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                   O
                  americano, outra
                  vez!
                  
                   
                  RICHARD
                  FEYNMAN
                  
                   
                   
                  
                   
                  
                  
                  Final 
                    
                  Durante
                  minha estada de dez meses no Brasil, interessei-me pelos níveis
                  de energia dos núcleos mais leves. Calculei toda a teoria
                  disso no meu quarto de hotel, mas eu queria verificar como
                  pareciam os dados da experiência. Era uma coisa nova que
                  estava sendo trabalhada no Laboratório Kellogg por peritos da
                  Caltech; então entrei em contato com eles o horário estava
                  todo arrumado  por rádio. Descobri um operador de rádio
                  amador no Brasil e mais ou menos uma vez
                  por semana eu ia à casa dele. Ele fazia contatos com o
                  operador de rádio em Pasadena e depois, por ser uma coisa um
                  pouco ilegal, ele me dava algumas letras de chamada e dizia:
                  "Agora vou passar para WKWX, que está sentado perto de
                  mim, e gostaria de falar com você". Aí eu dizia:
                  "Aqui é WKWX. Você poderia dizer-me o espaçamento
                  entre os certos níveis de boro sobre os quais falamos semana
                  passada", e assim por diante. Eu usava os dados das
                  experiências para ajustar minhas constantes e verificar se
                  estava no caminho certo.
                  
                   
                  O
                  primeiro rapaz saiu de férias, mas deu-me um outro operador
                  para prosseguir. O segundo cara era cego e operava sua estação.
                  Os dois eram muitos gentis, e o contato que tive com Caltech
                  por rádio foi muito efetivo e útil para mim. 
                  
                   
                  Com
                  relação à física propriamente dita, resolvi boa parte e
                  foi bastante razoável. Posteriormente, ela foi calculada e
                  verificada por outras pessoas. Mesmo assim, decidi que tinha
                  muitos parâmetros a serem ajustados  muitos "ajustes
                  fenomênicos das constantes" para tornar tudo apropriado
                   que eu não podia ter certeza que fosse muito útil. Eu
                  queria um entendimento mais profundo dos núcleos e nunca
                  fiquei convencido o bastante de que meu conhecimento fosse
                  muito significativo.
                  
                   
                  Por
                  esse motivo é que eu nunca fiz nada com isso. Em relação à
                  educação no Brasil, tive uma experiência muito
                  interessante. Eu estava dando aulas para um grupo de
                  estudantes que se tornariam professores, uma vez
                  que àquela época não havia muitas oportunidades no Brasil
                  para pessoal qualificado em ciências. Esses estudantes já
                  tinham feito muitos cursos, e esse deveria ser o curso mais
                  avança-
                  
                   
                  do
                  em eletricidade e magnetismo  equações de Maxwell, e assim
                  por diante.Descobri um fenômeno muito estranho: eu podia
                  fazer uma pergunta e os alunos respondiam imediatamente. Mas
                  quando eu fizesse a pergunta de novo  o mesmo assunto e a
                  mesma pergunta, até onde eu conseguia , eles simplesmente não
                  conseguiam responder! Por exemplo, uma vez
                  eu estava falando sobre luz polarizada e dei a eles alguns
                  filmes polaróide.
                  
                   
                   
                  
                   
                  O
                  polaróide só passa luz cujo vetor elétrico esteja em uma
                  determinada direção; então expliquei como se pode dizer em
                  qual direção a luz
                  está polarizada, baseando-se em se o polaróide é escuro ou
                  claro. Primeiro pegamos duas filas de polaróide e giramos até
                  que elas deixassem
                  passar a maior parte da luz. A partir disso, podíamos dizer
                  que as duas fitas estavam admitindo a luz polarizada na mesma
                  direção  o que passou por um pedaço de polaróide também
                  poderia passar pelo outro. Mas, então, perguntei como se
                  poderia dizer a direção absoluta da polarização a
                  partir de um 
                  único polaróide.
                  
                   
                  Eles
                  não faziam a menor idéia. Eu sabia que havia um pouco de
                  ingenuidade; então dei uma pista: "Olhe a luz refletida
                  da baía lá fora". Ninguém disse nada. Então eu disse:
                  "Vocês já ouviram falar do Ângulo de Brewster?"
                   Sim, senhor! O Ângulo de Brewster é o ângulo no qual a
                  luz refletida de um meio com um índice de refração é
                  completamente polarizada. E em que direção a luz é
                  polarizada quando é refletida?  A luz é polarizada
                  perpendicular ao plano de reflexão, senhor. Mesmo hoje em
                  dia, eu tenho de pensar; eles sabiam fácil! Eles sabiam até
                  a tangente do ângulo igual ao índice! Eu disse:
                  "Bem?" Nada ainda. Eles tinham simplesmente me dito
                  que a luz refletida de um meio com um índice, tal como a baía
                  lá fora, era polarizada: eles tinham me dito até em qual 
                  direção ela estava polarizada. Eu disse:
                  "Olhem a baía lá fora, pelo polaróide. Agora virem o
                  polaróide". Ah! Está polarizada"!, eles disseram.
                  Depois de muita investigação, finalmente descobri que os
                  estudantes tinham decorado tudo, mas não sabiam o que queria
                  dizer. Quando eles ouviram "luz que é refletida de um
                  meio com um índice", eles não sabiam que isso
                  significava um material 
                  como a água . Eles não sabiam que a "direção
                  da luz" é a direção na qual você 
                  vê alguma coisa quando está olhando, e assim
                  por diante. Tudo estava totalmente decorado, mas nada havia
                  sido traduzido em palavras que fizessem sentido. Assim, se eu
                  perguntasse: "O que é o Ângulo de Brewster?", eu
                  estava entrando no computador com a senha correta. Mas se eu
                  digo: "Observe a água, nada acontece  eles não têm
                  nada sob o comando "Observe a água".
                  
                   
                  Depois
                  participei de uma palestra na faculdade de engenharia. A
                  palestra foi assim: "Dois corpos... são considerados
                  equivalentes... se torques iguais... produzirem... aceleração
                  igual. Dois corpos são considerados equivalentes se torques
                  iguais produzirem aceleração igual". Os estudantes
                  estavam todos sentados lá fazendo anotações e, quando o
                  professor repetia a frase, checavam para ter certeza de que
                  haviam anotado certo. Então eles anotavam a próxima frase, e
                  a outra, e a outra.
                  Eu era o único que sabia que o professor estava falando sobre
                  objetos com o mesmo momento de inércia e era difícil
                  descobrir isso. Eu não conseguia ver como eles aprenderiam
                  qualquer coisa daquilo. Ele estava falando sobre momentos de
                  inércia, mas não se discutia quão difícil é empurrar uma
                  porta para abrir quando se coloca muito peso do lado de fora,
                  em comparação quando você coloca perto da dobradiça  nada!
                  
                   
                  Depois
                  da palestra, falei com um estudante: "Vocês fizeram uma
                  porção de anotações  o que vão fazer com elas?" 
                  Ah, nós as estudamos, ele diz. Nós teremos uma prova.  E
                  como vai ser a prova?  Muito fácil. Eu posso dizer agora
                  uma das questões. Ele olha em seu caderno e diz: "Quando
                  dois corpos são equivalentes?" E a resposta é:
                  "Dois corpos são considerados equivalentes se torques
                  iguais produzirem aceleração igual". Então, você vê,
                  eles podiam passar nas provas, "aprender" essa coisa
                  toda e não 
                  saber nada, exceto o que eles tinham decorado.
                  Então fui a um exame de admissão para a faculdade de
                  engenharia. Era uma prova oral e eu tinha permissão para
                  ouvi-la. Um dos estudantes foi absolutamente fantástico: ele
                  respondeu tudo certinho! Os examinadores perguntaram a ele o
                  que era diamagnetismo e ele respondeu perfeitamente. Depois
                  eles perguntaram: "Quando a luz chega a um ângulo através
                  de uma lâmina de material com uma determinada espessura, e um
                  certo índice N, o que acontece com a luz? 
                  Ela aparece paralela a si própria, senhor 
                  deslocada. E em quanto ela é deslocada? Eu não sei, senhor,
                  mas posso calcular. Então, ele calculou. Ele era muito bom.
                  Mas, a essa época, eu tinha minhas suspeitas.
                  
                   
                  Depois
                  da prova, fui até esse brilhante jovem e expliquei que eu era
                  dos Estados Unidos e que eu queria fazer algumas perguntas a
                  ele
                  
                  que
                  não afetariam, de forma alguma, os resultados da prova. A
                  primeira pergunta que fiz foi: "Você pode me dar algum
                  exemplo de uma substância diamagnética?" Não. Aí eu
                  perguntei: "Se esse livro fosse feito de vidro e eu
                  estivesse olhando através dele alguma coisa sobre a mesa, o
                  que aconteceria com a imagem se eu inclinasse o copo?"
                  Ela seria defletida, senhor, em duas vezes o ângulo que o
                  senhor tivesse virado o livro. Eu disse: "Você não fez
                  confusão com um espelho, fez?"  Não senhor! Ele havia
                  acabado de me dizer na prova que a luz seria deslocada,
                  paralela a si própria e, portanto, a imagem se moveria para
                  um lado, mas não seria alterada por ângulo algum. Ele havia
                  até mesmo calculado em quanto ela seria deslocada, mas
                  não percebeu que um pedaço de vidro é um material com um índice
                  e que o cálculo dele se aplicava à minha pergunta. Dei um
                  curso na faculdade de engenharia sobre métodos matemáticos
                  na física, no qual tentei demonstrar como resolver os
                  problemas por tentativa e erro. É algo que as pessoas
                  geralmente não aprendem; então comecei com alguns exemplos
                  simples para ilustrar o método. Fiquei surpreso porque apenas
                  cerca de um entre cada dez alunos fez a tarefa. Então fiz uma
                  grande preleção sobre realmente ter de 
                  tentar e não só ficar sentado 
                  me vendo fazer.
                  
                   
                  Depois
                  da preleção, alguns estudantes formaram uma pequena delegação
                  e vieram até mim, dizendo que eu não havia entendido os
                  antecedentes deles, que eles podiam estudar sem resolver os
                  problemas, que eles já haviam aprendido aritmética e que
                  essa coisa toda estava abaixo do nível deles. Então
                  continuei a aula e, independente de quão complexo ou
                  obviamente avançado o trabalho estivesse se tornando, eles
                  nunca punham a mão na massa. É claro que eu já havia notado
                  o que acontecia: eles não conseguiam 
                  fazer. Uma outra
                  coisa que nunca consegui que eles fizessem foi perguntas. Por
                  fim, um estudante explicou-me: "Se eu fizer uma pergunta
                  para o senhor durante a palestra, depois todo mundo vai ficar
                  me dizendo: "Por que você está fazendo a gente perder
                  tempo na aula? Nós estamos tentando aprender alguma
                  coisa, e você o está interrompendo, fazendo perguntas".
                  Era como um processo de tirar vantagens, no qual ninguém sabe
                  o que está acontecendo e colocam os outros para baixo como se
                  eles 
                  realmente soubessem. Eles todos fingem que
                  sabem, e se um estudante faz uma pergunta, admitindo por um
                  momento que as coisas estão confusas, os outros adotam uma
                  atitude de superioridade, agindo como se nada fosse confuso,
                  dizendo àquele estudante que ele está desperdiçando o tempo
                  dos outros. Expliquei a utilidade de se trabalhar em grupo,
                  para discutir as dúvidas, analisá-las, mas eles também não
                  faziam isso porque estariam deixando cair a máscara se
                  tivessem de perguntar alguma coisa a outra
                  pessoa. Era uma pena! Eles, pessoas inteligentes,
                  faziam todo o trabalho, mas adotaram essa estranha forma de
                  pensar, essa forma esquisita de autopropagar a "educação",
                  que é inútil, definitivamente inútil!
                  
                   
                  Ao
                  final do ano acadêmico, os estudantes pediram-me para dar uma
                  palestra sobre minhas experiências com o ensino no Brasil. Na
                  palestra, haveria não só estudantes, mas também professores
                  e oficiais do governo. Assim, prometi que diria o que
                  quisesse. Eles disseram: "É claro. Esse é um país
                  livre". Aí eu entrei, levando os livros de física
                  elementar que eles usaram no primeiro ano de faculdade. Eles
                  achavam esses livros bastante bons porque tinham diferentes
                  tipos de letra  negrito para as coisas mais importantes para
                  se decorar, mais claro para as coisas menos importantes, e
                  assim por diante. Imediatamente, alguém disse: "Você não
                  vai falar sobre o livro, vai? O homem que o escreveu está
                  aqui, e todo mundo acha que esse é um bom livro". 
                  
                   
                  Você
                  me prometeu que eu poderia dizer o que quisesse. O auditório
                  estava cheio. Comecei definindo ciência como um entendimento
                  do comportamento da natureza. Então, perguntei: "Qual um
                  bom motivo para lecionar ciência? É claro que país algum
                  pode considerar-se civilizado a menos que... pá, pá, pá".
                  Eles estavam todos concordando, porque eu sei que é assim que
                  eles pensam. Aí eu disse: "Isso, é claro, é absurdo,
                  porque qual o motivo pelo qual temos de nos sentir em pé de
                  igualdade com outro país? Nós temos de fazer as coisas por
                  um 
                  bom motivo, uma razão sensata; não
                  apenas porque os outros países fazem". Depois, falei
                  sobre a utilidade da ciência e sua contribuição para a
                  melhoria da condição humana, e toda essa coisa  eu
                  realmente os provoquei um pouco.
                  
                   
                  Daí
                  eu disse: "O principal propósito da minha apresentação
                  é provar aos senhores que não se está ensinando ciência 
                  alguma no Brasil!"
                  
                   
                  Eu
                  os vejo se agitar, pensando: "O quê? Nenhuma ciência?
                  Isso é loucura! Nós temos todas essas aulas". Então eu
                  digo que uma das primeiras coisas a me chocar quando cheguei
                  ao Brasil foi ver garotos da escola elementar em livrarias,
                  comprando livros de física. Havia tantas crianças aprendendo
                  física no Brasil, começando muito mais cedo do que as crianças
                  nos Estados Unidos, que era estranho que não houvesse muitos
                  físicos no Brasil  por que isso acontece? Há tantas crianças
                  dando duro e não há resultado. 
                  
                   
                  Então
                  eu fiz a analogia com um erudito grego que ama a língua
                  grega, que sabe que em seu país não há muitas crianças
                  estudando
                  
                  grego.
                  Mas ele vem a outro país, onde fica feliz em ver todo mundo
                  estudando grego  mesmo as menores crianças nas escolas
                  elementares. Ele vai ao exame de um estudante que está se
                  formando em grego e pergunta a ele: "Quais as idéias de
                  Sócrates sobre a relação entre a Verdade e a Beleza?"
                   e o estudante não consegue responder. Então ele pergunta
                  ao estudante: "O que Sócrates disse a Platão no
                  Terceiro Simpósio?" O estudante fica feliz e prossegue:
                  "Disse isso, aquilo, aquilo outro"  ele conta tudo
                  o que Sócrates disse, palavra por palavra, em um grego muito
                  bom. Mas, no Terceiro Simpósio, Sócrates estava falando
                  exatamente sobre a relação entre a Verdade e a Beleza! O que
                  esse erudito grego descobre é que os estudantes em outro país
                  aprendem grego aprendendo primeiro a pronunciar as letras,
                  depois as palavras e então as sentenças e os parágrafos.
                  Eles podem recitar, palavra por palavra, o que Sócrates
                  disse, sem perceber que aquelas palavras gregas realmente 
                  significam algo. Para o estudante, elas não
                  passam de sons artificiais. Ninguém jamais as traduziu em
                  palavras que os estudantes possam entender.
                  
                   
                  Eu
                  disse: "É assim que me parece quando vejo os senhores
                  ensinarem `ciência' para as crianças aqui no Brasil"
                  (Uma pancada, certo?)
                  
                   
                  Então
                  eu ergui o livro de física elementar que eles estavam usando.
                  "Não são mencionados resultados experimentais em lugar
                  algum desse livro, exceto em um lugar onde há uma bola,
                  descendo um plano inclinado, onde ele diz a distância que a
                  bola percorreu em um segundo, dois segundos, três segundos, e
                  assim por diante. Os números têm Erros  ou seja, se você
                  olhar, você pensa que está vendo resultados experimentais,
                  porque os números estão um pouco acima ou um pouco abaixo
                  dos valores teóricos. O livro fala até sobre ter de corrigir
                  os erros experimentais  muito bem. No entanto, uma bola
                  descendo em um plano inclinado, se realmente for feito isso,
                  tem uma inércia para entrar em rotação e, 
                  se você fizer a experiência , produzirá cinco
                  sétimos da resposta correta, por causa da energia extra
                  necessária para a rotação da bola. Dessa forma, o único
                  exemplo de `resultados' experimentais é obtido de uma experiência
                  
                  
                  falsa.
                  
                   
                   Ninguém
                  jogou tal bola, ou jamais teriam obtido tais resultados!"
                  "Descobri mais uma coisa", eu continuei. "Ao
                  folhear o livro aleatoriamente e ler uma sentença de uma página,
                  posso mostrar qual é o problema  como não há ciência,
                  mas memorização, em 
                  todos os casos. Então, tenho coragem o bastante
                  para folhear as páginas agora em frente a este público,
                  colocar meu dedo em uma página, ler e provar para os
                  senhores." Eu fiz isso. 
                  Brrrrrrrup  coloquei meu dedo e comecei a ler:
                  "Triboluminescência. Triboluminescência é a luz
                  emitida quando os cristais são friccionados..." Eu
                  disse: "E aí, você teve alguma ciência? Não! Apenas
                  disseram o que uma palavra significa em termos de outras
                  palavras. Não foi dito nada sobre a natureza  quais cristais
                  produzem luz quando você os fricciona, por que eles
                  produzem luz. Alguém viu algum estudante ir para cada e experimentar
                  isso? Ele não pode". "Mas, se em vez
                  disso, estivesse escrito: `Quando você pega um torrão de açúcar
                  e o fricciona com um par de alicates no escuro, pode-se ver um
                  clarão azulado. Alguns outros cristais também fazem isso.
                  Ninguém sabe o motivo. O fenômeno é chamado 
                  triboluminescência' . Aí alguém vai para casa
                  e tenta. Nesse caso, há uma experiência da natureza."
                  Usei aquele exemplo para mostrar a eles, mas não faria
                  qualquer diferença onde eu pusesse meu dedo no livro; era
                  assim em quase toda parte.Por fim, eu disse que não conseguia
                  entender como alguém podia ser educado neste sistema de
                  autopropagação, no qual as pessoas passam nas provas e
                  ensinam os outros a passar nas provas, mas ninguém sabe nada.
                  "No entanto", eu disse, "devo estar
                  errado.  
                  Há
                  dois estudantes na minha sala que se deram muito bem, e um dos
                  físicos que eu sei que teve sua educação toda no Brasil.
                  Assim, deve ser possível para algumas pessoas achar seu
                  caminho no sistema, ruim como ele é." Bem, depois de eu
                  dar minha palestra, o chefe do departamento de educação em
                  ciências levantou e disse: "O Sr. Feynman
                  nos falou algumas coisas que são difíceis de se ouvir, mas
                  parece que ele realmente ama a ciência e foi sincero em suas
                  críticas. Assim sendo, acho que devemos prestar atenção a
                  ele. Eu vim aqui sabendo que temos algumas fraquezas em nosso
                  sistema de educação; o que aprendi é que temos um câncer
                  !"  e sentou-se.
                  
                   
                  Isso
                  deu liberdade a outras pessoas para falar, e houve uma grande
                  agitação. Todo mundo estava se levantando e fazendo sugestões.
                  Os estudantes reuniram um comitê para mimeografar as
                  palestras, antecipadamente, e organizaram outros comitês para
                  fazer isso e aquilo. Então aconteceu algo que eu não
                  esperava de forma alguma. Um dos estudantes levantou-se e
                  disse: "Eu sou um dos dois estudantes aos quais o Sr. Feynman
                  se referiu ao fim de seu discurso. Eu não estudei no Brasil;
                  eu estudei na Alemanha e acabo de chegar ao Brasil".
                  
                   
                  O
                  outro estudante que havia se saído bem em sala de aula tinha
                  algo semelhante a dizer. O Professor que eu havia mencionado
                  levantou-se e disse: "Estudei aqui no Brasil durante a
                  guerra quando, felizmente, todos os professores haviam
                  abandonado a universidade: então aprendi tudo lendo sozinho.
                  Dessa forma, na verdade, não estudei no sistema
                  brasileiro".
                  
                   
                  Eu
                  não esperava aquilo. Eu sabia que o sistema era ruim, mas 100
                  por cento  era terrível! Uma vez
                  que eu havia ido ao Brasil por um programa patrocinado pelo
                  Governo dos Estados Unidos, o Departamento de Estado pediu-me
                  que escrevesse um relatório sobre minhas experiências no
                  Brasil, e escrevi os principais pontos do discurso que eu
                  havia acabado de fazer. 
                  
                   
                  Mais
                  tarde descobri, por vias secretas, que a reação de alguém
                  no Departamento de Estado foi: "Isso prova como é
                  perigoso mandar alguém tão ingênuo para o Brasil. Pobre
                  rapaz; ele só pode causar problemas. Ele não entendeu os
                  problemas". Bem pelo contrário! Acho que essa pessoa no
                  Departamento de Estado era ingênua em pensar que, porque viu
                  uma universidade com uma lista de cursos e descrições, era
                  assim que era.
                  
                   
                  
                   
                  
                   
                  O
                  Autor
                  
                   
                  RICHARD
                  PHILLIPS
                  FEYNMAN.
                  Nasceu
                  em Nova York em 1918. Estudou física no Massachusetts
                  Institut of Technology e na Universidade de Princeton. De 1945
                  até 1950, Feynman ensinou física
                  na Universidade de Cornell, até tornar-se professor do
                  Instituto de Tecnologia da Califórnia. Em 1965 recebeu o Prêmio
                  Nobel de Física, juntamente com o norte-americano
                  Julian Schwinger e com o japonês Shin´inchiró Tomonaga. Feynman
                  morreu em 1988.
                  
                   
                    
                   
                  
                   
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