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Francisco Miguel de Moura


 

Fortuna crítica: Luiz Romero Lima

Intimidades do poeta*

 

Apresento, nesta data, ao publico leitor de qualquer lugar, o livro Viragens de Francisco Miguel de Moura, poeta pela graça da palavra, natural de Francisco Santos – PI, cidade que sempre terá boas notícias do seu filho ilustre.

Francisco Miguel de Moura é, antes de tudo, um exigente leitor de bons e grandes poetas do passado e do presente. Sua poesia reflete o sopro da vida sem os clichês habituais. É um poeta cuidadoso, eficiente, perfeccionista em permanente busca de soluções aperfeiçoadoras e minuciosos gestos poéticos.

Servimo-nos da bela lição de Drummond: “Penetra surdamente no reino das palavras. / Lá estão os poemas que esperam ser escritos.” Francisco Miguel de Moura aprendeu bem esta lição e cuidadosamente produziu seu melhor livro de poesias e o destes últimos anos entre nós.

A sua linguagem exige do leitor posições sutis de acompanhamento do texto, porque difere no timbre e na tessitura, atrai pela evidente preocupação com o discurso poético. A linguagem de Viragens é um delicado instrumento do desejo e força produtiva de sentidos outros. O significante gerando outras e novas sugestões lingüísticas porque “a palavra é grafe “ (Silêncio, pág. 35). Assim adverte o poeta. A gravidade da poesia de Viragens é como “uma pérola / um seixo rolado morro abaixo / areia acima... simples feito um esboço de poema-edifício...” (Simplesmente, pág. 70). Nestes e em outros versos e em outros versos é clara a posição do poeta por uma linguagem que supera o desgaste, a saturação, dissensibilidde verbal, comuns aos menos avisados.

O poeta purifica-se pela linguagem na construção do poema-edifício, atingindo o que a poesia oferece de melhor e não contente “deu a palavra que abre uma esperança” (Soneto da purificação, pág. 71).

O poeta chama o leitor para o encontro com a poesia simples, livre dos enleios grosseiros, mergulhando o leitor na melhor tradição lírica da premiada língua de Camões, Saramago, Pessoa, Da Costa e Silva, Mário Faustino, H. Dobal, João Cabral de Mello Neto. O.G. Rego de Carvalho, Herberto Hélder, Mia Couto e tantos outros que a fazem bela e culta. Meu bom poeta, não devemos comparar poetas e dizer que um é maior ou menor, melhor ou pior que outro, pois os parâmetros estéticos são relativos e estão subvertidos pelo tempo.

Desfaz-se o poeta de Viragens no “Itinerário do Poema” (pág. 104) em firme pacto com o elemento estético, numa aliança com o texto que surgirá do labiríntico reino das palavras onde os poemas estão escritos por inquietos escritores da sua qualidade e competência poéticas.

Caríssimo poeta, muito honra a este tão pequeno professor de Literatura deste Piauí apresentar a todos os bons e merecedores leitores, aos estudantes e ao público, mais um bom livro de poesia.

Ilustre acadêmico e premiado poeta, a sua geração encontra no seu verso lapidado um bom exemplo de poesia, magia e encantamento do olhar sobre o signo e prazer estético do texto, no dizer Roland Barthes. Como bem o dizes no poema “Avesso” dedicado ao João Cabral de Mello Neto, de quem seguramente recebeste as mais eficientes lições do Poema-edifício.

Meu caro Chico, é muito fácil perceber um bom poeta: um bom poeta é sempre um obcecado leitor. E lembrando Julia Kristeva, um bom texto é feito com outros bons textos. O poema é como um jogo, uma corrida de bastão, por exemplo, sem limites para o entretenimento com as letras e palavras, como bem você diz em “Acaso” (pág. 40) e “Brincando de letras” (pág. 95).

O poeta é diagonal e não ama em linha reta. Olha de “revestrés” e de “viés” como atesta o poema “Que é de?” (pág. 75) dedicado ao seu companheiro de geração Hardi Filho. O poeta, Chico, é “folha verde em galho seco” (Avesso, pág. 18). Seguramente, esta é a mais surpreendente lição da sua oficina estética na construção deste livro-edifício.

Meu caro, o poeta é feito pelo meio mais consagrador – a linguagem. Isto posto, vale ratificar postulados e princípios estéticos poéticos de que o conteúdo até pode ser insignificante ou até indiferente. O que faz o poeta é sua percepção no “catar feijão”, da escolha do signo, pois o melhor e mais ajustável é a beleza do significante, isto é, do meio, do código, na afirmação consciente e madura de Mário Faustino: “é como um raio a fecundar” a poesia. Vejo em Viragens a poesia fecundada e o poeta consagrado.

Chico, com a ternura de um belo verso que não escrevi, mas que se encontra em cada bom poeta, te desejo omnias felicitas. Sinto-me ternamente grato por este bom momento.

 


* Apresentação do livro “Viragens”, de Francisco Miguel de Moura, no seu lançamento, dia 10-11-2000, em solenidade comandada pela UBE-PI, dentro das comemorações da Semana da Cultura, promoção da FUNDEC/SEC/APL/UBE.