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Erorci Santana



Redentoras


Sejam as mulheres como as rosas
ou como as aquarelas,
quando estão conosco, quando não,
quando vibram, quando alegram,
quando doem, quando vêm e quando vão,
quando sobem as ladeiras,
quando descem passarelas.

Tragam com elas os incorruptíveis
sinais da beleza, ainda que se saiba
impossível sua erupção
fora da alma feminina, do corpo da mulher,
esse vulcão que trabalha nosso desatino,
faz a nossa inelutável rendição.

Ainda que se pense em mar, em céu,
no incrível arco multicor, no ar
que impregna a flora e balança
os frutos verdes após a chuva.

E até no rodopio do ciclone,
que louva Deus bailando
sua aterradora e tresloucada dança,
nas noites austrais, nas auroras boreais,
numa explosão de luzes no setentrião.

Nada disso ou tudo isso sequer
supera uma lembrança de mulher.

Fora de seu riso e de seu colo,
não há razão de ser, nem como florescer
a magia, a poesia, o êxtase, a canção.

Chame-se então deslumbramento
a essa compulsória devoção.
E nesse diapasão lírico,
celebro as que se foram,
cuja ausência confrange o coração,
as que esperam e acenam da janela, aquelas
que virão mitigar a dor de existir,
reinventar a fúria sagrada do amor.

As que passam majestáticas
e a gente acompanha com o olhar refém.
Aquelas que apesar de entusiasmo e de desvelo
só nos dão o seu desdém.

As que não são vilãs, nem heroínas,
nem escravas, nem rainhas, nem fundamentais;
algo mais que a sina feminina
ou a maioridade que a elas se negou.
Não se diga “é bela esta mulher”
porém bonita sua própria condição.

Surpreendam sempre como o plenilúnio,
o arco-íris, o solstício de verão,
Não falte nesse comovido poema
uma voz aveludada, uma mecha de cabelo,
os opulentos seios das hollywoodianas,
as pernas de garça das nordestinas,
a imensa tristeza das chinesas de pés pequenos.

Dê-se às mulheres o leme do mundo, deixem-nas
recuperar o sentido perdido da ternura,
apontar um outro rumo, à margem
da brutalidade, da carnificina masculina,
uma trégua para repensar se vale a pena
parir e amamentar mísseis e canhões.

Dê-se a elas o sonho do homem e grande
e do menino; dê-se às mulheres-mães o direito
de intervir no conselho de guerra das nações,
o direito de escolha além da irracionalidade viril
e da imbecil mutilação dos homens tolos.

Que além de toda dor e corrupção
cinja-se o corpo da mulher
ao corpo do poema, e de ambos
não se aparte a beleza suprema.

Vão é vosso esmero, estilistas da confecção!
Esse corpo de mulher, divino e magistral,
só precisa de raio solar, folha de parreira.

Mas dê-se a elas bons frascos de perfume,
batons variegados, provocantes lingeries,
vestidos de organdi.
Dê-se a elas inclusive a ilusão
de que precisam de séquito, vestais,
de algo mais que a generosidade
de suas curvas, que a seda de suas peles.

Deixem-nas pensar que podem superar
a grandeza de sua própria criação.

Sejam bem amadas as amantes,
orquestrados com cuidado seus suspiros
inebriados, os frágeis cristais e os apelos
de sua carne insaciada.

Sejam os rompantes das mal amadas
amparados com carícias em dosséis
e o fogo que elas trazem represado
arda nos flancos, ao galope dos corcéis.

Sejam como as rosas abertas,
cintilantes, despudoradas, acesas
ou como aquelas fechadas,
grávidas de promessas e belezas.

Sejam gráceis, redentoras.
Sejam salvação.


 

 

 

 

 

 

08/04/2005