César Leal
Uma
imaginação informática
Quem não acredita que o Computador
pode estimular um espírito criativo a escrever boa poesia,
naturalmente estará enganado. É isso que nos demonstra Soares
Feitosa, cearense, radicado no Recife, com excelente formação em
línguas clássicas, nascido em 1944, na região dos Inhamuns (Ceará),
a mesma onde nasci e também nasceu um dos maiores poetas brasileiros
de todos os tempos: Gerardo Mello Mourão.
Soares Feitosa não conhecia os
poetas da atualidade, até setembro do ano passado, quando escreveu
seu primeiro trabalho poético, SIARAH. Lera, até então,
apenas Gerardo Mello Mourão, recentemente eleito pela Guilda Órfica
(Sociedade Internacional de Poetas) como o maior do século em todo o
mundo.
O primeiro poema do livro de
Soares Feitosa, é justamente uma homenagem ao Poeta dos Peãs, sobre
quem Ezra Pound afirmou, certa vez, haver escrito a epopéia que ele
(Pound) intentara sem conseguir atingir a força do cearense de
Ipueiras, agora premiado. O mesmo diria, depois, Carlos Drummond de
Andrade.
Utilizando os recursos oferecidos
pela informática, Soares Feitosa, que nunca se preocupara com as
possibilidades da poesia visual, criou um dos mais belos e
atualíssimos poema gráficos como este fragmento de uma de suas
largas composições - FORMAT CÊ DOIS PONTOS - que pela
singularidade da escrita no computador torna sua transcrição
completa quase impossível nas páginas dos jornais:
Carrilhão, carrilhão, carrossel do
Apocalipse:
d d d
e e e
l l l
delenda, del
e nda, delenda
n n n
d d d
a a a
|
Observem a estrutura da palavra
“delenda” cujas letras são repetidas por três vezes até os “lll”;
nessa altura a palavra delenda também é repetida por três vezes,
ficando a do meio partida, de modo que o e, do verso horizontal,
diferenciado e maior, representa a explosão de toda a energia; ao
mesmo tempo esse mesmo e faz a ligação com o feixe de delendas em
sentido oblíquo e vertical.
Os três “lll”, repetidos na parte
superior, dão-nos como que uma representação da luz em sua
velocidade de 300.000 Km/s !
Na parte inferior, onde se repetem
também por três vezes os “nnn”, temos a representação gráfica do
NADA em sua origem latina, nihil, com o mesmo “n” inicial em
quase todas as línguas ocidentais.
Essa representação gráfica dá-nos
uma idéia de uma explosão fantástica, que se confirma, mais adiante,
com os versos:
mega, mega, mega,
trom, trom, catapum,
mega, mega, megaton
!
Delete Hiroshima !!!!!!!
Leo Szilard,
sessenta assinaturas:
Exmo. Sr. Presidente,
admita por um segundo
a possibilidade de estar errado,
um instantinho, não detonem !
por favor, um segundo,
admita a possibi................
a possi........................
a pos..................
— Catapum !
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Os sete pontos de exclamação logo
após a palavra Hiroshima representam os 7 dias da Criação do Mundo.
É a brutalidade da força atômica significando o fim do Universo
criado !
Como se vê, não se trata de simples concretismo, pois os recursos
gráficos são portadores de uma vigorosa carga simbólica. Não se
trata de um grafismo descomprometido com a verdadeira obra de arte,
mas de algo que representa um enriquecimento expressivo, de um
portador da verdadeira imaginação informática, hoje uma das
disciplinas ensinadas em várias universidades do mundo, inclusive na
Universidade de Paris.
Soares Feitosa é um dos que
possuem essa imaginação informática.
Guardem na memória (a memória da
mídia é muito fraca) o nome desse poeta. Muitos críticos competentes
irão lembrar seu nome no próximo século. Alguns dizem que hoje não
se escreve mais poesia no Recife. Esse modo de ver representa a
negação de legítimos valores como Mário Hélio, Weidson Barros Leal,
poetas que ainda não chegaram aos trinta anos, e ambos com largos
espaços assegurados, sem concessões provincianas, no panorama da
poesia brasileira de nossos dias.
Leia
Soares Feitosa
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