Rosalice de Araújo Scherffius
Festas Juninas
Arraiá Junino é coisa
de criança, para crianças de todas as idades
"Quanta fogueira,quanto balão
quanta brincadeira
todo mundo no terreiro faz adivinhação..."
E a meninada escutava
atenta enquanto as avozinhas de uns e de outros se revezavam
mantendo a moçada ocupada,para que os adultos também pudessem ter o
seu divertimento. "O que é, o que é... uma capelinha
branca,sem porta e sem tranca?"
"Essa eu já sabia, é um ovo!" muitas vozes alegres e
inquietas reclamavam ao mesmo tempo. "Então vamos pra outra, ou
vocês querem ouvir uma historia de trancoso?" a bondosa velhinha
tentava apaziguar os ânimos e não perder a freguesia, pois os
pequeninos podiam disparar em corridas a procura de seus pais a
qualquer momento. Mas existe uma arte no entreter crianças...é
preciso manter a atenção e o foco ...é preciso ter manha de Vó, que
tudo sabe e nunca se cansa... que pode num instante fazer criança
parar de chorar e sorrir por uma besteirinha de nada..."Venham cá,
tenho uma historinha especial pra vocês,comeca assim ... "
"Era uma vez uma galinha pedrez,
soltou um pum pum
pra voces trez"
E a gargalhada era
solta e ingênua! a meninada toda sorria sem parar por um bom tempo,
fazendo com que a audiência aumentasse... agora também as mocas e
rapazes solteiros também queriam vir ouvir o que se passava naquela
roda.
As varandas e alpendres
de algumas casas se vestiam de bandeirinhas e bandeirolas azul e
encarnadas (acho que era assim que chamavam a cor vermelha). No
terreiro do Arraial era a maior animação! Quadrilha a ser dançada
com todos os necessários apetrechos, noiva e noivo, padre, o
gritador que sabia pronunciar as palavras francesas "Anavant,
Anarrier, balacer com seus pares...
nos seus lugares"...
Guloseimas não
faltavam, cada família trazia alguma coisa, e de repente havia ali,
diante dos olhos de todos uma festa de dar água na boca a qualquer
um...Fazem muitos anos (algumas décadas, para falar a verdade), que
apenas posso sonhar com estes sabores tão queridos de minha
infância...
O cardápio era
ilimitado aos meus olhos infantis e já não recordo todos os pratos
servidos durante as festas juninas, eram balinhas de limão, bolinhas
de coco chamadas beijos, broas de goma, cuscuz com leite e nata,
tijolinhos de doce de leite, mungunzá, pamonha, milho verde cozido
ou assado, pé de moleque, batata doce assada na fogueira, canjica,
arroz doce polvilhado com canela, bolo de macaxeira, e aquele
refresco feito com cascas de abacaxi, cravo e canela e envelhecido
no pote de barro, acho que o nome é aluá...nem fala...
Na região Nordestina de
Caetés, (mais precisamente em terras Alagoanas), se comemora um
pouco deste nobre e rico folclore, tão peculiar ao brasileiro, tão
pleno de riquezas como a própria historia de um Brasil, mesmo antes
de assim ser chamado...a gente boa dessa área ainda desfruta o
privilegio de brincar o Pastoril, forró e quem sabe até mesmo musica
de zabumba , sanfona, triangulo, pandeiro, quem sabe reco-reco
também... O " Arraia Caetés" fica assim na historia...
Com certeza a fogueira
vai queimar com o ruído das palhas do milho ou bananeira salpicando
pra todo lado, fazendo as mães mandarem a meninada se afastar do
fogo um milhão de vezes! Papai gostava muito de ferver a água da
chaleira nas brasas da fogueira e depois mamãe fazia café,daqueles
torradinho em casa mesmo. Ele dizia que era o único café realmente
quente, próprio para o consumo de quem apreciava a iguaria...
inúmeras vezes , eu ouvi um amigo de Papai contar para diferentes
pessoas, a história de um homem que não sossegou enquanto não tomou
o café perfeito. Assim diz a conversa, que o tal homem mandou a
mulher torrar, moer, pilar e preparar o café com água quente,
fervida nas brasas de fogueira de lenha, escaldar a xícara e em
seguida ele tomou o café ainda borbulhando de tão quente que estava!
apos este ato, o cavalheiro passou o dedo indicador ao redor da
boca, arrodeando o contorno da mesma, e em seguida, jogou os lábios
fora!!! imagine a queimadura!!! Quando menina eu visualizava a cena
em minha mente, o homem a procura do "café perfeito" que tinha de
ser assim tão quente! Nunca fez sentido para mim, mas eu jamais
ousaria questionar uma historia contada por um amigo de Papai.
E as cumades e cumpades
?
"São João disse, Sao Pedro confirmou
vamos ser cumades,
que São João mandou"
Pula pra lá, pula pra
cá - do lado da fogueira algumas toras de lenha eram posicionadas de
maneira adequada para que as pessoas pudessem selar seu novo
"parentesco por escolha e boa amizade"... como é rico o folclore de
nossa bela terra!
Imagino que existem
raizes ainda mais profundas do que as que na sup[erficie podemos
observar.
"São João disse, São Pedo confirmou
seja meu afilhado,
que São João mandou"
Talvez um contrato,um
vinculo de validade inquestionável!
Cumpadres e comadres e seus afilhados e afilhadas são assim tão
"parentes" quanto aqueles a quem estamos ligados por nascimento...
Por que o costume? de onde e quando se origina a tradição?
E os fogos? E os
balões? existem ainda balões nos céus juninos brasileiros deste novo
milênio?
"Noite fria, tão fria de junho
os balões lá no Céu vão subindo
pelas nuvens aos poucos sumindo,
vão os balões lá no Céu...
Os balões devem ser com certeza,
as estrelas daqui deste mundo,
pois as estrelas do espaço profundo,
são os balões lá do Céu...
Balões dos meus sonhos dourados,
subiste encantado olhando Jesus,
hoje as crianças pegaram rasgaram teu bojo de listras azuis..."
Muitas musiquinhas de
São João vararam o tempo e permaneceram famosas... imagino que
existem outras tantas
que precisam soltar sua voz e clamar um espaço que ainda existe , no
coração de crianças de todas as idades...
Entre Santo Antonio e suas adivinhações, São João e todos os
festejos plenos, e até São Pedro com suas quadrilhas e forrós, ali,
bem no finzinho de junho, para garantir que todos participem um
pouquinho... temos os festejos mais animados do coração da terrinha
querida.
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