Perpétua Amorim
Prefácio do livro
Talvez por ser apreciador de música,
sou inclinado a procurar musicalidade nos poemas. Para mim é
essencial, embora isso atualmente tenha sido abandonado por muitos.
A música é, no entanto, uma linguagem complexa que procura
“mimetizar” (em sentido aristotélico) aspectos da natureza
compatíveis com sua própria natureza. E, como não possui um modelo
na natureza e não exprime um conteúdo conceitual, só se pode falar
dela em áridos termos técnicos ou com imagens poéticas. Assim, seu
reino, na verdade, não é o do comum das pessoas: pertence quase ao
sonho, à fantasia, ao território que só é comum ao dos poetas.
“Compor” é o mais adequado termo para definir a elaboração ou a
confecção de um poema e de uma música
As primeiras lições sobre música
ensinam que “melodia”, “harmonia” e “ritmo”, são os elementos
básicos de uma “composição musical”. A “melodia” como a sucessão de
sons que se relacionam de maneira natural, agradável, arranjados em
uma linha agradável ao ouvido; facilmente identificável por ser o
canto principal de uma peça musical. A “harmonia” como a combinação
de sons que, embora diferentes, mantém entre si uma relação de
pertinência; por outra, um conjunto de sons agradáveis ao ouvido. O
“ritmo” como o balanço, a cadência de sons que imprimem a pulsação
da música em batidas, fortes e fracas, que se alternam com
intervalos regulares em um verso ou em uma frase musical. Na poesia,
esses mesmos elementos e conceitos devem ser aplicados: a semelhança
entre poesia e música é inegavelmente natural.
Associar a poesia à música não é
tarefa fácil, no entanto. Exige que a musicalidade das palavras seja
organizada em um canto agradável, que tenha sentido; que a harmonia
esteja definida nos sons consoantes; que o ritmo esteja na cadência
marcada, definida; que a soma dos elementos exprima uma idéia, uma
mensagem, uma história etc. A técnica, a forma de composição, a
escolha dos temas varia no tempo, no espaço e conforme a
sensibilidade do músico ou do poeta.
Esse feliz encontro de música e poesia
está presente neste livro de Perpétua Amorim:
“Em tempos de vida
Vi morte sofrida” (p. 33)
“Eu bromélia
suspensa no ar,
agarrando vida
no vento e na chuva” (p. 17)
“Quase nada restou do branco caiado
Nas fortes paredes do velho sobrado” (p. 19)
“Ergo catedrais enquanto durmo
Sem algemas, encontro caminhos” (p. 26)
Não há de que duvidar: isso é música,
isso é poesia! A poesia melodiosa, agradável, ritmada, livre de
desencontros. Só discordo de Perpétua Amorim, quando diz, num jogo
de palavras:
“Eu perpétua,
desbotada,
agrupada,
sem graça” (p. 18)
Gostaria eu de assim ser poeta!
José Eurípedes de Oliveira Ramos
Presidente da Academia Francana de Letras.
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