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Francisco Miguel de Moura


 

Fortuna crítica: O. G. Rego de Carvalho*

Um poeta sofrido

 

Rompo um silêncio deliberado – o de não escrever sobre livros alheios, por ser criador e não intelectual (termo ambíguo) – para dizer duas palavras de apreço a um Poeta de grande envergadura, sensível como poucos, o nosso muito caro Francisco Miguel de Moura, deste “PEDRA EM SOBRESSALTO”, lançamento da Pongetti, editora, Rio, 1974.

Confesso que o primeiro livro de poemas de sua autoria – “AREIAS” – não me agradou. Senti-o incipiente, entre romântico e moderno. Isso, contudo, não desmerece a obra; é característica de estreantes. O que me desagradou foram os acrósticos e o recurso a paródias, cousas de poeta de segunda linha.

Já em “AREIAS” vi suas potencialidades para a literatura, potencialidades reconhecidas também por Pessoa de Morais e que se revelariam maduramente no livro de ensaios que dedicou à minha obra, o seu belo, penetrante, arguto e sofrido “LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO”.

Nunca tive oportunidade de escrever sobre essse livro de estudos “ogerregueanos” (o neologismo é dele). Nem mesmo uma carta de agradecimento. É que houve aqui quem maldasse, por inveja talvez, sei lá, meu Deus, o que se esconde na alma das pessoas? E eu preferi silenciar – o silêncio com dignidade de que falam os latinos.

Os tempos são outros. Aqui está a confirmação do talento de Francisco Miguel de Moura. Duvidam? Leiam o poema “Pranto” à página 30, tomado a esmo, como poderia citar outros muitos. Poeta de corpo inteiro, senhor e não servo das palavras, conhecedor profundo e sofrido de nosso interior, mais telúrico do que Fontes Ibiapina na sua prosa, piauiense no assunto e universal na transfiguração do tema, Francisco Miguel de Moura cresceu na minha admiração e hoje o posso citar como um dos três maiores poetas do Piauí, ao lado de Da Costa e Silva e H. Dobal.

Aliás, somente um poeta (e não apenas crítico), com sua sensibilidade aberta às mínimas vibrações da vida, está em condições de penetrar no mundo de sortilégios, espanto e símbolos de meus livros, notadamente o famoso “RIO SUBTERRÂNEO” – um livro assim rio e árvore; rio subterrâneo que as almas submerge; árvore que, frondosa, resiste ao aceno do machado, conforme escrevi em dedicatória a Assis Brasil.

Pois Francisco Miguel de Moura saiu-se bem. Poderia ter dito mais. “PEDRA EM SOBRESSALTO” mostra quão sensível é para tal empresa. Porém o que disse bastou para a compreensão de minha obra, pelo menos para o leitor médio e para os estudiosos de literatura a que se destina “LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO”.

Muitos me têm elogiado. Ele foi comedido nos elogios. Comedimento, franqueza, honestidade que sinto de novo nesta páginas de afirmação como artista da palavra, mais que simples escritor – Artista.

(Artigo publicado no jornal “O DIA”, Teresina, 10.3.74)

 


*Rego de Carvalho é o maior estilista da língua portuguesa, depois de Eça de Queiroz, e autor de “Rio Subterrâneo” e “Somos Todos Inocentes”.