Marcelo
Coelho
Livro
condensa informação e toque crítico
MARCELO
COELHO
COLUNISTA DA FOLHA
Folha
de S.Paulo – 08/05/2004
Traçar
um panorama didático da "Literatura Brasileira Hoje" –
este o título do livro de Manuel da Costa Pinto para a coleção
"Folha Explica" – é tarefa cheia de armadilhas. Cumpre
ser objetivo e conciso, não omitir nenhum nome importante, dar idéia
ao leitor leigo das principais tendências literárias dos últimos
50 anos. Mas também é necessário fazer juízos de valor,
selecionar, excluir – para que o limite de 150 páginas dessa coleção
de bolso não seja ultrapassado.
Importa ainda, num meio literário restrito como o brasileiro, não
se render a favoritismos nem a preconceitos.
Por
vários anos, editor da revista literária "Cult" e agora
colaborador da Folha na seção "Rodapé", Manuel
da Costa Pinto adquiriu bastante experiência nesse campo eivado de
suscetibilidades, carências, camaradagens e achaques. Diga-se desde
logo que o autor desta resenha é citado no livro de forma favorável,
ainda que breve.
O
livro se estrutura em verbetes de cinco ou seis parágrafos,
dedicados a autores individuais: 30 poetas, do veterano Manoel de
Barros a Tarso de Melo (nascido em 1976) e 30 prosadores, de Lygia
Fagundes Telles aos nomes da "Geração 90".
Outra
possibilidade seria organizar o panorama em capítulos mais longos,
conforme as diferentes "famílias" de escritores: a
literatura feminina, a poesia marginal, os herdeiros de
Rubem
Fonseca ou do concretismo... Mas Costa Pinto compatibilizou o
sistema onomástico, mais prático para a consulta, com o mapeamento
das áreas de influência dos autores escolhidos, encontrando assim
o jeito de falar de mais de um escritor por verbete.
Há
espaço igual para autores já célebres – Dalton Trevisan, Luiz
Fernando Veríssimo, Ferreira Gullar – e nomes para os quais a
atenção do público começa a se voltar – Age de Carvalho, Marçal
Aquino, Marcelo Mirisola. Apontar desequilíbrios e omissões não
é tão fácil quanto parece. Observo que Ariano Suassuna e Millôr
Fernandes mereceriam mais que três ou quatro linhas, e que o livro
não contempla o gênero da biografia, dos mais vigorosos nas últimas
décadas.
Cada
parágrafo condensa invejável quantidade de informações, às
quais não faltam sutis, precisos toques de valoração crítica.
Note-se o tom positivo com que Costa Pinto finaliza seu verbete
sobre Ferreira Gullar: "Essa poesia combina rigor e
objetividade ao rés-do-chão com abismo existencial e perspectiva
histórica (...), obra que hoje só encontra paralelo no lirismo
violento do português Herberto Hélder".
Compare-se
a isto o "sinal de menos" que, com elegância, o autor apõe
a Adélia Prado, cuja religiosidade "está longe dos êxtases,
do mysterium tremendum dos grandes místicos cristãos – assim
como também está distante das erupções estéticas dos grandes
renovadores da linguagem literária, que ela contempla à distância:
'[...] tudo que invento já foi dito/ nos dois livros que eu li:/ as
escrituras de Deus,/ as escrituras de João./ Tudo é Bíblias. Tudo
é Grande Sertão.'".
Num
ponto Adélia Prado parece estar certa. De todos os autores citados
neste "Literatura Brasileira Hoje", não há muito quem se
compare aos grandes nomes do século passado, como Guimarães Rosa
ou Drummond. Carência que torna o trabalho de Costa Pinto ainda
mais útil e digno de admiração.
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