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João Apolinário


 

O poeta e jornalista português
João Apolinário

 

Maria Luiza Teixeira Vasconcelos Teixeira Pinto
 

João Apolinário Teixeira Pinto nasceu a 18 de Janeiro de 1924, em Belas, Sintra. Viveu parte da infância no Vale da Pomba, propriedade familiar situada em Lebução, Chaves. Na aldeia fez os primeiros anos do curso primário. A montanha, a paisagem agreste, o silêncio, os animais e os frutos, as aves e as pedras foram as primeiras evidências do mundo que pensou ser o seu: profundo, autêntico, natural, com tempo “para ver mudar a cor das flores” Deslocar-se a Chaves para estudar foi o primeiro rompimento com o que não conseguiu realizar plenamente. Seguiu-se-lhe Lisboa, onde frequentou o Colégio Valsassina e o Liceu Camões. Surgiu a poesia, que o acompanhou sempre. Cursou Direito nas Universidades de Coimbra e Lisboa.

Aos 21 anos, tendo optado por não advogar, poeta assíduo da Brasileira do Chiado e jornalista, foi para a França como correspondente da Agência Logos, de Madrid. Viver os terríveis últimos tempos da Segunda Guerra Mundial marcou-o definitiva e cruamente. Depois de alguns anos em Paris - frequentou Artes Gráficas na Sorbonne, conheceu Sartre, Simone de Beauvoir, os intelectuais do Café de Flore, Antonin Artaud, Jean Genet, Marcel Marceau, Edith Piaf, viu o teatro de Rua de Henri Gheon -, voltou a Portugal. Sequelas de um acidente ocorrido nos únicos quatro meses de prestação do serviço militar no Batalhão de Artilharia Um, de Lisboa, levaram-no a mudar radicalmente os planos, após meses de um tratamento severo em Genebra.

Acabou a recuperação na casa da mãe, D. Helena Teixeira Pinto, a quem muito amou, pessoa de importância transcendental em toda a sua vida. Iniciou a carreira de jurista. Casou-se pela primeira vez, teve dois filhos. Integrou grupos de intelectuais, poetas e jornalistas. Foi co-fundador do Teatro Experimental do Porto e com este o génio e a modernidade de Marcel Marceau e de Jean Genet chegaram ao país.O dramaturgo Bernardo Santareno foi encenado pela primeira vez.

A prática cultural, nunca partidária, de João Apolinário, na poesia, no teatro, no jornalismo, especialmente na crítica e na reportagem; a acutilância de suas ideias antifascistas e não colonialistas, mais acções de real proteção a quem delas necessitasse, resultaram em prisões, torturas e, pior, tempos dolorosos de afastamento dos filhos, João Ricardo e Maria Gabriela.

Publicou Morse de Sangue, livro memorizado numa cela subterrânea de Peniche, durante cinco dias e cinco noites; O Guardador de Automóveis, Primavera de Estrelas e A Arte de Dizer.

Foi secretário, na delegação do Porto, da Associação Portuguesa de Escritores, durante a presidência de Aquilino Ribeiro. Recebeu companhias teatrais brasileiras, como a de Cacilda Becker, atriz maior em língua portuguesa. Como resultado disso, em 1963, começou a viver o exílio imposto pela polícia política do regime. Partiu para São Paulo em Dezembro daquele ano.

Durante três meses, de Janeiro a Abril, na redação do jornal Última Hora, de São Paulo, usufruiu, pela primeira vez, do privilégio da liberdade de expressão e de uma vida diária sem pressões político-policiais. Em Abril de 1964 teve início um período longo de ditadura militar no Brasil. O poeta, jornalista em tempo integral agora, voltou a escrever nas entrelinhas. Para não ter seu pensamento alterado por um qualquer diretor de jornal, mesmo que amigo, suas críticas de teatro, na Última Hora e no jornal O Globo, de São Paulo, não foram pagas. Ele assim o decidiu e fez.

Assimilou a cultura brasileira. E por ela deixou-se assimilar. Tanto que sofreu ameaças de morte do CCC: Comando de Caça aos Comunistas. Era nacionalista num país em que foi crime, desde sempre, se-lo. Em São Paulo ainda foi editor de artes e chefe de redação de dois jornais, num período de doze anos. Casou-se pela segunda vez. Viajou pelo país e pela América Latina: Uruguai, Argentina, Colômbia. Conviveu com intelectuais e artistas num forte novo mundo. Teve amigos chilenos, intelectuais atuantes, mortos pelo regime de Pinochet.

Fundou, com outros jornalistas, a APCA – Associação Paulista de Críticos de Arte. É uma referência incontornável na crítica teatral brasileira por ter o espetáculo como sujeito. Ensaiou uma idéia nova de teatro e não teve tempo de experimentá-la. Continuou a escrever poesia: muito do que está contido no Poeta Descalço.

Viveu, no dia 25 de Abril de 1974, a enorme alegria, por um tempo breve, sim, mas pode vivê-la, de ver Portugal livre do fascismo. Em Setembro visitou o país. E numa semana de Dezembro escreveu Apátridas, poema exultante e exaltante de sua obra, Integrada em diversas edições da História da Literatura Portuguesa.

Em Abril de 1975 voltou a Portugal. Por razões várias, inesperadas, não deixou de ser jurista, como pretendia. Dividiu-se novamente. No entanto, seu trabalho poético cresceu e publicou AmorfazerAmor, Poemas Cívicos, O Poeta Descalço e Eco Húmus Homem Lógico. De 1980 a 1988 escreveu Sonetos Populares Incompletos, ainda inédito. Viajou pela Europa. Visitou a União Soviética.

Ser poeta, não poeta bissexto, como dizia, não chegou a se-lo. A morte surpreendeu-o a 22 de Outubro de 1988, justamente quando havia reencontrado, na vila de Marvão, o silêncio e o tempo “para ver mudar a cor das flores”.

 

 

 

 

 

17.11.2006