Antônio Carlos Secchin
Contra os subprodutos
08.12.96
Talvez já seja tempo de dissolver as polarizações que
envolvem a poesia concreta, e que acabam por transformar a maioria
dos críticos em apologistas ferrenhos ou algozes implacáveis do
movimento. Se é fato que os concretos, até por estratégia,
convocaram a polêmica, hoje ela soa inócua e anacrônica.
É óbvio que nenhuma adesão a um estilo garante a
priori a eficácia de um texto. Tão equivocado quanto afirmar que o
movimento é a negação tecnocrática da poesia é supor que a
modernidade habita apenas no concretismo.
A partir de determinado momento, passou a vigorar uma
espécie de burocratização da vanguarda, com seus decálogos e
prescrições - tudo, enfim, que remete à vocação autoritária dos que
se julgam a culminância da poesia universal, com a subseqüente
suposição de que não existe vida inteligente além (ou aquém) dos
seguidores ou simpatizantes da seita.
Por outro lado, há que se destacar a qualidade da
poesia de Augusto de Campos, a excelência muitas vezes atingida por
Décio Pignatari e Haroldo de Campos nas artes e ofícios da tradução,
o desejo renovador na leitura canônica da poesia brasileira, mesmo
ao preço de se misturarem ulhos com bagulhos (vide a
hipervalorização de Sousândrade e a certeira redescoberta de Pedro
Kilkerry). Desagrada-me a profusão dos miniDécios, microHaroldos e
subAugustos que o movimento produziu (e fomentou) à exaustão.
Agradam-me os que, embora formados à beira da base concreta,
conseguem homenageá-la através de uma poesia que - cada vez mais -
cada vez menos lhe é devedora. Carlito Azevedo, por exemplo.
ANTONIO CARLOS SECCHIN é autor de "Poesia e desordem"
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