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Pedro Rocha


 

Literatura
 

O Povo, Fortaleza, Ceará, Brasil

20.10.2006

 

Dimas, poeta
 

O poeta Dimas Macedo lança hoje, às 19 horas, no Centro Cultural Oboé, o livro Sintaxe do Desejo, uma reunião de seus escritos poéticos entre 1978 e 2003

Pedro Rocha
Especial para O POVO

 

Foram 50 anos interados em setembro último. Serão 30 de poesia comemorados hoje. De forma apropriada: lançando um livro: Sintaxe do Desejo, com noite de autógrafos no Centro Cultural Oboé que promete ser concorrida. Dimas Macedo é poeta por querer existencial, profissional do Direito por essas necessidades de comprar as coisas para manter a vida. Sua e de seus filhos.

Cearense nascido em Lavras da Mangabeira, ingresso na Academia Cearense de Letras aos 32 anos, se tornando o mais jovem escritor a entrar para o grupo de acadêmicos, Dimas Macedo tem prolífica produção, seja no campo da poesia, da crítica literária ou mesmo de ensaios no campo jurídico. Dos poemas, juntou alguns, entre 1978 e 2003, e compôs Sintaxe do Desejo, fazendo um balanço de seus escritos poéticos publicados em livros como A distância de todas as coisas, Lavoura Úmida, Estrela de Pedra e Liturgia do Caos.

Em entrevista à reportagem de O POVO, Dimas reflete sobre o mundo e o ser que cabe na palma de um poema pra ele. Afeito à universalidade, à eternidade, traça um papel - e palavras - para a poesia, tocha a iluminar caminhos, na história e no mundo contemporâneo da informática e da internet.

O POVO - A poesia ainda é a linha de frente da vanguarda?
Dimas Macedo - Acredito nisso. Eu acho que o grande sentido da existência é a criação a partir da literatura e a grande realização da literatura se expressa no poema. Tanto no ponto de vista da poesia, quanto o poema como expressão social maior, quando ele se expressa através do romance como no caso de Grande Sertão: Veredas. A literatura existe para substituir a vida, porque a vida por si mesmo não se justifica. A arte justifica a vida, porque a vida precisa ser reinventada e ela é reinventada fundamentalmente pela palavra. A palavra cria, a palavra transforma, a palavra liberta.


OP - Qual seria essa vanguarda?
Dimas Macedo - A expressão vanguarda em si mesmo quer indicar linha de frente, levar a sociedade adiante. A vida é fundamentalmente movimento, não existe sentido pra vida se você paralisa. A vida tem que ser recriada, transformada, porque quando ela não aponta um caminho para o futuro, pode estagnar e levar à derrota total. Então a palavra sempre se transforma. Tanto que a literatura em cada momento da história sempre tem um sentido diferente, ela reinterpreta a vida, como as artes fazem, mas a literatura faz de uma forma muito mais duradoura e resistente. Hoje, a literatura está submetida ao domínio das artes visuais, mas ela não perdeu o sentido. Quando surgiu a linguagem muito popular da internet alguns apressados disseram que o livro e a literatura iam ser substituídos pelas artes visuais, mas isso não ficou provado, ficou provado justamente o contrário. O Brasil nunca produziu e vendeu tanto livro na era da informática.

OP - Você se dá muito bem com os dois meios.
Dimas Macedo - Vivemos numa era que é indiscutivelmente da comunicação. É um apelo muito forte. Eu sou um escritor muito bem informado do que acontece no plano da literatura na internet. Eu escrevo semanalmente um texto que envio para cerca de 600 leitores e passo a semana dialogando com eles. Alguns desses textos estão no livro A letra e o Discurso. Eu me comunico muito por essa via, porque cada era tem uma instância de comunicação. Hoje a instância é a internet, quem estiver fora dela, tá fora da literatura e um pouquinho fora da vida.

OP - De onde surge essa necessidade de escrever? Se é que dá pra explicar...
Dimas Macedo -A literatura, como toda e qualquer arte que se preze, tem muito mistério. Eu acho que na literatura existe muita revelação. Claro que um grande escritor ou um grande artista é produto de uma conjugação de coisas, ele é produto desse mistério, dessa transcendência que ninguém nunca vai explicar, é produto da dedicação e eu me dedico a pesquisa, é produto da interação fundamentalmente com o futuro e o passado. Eu acho que os grande escritores sempre reescrevem seus anteriores. Porque o que se permanece na literatura é a forma. O conteúdo é permanente, os grande dilemas da condição humana são eternos. Como você ilumina essas questões é a forma. A lenda do fausto do homem que vende a alma ao diabo já foi bastante explorada na Idade Média, dizem que teve mais de 200 versões antes da versão do Goethe, mas o que ficou pra humanidade ler foi a do Goethe. Então a forma tem um predomínio e tá conectava com o sistema social, produtivo e político da sociedade. A arte é a costura de tudo isso.

OP - Usando mais uma frase sua: poesia é a trincheira da arte?
Dimas Macedo -O que a poesia não pode ser um elemento partidário, ideológico. A arte não se presta a isso. A poesia é um expressão do sentimento e de uma tragédia social, política e econômica. O poeta é indiscutivelmente o ser que tem a alma mais abrangente. As grandes referências da história humana vieram pelos poetas. Vieram por Homero, vieram por Dante, por Goethe, vieram por Camões, que são os sentidos da própria língua, cada um na sua pátria. Como é o sentido de Machado de Assis. Então a poesia é um instrumento de refinamento, ela é a síntese, ela é a instância que carrega a tocha de uma sociedade. A poesia será sempre uma partitura. A poesia não é como muitas pessoas pensam, não é um esquadrinhar, não é um juntar palavras, ela é juntar palavras, sentidos e ritmos que são da linguagem. As pessoas tem uma idéia muito deturpada da poesia, dizem que poesia é transmitir uma dor pessoal. O poeta que se preze transmite sentimentos da coletividade, ele é a síntese.

OP - Escrever poesia é para poucos?
Dimas Macedo - Escrever poesia é pra poucos, pra pouquíssimos. Eu acho que só as pessoas que estão iniciadas e que tem a vocação na alma para a eternidade, porque você não escolhe a poesia, isso não é um privilegio, é um sentido. Geralmente muitas pessoas escrevem na juventude a dor de cotovelo, o sentimento exacerbado. Agora se você acha que existencialmente não pode se livrar da poesia, porque você vai morrer, você pode se considerar um poeta. Um poeta não está submetido às leis do sistema de produção de uma sociedade. Veja você que Manoel Bandeira, aos 54 anos, pagou do seu bolso uma edição dos seus poemas.


SERVIÇO
Sintaxe do Desejo - lançamento do livro do poeta cearense Dimas Macedo. Hoje no Centro Cultural Oboé (Rua Maria Tomásia, 531 - Aldeota), às 19h. Informações: 3264.7038
 

 

Dimas Macedo

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26.10.2006