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Pethion de Villar

 

 
remetido por
Antônio Paulo Góes de Araújo
À BEIRA MAR 
 
Da ist nicht, was den Menschen entsetzen 
( SCHILLER )- “Die Braut von Messina 
 

A noite desce torva ... ao longe mais se apaga, 
Na glauca escuridão boiando, o sol que morre; 
Das bordas do horizonte aos escarcéus da plaga, 
Fosforeando o abismo um calafrio corre. 

Em leque se irradiam as pulsações sangrentas 
Da luz crepuscular, que a bruma afoga. Irada, 
Na sombra sacudindo as crinas alvacentas, 
Revolta-se a mareta ao sopro da lufada. 

Espadando espuma, hercúlea a esmigalhar 
O peito contra a pedra, a onda avança, enorme... 
Creba ressaca estoura. Ó placidez ! Ó calma ! 

Eu zombo desta fúria ! Em vão bravejas, mar ! 
É mais feroz a dor que no meu peito dorme ! 
Mais forte é a paixão que me referve n’alma. ! 
 
 

Janeiro de 1890 - 
Farol da Barra 
23 



 IMPAVIDUS 
 

(MARINHA) 
 

A MÁRIO DE LAVEZZARI 
(Pseudônimo do Pai do Autor 
 Francisco Moniz Barreto de Aragão ) 
 

Como leões , num furibundo salto 
Dos vagalhões a cáfila teimosa, 
Da enorme penedia majestosa, 
Babando galga o dorso de basalto 

Eis que tudo se cala, pára o assalto, 
Agacha-se a mareta rancorosa; 
Vencida, corre atrás, porém raivosa, 
É de costas que foge olhando o alto 

Baluarte que espera calmamente; 
Recua mais, recua e de repente, 
Parte co’a cega rapidez da bala, 

De encontro á pedra que deste ódio zomba. 
Forceja espumejando, em vão ribomba : 
A rocha imperturbável não se abala ! 

1898 
 
 


 
A GAIVOTA 
 
( Paráfrase ) 
 
 
 
 

 A água imota, 
 Clara e fria 
 Já denota 
 Calmaria; 

 A gaivota, 
 Que assobia, 
 Vai de rota 
 Fugidia 

 Simulando 
 Num vôo lento 
 E perplexo 

 Um acento 
 Circunflexo 
 Perpassando 

1898 
 


 
MARINHA 
 

Desce a noite enrolada em brumas hibernais... 
Trágica solidão, vago instante sombrio, 
Em que, tonto de medo o olhar não sabe mais 
Onde começa o mar e onde acaba o navio 

Nem o arfar de uma vaga : o mar parece um rio 
De óleo; oxidado o céu de nuvens colossais, 
Um zimbório de chumbo acaçapado e frio, 
Escondendo no bojo a alma dos temporais. 

Nem das águas no espelho o reflexo de um astro... 
Apenas o farol, no vértice do mastro 
Rubra pupila, a arder, dentro de uma garoa... 

E lá vai o navio , espectral, lento e lento, 
Como um negro vampiro, enorme sonolento, 
Pairando sobre um caos de tênebras, à toa. 
 


PINTURA A ÓLEO 
(Marinha) 


Contra a rocha que sempre impávida se apruma,  
A onda sempre a bater, como um trovão detona;  
Sangra o Sol moribundo; a montanha se esfuma;  
Vem a Lua a boiar dos vagalhões à tona. 

Do horizonte na escura e formidável zona 
Entra, lento, um navio amortalhado em bruma; 
A água do mar parece uma verde amazona, 
Sacudindo na treva o seu cocar de espuma. 

As palmeiras têm medo! Ao furibundo açoite 
Do nordeste, no azul, vão-se acendendo as brasas 
Dos astros, metralhando o veludo da noite. 

Uma gaivota a piar, como lúgubre harfangue, 
Lá foge barra fora, abrindo as grandes asas 
Que o último olhar do sol mosqueia de ouro e sangue... 

1902

este poema [pintura a óleo] foi remetido por
Walter Cid
os demais, por
Antônio Paulo Góes de Araújo

 
O MAR ESTÁ COM FOME 
 
Ao meu velho Amigo e Mestre 
Dr. Odorico Otávio Odilon 
 

O mar amanheceu de mau humor, 
Estranhas ameaças rebusnando ; 
Babando as praias, cheio de rancor, 
Como d’hienas um raivoso bando... 

As sobrancelhas franze de negror... 
Nuvens lhe vão o dorso escameando; 
Desde alta noite que um feral tambor 
Anda na treva bárbaro rufando... 

Sair não pode o sol... a tempestade 
Cedo o prendeu num cárcere de brumas 
Pesada noite, céus e terra invade !... 

Sobre das ondas uma voz sem nome, 
Abre-se goela branca das espumas... 
Homens ! fugi ! ...O mar está com fome !... 

1903 
 
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