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Anderson Braga Horta




Testemunho de vida e poesia




 

“Legado Poético”, o texto com que apresento Caminho de Estrelas, de Maria Braga Horta, poderia servir de abertura também ao livro de Anderson de Araújo Horta. A trajetória de Anderson e a de Maria, a partir do início de 1933, fundem-se numa. A poesia de um é, de algum modo, contraponto da poesia do outro. Configuram poéticas —e temperamentos— diferentes, é certo, mas complementares. Não sei se forço a realidade, ao dizê-lo, por ter em mente um homem diante de uma mulher, esposo e esposa, meu Pai e minha Mãe. Mas acho que não. Anderson é romantismo, é liberdade, é às vezes arrojo, ocasionalmente com uma pitada de irreverência — qualidades masculinas, consoante as vejo. Maria é mais força centrípeta, é mais apego a uma forma e, assim, mais prudência — e eu diria que tais características são antes femininas. Daí a simpatia, o diálogo, a atração, o convívio, a união, sem que se subsuma um no outro.

Assim, repito, cortando algumas transcrições e os comentários restritos aos poemas, adaptando uma que outra passagem, teríamos o legado poético (e vital) de Anderson de Araújo Horta. Opto, entretanto, por não o fazer. Afinal, o destino desta edição é o mesmo do livro de Maria, com o qual formará como que uma só obra em duas (veja-se o poema “Se Nós Dois...”): a família, os amigos, escritores de nossa estima...

A apresentação do Poeta é feita por ele mesmo, em texto de 1967. Completo-a com uma cronologia, para a qual, além de dados ali colhidos, me valho de anotações minhas e, principalmente, da “Autobiobibliografia” de Maria Braga Horta. (Já que cito esse texto, recordo aqui a passagem em que a Autora expressa antipatia pela palavra “poetisa”. Mais de um leitor o interpretou como adesão ao vezo “moderno” de aplicar às mulheres que escrevem poesia o nome de poeta, no que formalmente os confirma a entrevista a Danilo Gomes, repetida no fim deste volume. Contudo, se bem me lembro, também não lhe agradava este vocábulo.)

O volume dos versos deixados por Anderson é maior que o dos de sua esposa. São eles, porém, de qualidade mais desigual, o que me impôs a difícil e penosa tarefa de cortar, a bem de uma certa homogeneidade. Eliminei composições do namoro e noivado, poemas dedicados à família, os versos de motivação cívica e outras peças (quase todas da última fase) em que o circunstancial me pareceu menos capaz de despertar o interesse do leitor desvinculado.

Na seriação das seções adotei o critério cronológico inverso. O título geral, tirei-o da mais recente. São de minha responsabilidade os títulos secionais. Em cada conjunto obedeci à seqüência normal, de acordo com a data lançada pelo Autor ou presumível da ordem dos poemas mais antigos nos cadernos manuscritos por ele deixados. A seção que fecha o livro, todavia, preferi iniciá-la com alguns dos sonetos de minha predileção, dentre os pertinentes.

A produção do Poeta se distribui por fases de intensa atividade, separadas por longos períodos de silêncio. Dentre os metros da tradição, o decassílabo é o de sua preferência. Alternou, desde cedo, o verso medido com o verso livre.

Anderson foi sempre advogado e professor. Era homem de inteligência vívida e muita leitura, com pendor para a oratória e bom conversador. Bem-humorado, brincalhão, relacionava-se bem com o gênero humano e revelava simpatia (correspondida) pelos animais. Durante uma vida de atribuladas peregrinações, deu sempre exemplo de trabalho, serenidade, alegria de viver, devoção às coisas do espírito antes que às materiais. Foi bom pai e bom amigo — dou o meu testemunho.

O que disse de minha Mãe, na introdução de seu Caminho de Estrelas, digo-o agora de meu Pai, com a mesma comovida unção: seu testemunho poético, seu testemunho espiritual, é legado intangível, mas precioso, que permanece vibrando na memória dos filhos.

Laus Deo.


Brasília, 19 de janeiro de 2002.
 




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