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Aleilton Fonseca




Acordes líricos goianos


 

A poeta goiana Yêda Schmaltz publicou recentemente Chuva de ouro, o seu décimo quarto livro de poemas. Trata-se de uma edição da Universidade Federal de Goiás, que vem desenvolvendo um excelente programa editorial, com coleções de ensaio, ficção e poesia. Poeta atuante, premiada, reconhecida em seu estado, Yêda produz uma poesia de forte expressão lírica, moderna, numa linguagem ágil, dinâmica, rica em imagens. A autora às vezes tangencia temas e sentidos da mitologia clássica, outra hora incorpora elementos da cultura goiana, sempre em busca de imagens e efeitos líricos que surpreendem pela simplicidade com que traduzem significados profundos.

Yêda já vem sendo tema de estudos em alguns cursos de pós-graduação brasileiros. Na Itália, em 1998, foi defendido um trabalho intitulado Yêda Schmaltz: viaggio tra il mito clasico e l’ universo femmininile, de Gian Luigi de Rosa. Presente em várias antologias goianas, estudada por Nelly Novais Coelho no ensaio A literatura feminina no Brasil contemporâneo (São Paulo: Siciliano, 1996) a autora goiana faz por merecer um reconhecimento mais amplo. Aliás, precisamos urgentemente conhecer melhor a poesia brasileira de forma mais ampla e democrática. Não parece justo que apenas seja reconhecida a poesia produzida ou editada no sudeste do País, como geralmente acontece.

O mapa lírico que Assis Brasil começou a traçar nas antologias estaduais tem o mérito de ampliar o universo de autores e obras, através do registro de nomes e amostragem de poemas. Yêda está incluída no volume A poesia goiana no século XX, (Rio: Imago, 1997), onde é destacada como “a maior expressão da poesia feminina no Estado de Goiás”. Ali também encontram-se informações sobre a sua atuação intelectual, inclusive como professora da UFG. Na década de 60, a poeta participou do Grupo de Escritores Novos (GEN) “que procurava impor à poesia de Goiás um novo aspecto de liberdade estética e conteúdo social, já dentro da perspectiva evolutiva do próprio Modernismo nacional” (p. 181). Ao longo da carreira, construiu uma obra vasta, múltipla, rica em temas e motivos, de reconhecida importância na cultura goiana.

Chuva de ouro foi selecionado mediante edital público para edição pela UFG. Trata-se de um livro de poemas curtos, em que Yêda trabalha as palavras em liberdade, com ritmo solto, versos brancos, tratando temas do cotidiano, em reflexões pessoais sobre a existência, o dia-a-dia, e também sobre a poesia e o ato de escrever poemas. Aliás, o segundo poema do livro é emblemático de sua noção de poesia:

Ser poeta
Ter sol, malícia,
solenidade e insolência.
Calo no dedo médio
são os ossos que me embrulham
neste ofício intenso que me esbulha.
Carregar um nome comigo,
esta letra vazia, carregar
esta palavra tão pesada,
que te ilustra
como a última palavra
não escrita
Ter fúria
e o avesso desnudado,
anotando somente o necessário
e a muito custo mesmo
re/velá-lo.

 

A poesia de Yêda Schmaltz tem uma marca muito pessoal. A autora goiana afirma-se pela excelente performance estética que consegue imprimir nos seus versos. Dona de poemas expressivos, ela sabe adequar a forma do poema à expressão moderna. Exibe uma linguagem segura, consistente, domina bem os temas, usa as palavras certas para exprimir sua percepção lírica. Os poemas mostram sua sensibilidade aguçada para externar o lirismo amoroso, sem confessionalismo, com altivez, em estilo leve, simples, plástico. Consciente de sua irresistível vocação, a poeta entrega-se ao exercício de descobrir tesouros ao penetrar no reino das palavras, como exprime no poema-título:

Chuva de ouro

Então, aqui estou: herdeira.
O meu poeta
me legou tesouros,
Estes que nasceram
das minhas mãos
vazias - versos, linhas
de pétalas de ouros.
 

Apesar dos modelos oficiais excludentes, é preciso incluir a obra da poeta goiana no panorama nacional como uma contribuição relevante. Sua proposta é contemporânea, resultado maduro da assimilação das estéticas modernas, adotadas com senso de medida e apreço à tradição. Sem dúvida, sua obra constitui uma das vertentes que representam a atual voz feminina da poesia brasileira.


Aleilton Fonseca é escritor, co-editor de Iararana, professor titular da UEFS, e autor de O desterro dos mortos (contos), publicado pela Relume Dumará.
 



Yêda Schmaltz
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