Rachel de Queiroz


Telha de Vidro


      Quando a moça da cidade chegou
      veio morar na fazenda,
      na casa velha...
      Tão velha!
      Quem fez aquela casa foi o bisavô...
      Deram-lhe para dormir a camarinha,
      uma alcova sem luzes, tão escura!
      mergulhada na tristura
      de sua treva e de sua única portinha...
       

      A moça não disse nada,
      mas mandou buscar na cidade
      uma telha de vidro...
      Queria que ficasse iluminada
      sua camarinha sem claridade...
       

      Agora,
      o quarto onde ela mora
      é o quarto mais alegre da fazenda,
      tão claro que, ao meio dia, aparece uma
      renda de arabesco de sol nos ladrilhos
      vermelhos,
      que — coitados — tão velhos
      só hoje é que conhecem a luz doa dia...
      A luz branca e fria
      também se mete às vezes pelo clarão
      da telha milagrosa...
      Ou alguma estrela audaciosa
      careteia
      no espelho onde a moça se penteia.
       

      Que linda camarinha! Era tão feia!
      — Você me disse um dia
      que sua vida era toda escuridão
      cinzenta,
      fria,
      sem um luar, sem um clarão...
      Por que você na experimenta?
      A moça foi tão vem sucedida...
      Ponha uma telha de vidro em sua vida!


           
Remetente: Álvaro Pacheco


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