(in)site pós-fim-do-mundo
Gerou-se dos que disputam
Mamadeira, faca, bala
Com baratas, pernilongos
Cangalexéus advindos
De depois do fim de tudo
Indefectíveis
monstros
Virtuais e invasivos
Derivam-se os k-bytes
Destes vossos olhos ávidos
Cheios de ódio
e medo
No ninho da vossa serpente
Em poltrona confortável
Protegida por paredes
Ou mesmo de vossos
carros
Que desfilam estes alqueires
Please, don’t care, entretanto,
You always can pay cash
Mesmo que seja em peseta
Ou demais cartões
descrédito
Via internet, muamba
Pistolas eletrônicas
Valem chips de algibeira
Conta na fétida
web
Cueca de grife falsa
Um blusão stone
washed
Perfume barato de feira
Vos faz credor de uma
foda
Uma loura bem gelada
Uma simples cafungada
Mais ainda vosso gozo
Paga a nossa brincadeira
Fazemos diariamente
A ponte aérea
da vida
Útero – Calçada
– Jaula
É a nossa trajetória
Não nos ofende
amiúde
Desviar a nossa rota
Do meio-fio à
sarjeta
O que não mata
entorna
Escala na escola craque
Navalha na Carne rija
Aurora mal esboçada
No quadrado dos escroques
Amorcegar paralamas
Navegar sobre o metrô
Só entorpecem
a imagem
Nosso bolso não
engorda
Na
lã macia do asfalto
Fervente em que pisamos
Dê-nos coca, cola
a vida
No paredão proibido
Por um tubo que escondemos
Tontos escafandristas
Ofegantes no buraco
Da nossa rota camisa
É apenas um instante
De alimento indecente
Comida de brinquedo
No asfalto fumegante
Qual nossa lida estanque
Tal qual a Globo anuncia
Brinquedo, comer poesia
Com nossos olhos dormentes
Da senzala até
a favela
Até que não
custou caro
Foi apenas a passagem
Por grandes túneis
de barro
Da noite fomos escravos
Escravos somos do dia
Do ferro sem serventia
Desta moeda minguada
O tronco podre esquecido
De que nascemos um dia
Fundou nosso cris-du-chat
Nosso ar beneditino
Gatos, pois, mimetizados
Atraímos cães
famintos
Perdidos lobos notívagos
Que permeiam o Central
Park
Pente-barata no bolso
Estofada hegemonia
Nosso enorme mouse-pad
Exibe-se por uns miúdos
Pede o CD-rom ferro
Uns trocados no criado-mudo
Ao lado do CD-player
Tocando aos berros “Bad”
Filhos de Billy Jean
De quem Michael vos diria
She claims I’m the one
But the kid is not my
son
Mas por certo adoraria
Poder ninar-nos infantes
Na elegante gelosia
Com a máscara
do hierofante
Nosso velho Doce Abutre
Da Juventude perdida
Bica-nos o pouco fígado
Que nos resta nessa intriga
Ata-nos a essa pedra
Mesmo ebúrneo
achado guenzo
Que deu a Firenzi um
dia
O santo que matou Golias
Já que somos catedráticos
Na universidade vida
Fazemos qualquer negócio
Da noite pro vosso deleite
Subtraímos a culpa
Da vossa vida de ócio
Da vossa briga com o
medo
Compadres, nossos fregueses
Somos séquito fiel
Servis tropas zulus
De reis sem cetro ou
coroa
Sem algemas, cafuçus
Só a sorte é
nosso lema
Nosso emblema ter-vos
nus
Ainda de quarentena
Suportamos vosso pus
Mesmo que vosso esquema
Não inclua aratus
como tema
Tendes que agüentar
Psoríase em nossa
pá
Da sífilis somente
a marquinha
Na coxa da aratuzinha
Que esquenta o nosso
colo
Deitai, gozai, deixai
pra lá
Nós, os malditos
frutos
Do vosso ventre cobiça
No leito pujante de esgares
Alheios a toda malícia
Vos prometemos delícia
Vinagre aos que têm
sede
Aos pés da cruz
vossa rede
Em vossos pés
nosso altar
Não dessas redes
de intriga
Redes ricas de varandas
Queremos saber do amor
Esta pérola escondida
Sob o lixo do desejo
Sob o ícone arrogante
Sob a paz do vosso lar
Forjamos nossa Guernica
Nosso sonho é pouco,
embora,
Obter vossa licença
Sorriso ao chamar-vos
tios
Carona em vossa chacina
Poder vender balas vadias
Mesmo que balas de chumbo
No sinal fechado ao dia
No molde do mundo de
agora
Deflagrar balas de sonho
Por tesouro reluzente
E taciturnos deitarmos
Em vossa higidez doente
Acordar em grande estilo
Comer tâmara, escovar
dente
Tomarmos o mundo nas
mãos
E atirá-lo ao
poente
Good morning, novo milênio
Alons enfants de puterie,
Gutten nacht, século
vinte,
A favela vos espia
De vossos filhos e netos
Seremos mestres um dia
Eis de pé a vossa
cria
A guarnecer e parir
Nós, os novos Colombos,
Entraremos de helicóptero
Ou mesmo de coleóptero
Vosso lombo de marfim
Vosso módulo arredio
Será finalmente
domado
Instauraremos a paz
Com munição
chinfrim
Com unhas de guaiamum
Marcharemos na calçada
da fama com nossa lama
Com nosso peito comum
De Schwarzenegger anum
Encenaremos soberbos
Anjos exterminadores
Da tristeza de cada um
E quando, ao despertardes,
Não reconhecerdes
tardes
Erva daninha, ser
vivo
Ou outros bichos daqui
Lembrai que em nada difere
O terno de linho cage
Da lama do overcoat
Sobre esta home page
Agora e bem na hora
Da nossa morte calada
Quando todos
já vislumbram
Que sunt mala quae libas
Vinho e pão via
internet
Em nome da nossa amizade
Por fim serão
servidos
Ipse venena bibas
É vã ilusão pensar
Que o mundo não acabou
Deletamos vossos campos
Imagem estrada dor
Corpo emoção
altruísta
Altura, saber, vigor
Viagens ao firmamento
Fomes, aids, East Timor
Queremos somente foder
Vosso ponto reluzente
Um cu de lume que pisca
Na escuridão do
poente
Não suportamos
migalhas
Nem o nome de dementes
Aguardar debaixo da ponte
Vossos restos de doentes
Queremos o vosso amor
Definitivamente
Não só
um canto na sala
Estes míseros
instantes
Comecemos do nascente?
Esqueçamos nossas
tralhas?
Plantemos nossa semente?
Desterremos as mortalhas?
Aflitos, 14.12.1999