Luís Vaz de Camões
Se espero, sei que me engano
MOTE
Se espero, sei que me engano,
mas não sei desesperar.
GLOSA
O meu pensamento altivo
me tem posto em tal extremo
que, quando esperando vivo,
o bem esperado temo
muito mais que o mal esquivo.
Que, para crescer meu dano
no gosto da confiança,
ordena o amor tirano
que, na mais firme esperança
se espero, sei que me engano.
Deste novo sentimento
chega a tanto a nova dor,
que se enleia o pensamento
ver que, no mor bem de amor,
se descobre o mor tormento.
Folgara de me enganar;
mas não é cousa possível
pois, para sempre penar,
sei que espero o impossível,
mas não sei desesperar.
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