Benedicto Ferri de Barros
A
Poesia de Soares Feitosa
O que autentica o poema verdadeiro, a
linguagem, o estado poético, é que ele não pode ser parafraseado.
Isto porque quando algo é verdadeiramente poético, é tão
caleidoscópico em seu significado, que 1.001 versões possíveis em
prosa deixam, ainda assim, de captar tudo o que ele pode exprimir.
Ainda que a linguagem apropriada da poesia seja o verso, e seu
produto excelso o poema, o sentido poético permeia tudo, inclusive a
boa prosa. Foi o que fui sentindo ao acompanhar a leitura de Os
Poemas da Besta.
Também aí existe um efeito
caleidoscópico que deve-se reproduzir de forma diversa em cada
leitor, e a paráfrase do que você tenha dito nunca será idêntica nem
se esgotará o que ali se pode ler.
Lembrou-me por outro, seu trabalho, o
tipo de leitura de poesia que vi num belo livro de 1976, Professing
Poetry, de John Wain, que foi há vinte anos Professor de Poesia em
Oxford. Ali ele fazia a "crítica" do poema mostrando como havia
entendido o seu significado, normalmente oculto para o leitor pouco
familiarizado com os secretos encantos dos poemas. Mas a diferença
da sua leitura está em que ela é uma leitura legitimamente poética,
sendo a dele eminentemente acadêmica.
Agora, veja só: aí está que sua prosa
contém uma carga poética muito superior a que se encontra em
pretensos poemas, que, se escritos em forma de prosa corrente não
mostrariam diferença alguma por serem apresentados em linhas
quebradas, que fingem ser versos. Dizia eu a uma amiga,
recentemente, que isto é a melhor maneira de se apurar se um poema é
mesmo de poesia ou simplesmente má prosa, pois embora tudo o que
apareça em linhas quebradas possa passar por poesia escrita em
versos, a prosa nua é uma das coisas mais raras que existe. Que se
dirá da boa poesia?
Percebo que por baixo da primeira
leitura que fiz do seu trabalho ainda restam muitas camadas
subterrâneas e estratosféricas a serem exploradas, mas..., Feitosa:
a grande tragédia do homem contemporâneo é que ele perdeu o comando
de seu tempo, isto é, perdeu sua própria vida. E nada pode ser mais
trágico do que um vivo morto.
A sua dedicatória é algo elíptica,
insinua um convite que não foi formulado. Deve ser coisa da sutileza
baiana... Esteja certo de que foi algo provocante esse ar que me
veio da Bahia.

Os Poemas da
Besta, texto que suscitou este comentário
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