em dezembro daquele mesmo ano e da qual tive a honra de ter sido o primeiro presidente. Nonato Marques esteve presente desde os primeiros momentos da constituição desta ALAS, só faltando às reuniões por motivo de força maior.
 

Nonato Marques era assim, de uma simplicidade sem par e ao mesmo tempo um homem persistente, seguro do que queria e brilhante no que fazia. Era também um excelente orador e crítico literário além de sentir muito orgulho sobre o que escrevia, valorizando ainda mais a publicação dos seus textos. Como orador destacou-se na Câmara Federal ao lado de parlamentares e grandes oradores como o velho Mangabeira, Artur Bernardes, Afonso Arinos, Aliomar Baleeiro, Nestor Duarte e Carlos Lacerda, entre outros tão famosos quanto estes.
 

Nonato Marques nos contou, com uma dose de ironia e muito humor, em palestra aqui realizada, sob o título de “Pinga Fogo”, apelido dado às sessões do pequeno-expediente da Câmara dos Deputados devido à irreverência parlamentar, como se deu sua estréia na tribuna da Câmara Federal:
 

“Naquele recinto heráldico e cintilante, eu – pobre provinciano egresso das caatingas, sentia-me mais insignificante do que uma ameba. A minha constante e invencível timidez matuta se apoderou de mim com todo o peso de sua contenção insuportável. Mas, era preciso falar, dizer alguma coisa, desembuchar, enfim. A muito custo arranjei uma vaga para falar no grande–expediente. Logo no grande-expediente, onde o orador fica no alto, por conseguinte mais exposto aos aplausos ou aos massacres. Antes, para amansar os nervos rebeldes, eu havia preparado o discurso no melhor estilo de que fui capaz, com todas as vírgulas e acentos no lugar, caprichando no português à moda de Coimbra, mas uma surpresa desagradável me espreitava: na hora aprazada subi à tribuna como quem vai para um patíbulo. Do plenário, os olhares que para mim se dirigiam eram como se fossem farpas a me estraçalharem o coração. Proferi as saudações protocolares: Senhor Presidente, senhores deputados. Puxei do bolso o calhamaço. Procurei os óculos. Onde estavam os óculos? Apalpei os bolsos, nada. Na afobação, havia esquecido em casa os meus protetores visuais. Descer da tribuna seria um fiasco. De repente, não mais que de repente, uma reação raivosa se apoderou de mim e devolvendo ao bolso o papelório, fui forçado a falar sem as muletas escritas que eu havia cuidadosamente preparado. Quando terminei e desci da tribuna estava alagado de suor. Havia saído da maior batalha íntima que travei em toda a minha vida. Isto me fez lembrar Camões, quando o genial caolho adverte: ‘que o outeiro é mais fácil de descer do que de subir’. E a tribuna também.”
 

Ainda na Câmara Federal Nonato Marques praticou o que ele mais gostava de fazer: versos, sonetos satíricos ou epigramáticos, mas sem o propósito pejorativo. Durante as longas sessões de discursos na Câmara, para passar ou matar o tempo ele escrevia sonetos e se escondia por trás de um pseudônimo: Marquês das Laranjeiras. Marquês, segundo ele, derivado de Marques, seu nome de família, e Laranjeiras, proveniente do bairro em que residia no Rio de Janeiro. Dentre os muitos sonetos satíricos de Nonato Marques ou Marquês das Laranjeiras destaco dois, escritos em 1956 durante o desenrolar de sessões agitadas:
 

Está aberta a sessão. O presidente
toca a sineta. Há número na casa.
O secretário lê todo o expediente
e a águia do verbo sobre nós abre a asa.

Depois há sururu...o verbo abrasa.
Há sempre, cada dia, um bom valente
que desafia, esbraveja e arrasa
a paciência e o humor de toda gente.

Ninguém briga, afinal. É só arrelia.
Há uma turma do deixa-disso atenta,
que acaba de mansinho a valentia.

Depois se vota. Tudo entra nos trilhos.
Vai se votando no levanta e senta
No vai e vem solene dos fundilhos.
 

Um outro soneto satírico do Marquês das Laranjeiras foi inspirado numa intervenção do então deputado Adauto Lúcio Cardoso ao dar um voto favorável a um projeto, recomendando que fosse melhorada sua redação final:
 

Diz o Adauto: “Eu espero que o Senado
melhore a redação deste projeto.”
Ele quer português do bom, correto,
flor do jardim do Lácio decantado.

Tudo isso para mim parece errado:
O que importa, de fato, no projeto,
direto ou não, é apenas o objeto,
e o tal sujeito oculto ou disfarçado.

Que importa na política a gramática,
A prosódia, a sintaxe, a sistemática,
todos esses troços complicados?

Que importa, amigo, deixa esses defeitos.
Valem mais em política os sujeitos
E valem muito pouco os predicados.
 

Este era o Nonato Marques, inteligente, bem humorado e que nunca deixou de dar oportunidades tanto a jovens como a poetas já estabelecidos como também escrevia sobre os mesmos. Escreveu inúmeros prefácios, orelhas e artigos enaltecendo obras. Eu mesmo tive a felicidade de ser resenhado por ele, que com estilo elegante escreveu sobre dois de meus livros de poemas, “Asas Para Amar” e “Estandarte”. Certa feita, como fui fazer o lançamento destas obras em Queimadas, sua terra natal, ele fez questão de ir para lá para me receber, me saudar e me apresentar aos seus conterrâneos.

Nonato foi um homem marcante e teve uma vida pública marcante. Que o diga sua esposa, dona Maria Angélica Marques, seus filhos, netos e bisnetos. Que o diga seus amigos, pois inimigos não os teve.

O escritor, político, engenheiro agrônomo e Poeta, com letra maiúscula, Antonio Nonato Marques, autor de “A Poesia era uma festa” (1996) era também um memorialista de mão cheia. Em resumo, Antonio Nonato Marques nasceu na antiga Vila Bela de Santo Antonio das Queimadas, atual cidade de Queimadas – Bahia, no dia 27 de abril de 1910 e morreu no dia 5 de abril de 2006, ou sejam 22 dias antes de completar 96 anos de idade. Fez seu curso elementar em sua cidade natal e o curso complementar na cidade de Alagoinhas. Em 1924 começou a fazer exames preparatórios no antigo Ginásio da Bahia. Em 1934 prestou exame vestibular para a Escola Agrícola da Bahia, onde se diplomou tendo sido escolhido como orador da turma de Engenheiros Agrônomos de 1937.

Como agrônomo ocupou muitos cargos inclusive o de Secretário da Agricultura e Comércio da Bahia e Presidente do Instituto Baiano do Fumo entre outros. Foi deputado estadual pela “coligação baiana” (PSD/PTB) eleito em 1950 e deputado federal em 1954 pelo PSD (Partido Social Democrático) tendo se reelegido para mais dois mandatos na Câmara Federal, em 1961 e 1964. Permaneceu na Câmara Federal até 1967, quando se afastou definitivamente da política. Depois passou a se dedicar a funções ligadas à sua profissão de agrônomo.

Como escritor e poeta colaborou em diversos jornais e revistas do estado e do País, com artigos técnicos e literários. As suas produções na imprensa diária ou periódica dariam para formar livros sobre assuntos diversos. Durante oito anos consecutivos foi responsável pela seção de agricultura e pecuária do jornal A Tarde, tendo editado boletins técnicos e informativos das entidades autárquicas, fundações e associativas a que serviu. Como jornalista desempenhou ainda as seguintes funções, em 1939, “Chefe do Serviço de Publicidade do Instituto Bahiano do Fumo, tendo sido na oportunidade também o redator-chefe do Boletim Informativo daquela autarquia e diretor da revista “Bahia Rural”. Em 1941 com a criação do departamento de Assistência ao Cooperativismo foi designado como responsável da Seção de Propaganda e Divulgação, tendo sob sua responsabilidade a revista “COOP” que ali era editada. Posteriormente, em 1942 assumiu a diretoria do Departamento de Assistência ao Cooperativismo. Em 1945 foi nomeado pela primeira vez Secretário da Agricultura, e logo em seguida Diretor da Escola de Agronomia, em Cruz das Almas. Foi ainda Inspetor Geral do Transito (1947), Presidente do Instituto Baiano do Fumo (1941 a 1951); Presidente da Comissão Estadual de Preço (1951 a 1952), Eleito deputado estadual em 1950 foi nomeado Secretário da Agricultura em 1951. Além destas funções, ele exerceu várias outras, como também integrou várias comissões e conselhos além de ter sido presidente do Conselho Administrativo da Caixa Econômica Federal.

Na área acadêmica foi diretor da Escola de Agronomia de Cruz das Almas e fundador da Faculdade de Medicina Veterinária da UFBA. Em sua homenagem, a EBDA – Empresa Bahiana de Desenvolvimento Agropecuário, mantém, aqui em Salvador, no bairro da Ondina, um herbário com seu nome e que foi fundado em 1952 com um acervo de 13 mil espécies.

Nonato Marques integrou ainda as seguintes entidades: Associação dos Engenheiros Agrônomos da Bahia, Sindicato dos Engenheiros da Bahia, Associação Baiana de Imprensa (ABI), Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. Foi também membro fundador da Academia de Artes e Letras do Salvador – ALAS, da qual nunca deixou de manifestar orgulho por integrá-la. Esta ALAS também se sente honrada, permito-me a ousadia de falar em nome de todos os seus membros, em ter tido entre seus fundadores um dos mais brilhantes poetas baianos do século XX: Antonio Nonato Marques, o Marquês das Laranjeiras, O poeta da Baixinha, hoje um Nonato Encantado.

A atividade literária, sobretudo na área da criação poética, iniciada na adolescência, o acompanhou por toda a vida. Em poesia publicou: “Poemas de meu enlevo”, “Poemas do Céu e da Terra”, “Tempo de Poesia”, “A poesia era uma festa”, “Os dois últimos poetas da Baixinha”, em parceria com o também poeta Bráulio de Abreu. Na prosa, destacam-se: “O Lado verde da vida”, “Dom Pedro I e seus amores”, “Pinga-Fogo”, “Santo Antonio das Queimadas” e “Uma Porta para Canudos”. Escreveu duas peças para teatro: “A Procura de Marido” e “O Gigante também tem asas”, que foram encenadas em algumas cidades baianas. Deixou inédito o livro “Crônicas Rurais” que a ALAS poderia tomar a iniciativa, fica registrado aqui a proposta, de tentar publicá-lo ou encontrar um patrocínio neste sentido. Outras produções literárias de Nonato Marques foram também publicadas em revistas e jornais do sul do país. E a respeito desses trabalhos existe uma grande fortuna crítica.

Na área de estudos técnicos vinculados à agronomia destacam-se títulos como: “Geografia do Fumo na Bahia”, “Iniciação Cooperativista” , “Pessoas, Plantas e Animais” e monografias técnicas como “O Sisal na Bahia” e “O Umbuzeiro”.

Falar sobre Nonato Marque é falar sobre uma parte da história da vida literária da Bahia e sendo assim, não podemos deixar de destacar o seu papel como membro do Grupo de Poetas da Baixinha. A denominação de Baixinha, era porque o Café Progresso, onde jovens poetas-boêmios se encontravam, estava situado próximo a um larguinho, de onde despontam as ladeiras do Carmo, do Passo e do Pelourinho, e que liga a Baixa dos Sapateiros ao Taboão.

O Grupo da Baixinha, que tinha como mecenas Raimundo Pena Forte, era formado por rapazes de 18 a 21 anos de idade, boêmios talentosos que passavam todo o tempo improvisando e escrevendo literatura em cafés e bares da cidade. O grupo da Baixinha freqüentava o Café Progresso até o horário de saída do último bonde. Fizeram parte do Grupo da Baixinha: Alves Ribeiro, Aníbal Rocha, Amphilophio Britto, Ângelo Brandão Donatti, Bráulio de Abreu, Clodoaldo Milto, Dagmar Pinto, De Souza Aguiar, Epaminondas Pontes, Elpídio Bastos, Egberto de Campos Ribeiro, Honorato Gomes, Leite Filho, Nonato Marques, Otto Bittencourt Sobrinho, Pereira Reis Júnior, Pinheiro Viegas, Raimundo Penna Forte, Samuel de Brito Filho, Wasny Casaes e Zaluar de Carvalho. O Grupo da Baixinha era conservador e seus integrantes cultivavam o verso rigorosamente metrificado, no melhor estilo parnasiano.

O Grupo foi responsável pelo lançamento da revista SAMBA que marcou época e presença na história da vida literária baiana dos anos vinte do século passado. Graças ao Conselho de Cultura do Estado da Bahia recentemente saiu publicada uma edição facsimilada da mesma. A revista mensal Samba foi a primeira de feição modernista a ser editada na Bahia, sendo, portanto, precursora da revista Arco & Flexa, liderada pelo poeta e crítico Carlos Chiacchio.

Segundo depoimento de Nonato Marques, no livro “A poesia era uma festa”, “Samba era uma revista modesta composta em papel jornal. Foram publicados apenas quatro números. A revista teve vida efêmera como os cometas, porém, mesmo assim, deixou um traço luminoso na história da vida literária”.

Nonato Marques registrou, no livro “A poesia era uma festa”, publicado em 1994, o seu tempo poético de vida com as seguintes e precisas palavras:
 

“No meu tempo a poesia fazia parte do cotidiano da vida da província. Vale dizer: habitava a idade dos homens e como eles conviviam no seu dia-a-dia, através da leitura de revistas e jornais que lhe abriam espaços generosos. A poesia se misturava com as pessoas, alegrando-as, divertindo-as, animando-lhes as festas cívicas e particulares, conquistando-as de tal maneira que era muito raro encontrar alguém, ainda que medianamente instruído que não soubesse de cor alguns versos de sua predileção”.
 

Nonato nos deixou um legado como obras. Deixou também viúva, dona Maria Angélica Marques, sete filhos, 13 netos e quatros bisnestos, a quem estendo esta homenagem com a palavra de muito obrigado, por ter ajudado na edificação da obra deste poeta encantado. Para finalizar vou recitar alguns poemas do POETA NONATO MARQUES:


DESPEDIDA
Nonato Marques

Foi bem ali naquela ponte estreita
- em tudo a um cromo antigo parecida –
que ela tristonha e um tanto contrafeita
levou-me seu adeus de despedida.

Entre meus braços tensos envolvida,
ela por entre lágrimas desfeita
maldizia a desdita da partida
que ia forçada a viver insatisfeita.

Era a separação. Era a distância.
Era a ausência cruel – próxima e expressa –
que violentava um grande amor de infância.

Pelo meu rosto junto a minha fronte
as lágrimas corriam mais depressa
do que a água que corria sob a ponte...


BONECA
Nonato Marques

Porque ela é tão pequena e tão franzina
até receio quando alguém nos vê
beijar suas mãositas de musmê
ante seus olhos grandes de menina.

Ela parece assim (não sei porquê)
tendo uma boca rubra e pequenina,
uma boneca original da China
que ri e dança namora e lê.
Tenho receio de tocar de leve
aquela alvinha como a neve,
aquela carne tentadora e louca.
Se beijo-a muito, tenho muita pena
porque ela é tão franzina e tão pequena
que o meu beijo mau cabe em sua boca.


Trecho de um outro poema referindo-se à época em que a poesia era uma festa:

“...os rapazes boêmios daqueles
tempos perambulavam a declamar
pelas ruas tortuosas e
enladeiradas de Salvador,
até altas horas da noite,
dentro da qual sibilava ,
a intervalos, o apito do guarda
noturno e se ouvia o grito
dolente e comprido
da negra do acarajé.”


Salve Nonato Marques, o Marquês das Laranjeiras, o mais novo Poeta Encantado da Bahia!

Muito obrigado

Outono de 2006, Salvador, 12/06/2006.

 

Leia Nonato Marques


 

 

 

 

 

05.07.2006