Hélio Pólvora
Navio Negreiro
O poema Navio
Negreiro pertence à fase de Os Escravos, que Castro Alves começou a
compor em, ou por volta de 1865, quando ainda no Recife, tocado, sem
dúvida, pela atmosfera libertária que empolgava a mocidade
acadêmica. Mas,embora trazendo a data de 18 de abril de 1868, ele
foi declamado antes, pelo Poeta, no Teatro São José, em São Paulo,
no dia 7 de julho daquele ano, e com extraordinário êxito. E
possível que Castro Alves o tivesse concluído ou revisto para a
ocasião.
Tinhas o Poeta,
então, 21 anos de idade. Apenas 21. Três anos depois, em 1871,
estaria sob o que ele denominara "lájea fria" nos seus
pressentimentos de morte, que eram constantes, persistentes e,
iga-se logo, muito mais sinceros do que fazia crer a morbidez dos
Românticos e, sobretudo, dos Simbolistas.
Passaram-se,
pois, 128 anos sobre o poema famoso. É importante considerar-se um
texto literário em relação ao fluir do tempo. O tempo tem, de todas,
talvez a maior capacitação crítica: imprime à obra a pátina que a
enobrece ou nela deixa o azinhavre que a corrói. No caso de Navio
Negreiro, as estrofes grandiosas, grandiloqüentes, repassadas de
ira, fervendo na justa indignação do Poeta, preservam o que em
crítica literária se chama o espírito do tempo: ambiente, razões
históricas, intenções do autor, correntes literárias. Mas,
transcendendo o espírito do tempo, o poema castroalvino estabelece,
como se verá mais adiante, uma ponte direta com a época atual.
Alguns fizeram a
Castro Alves a ressalva de ter escrito e declamado Navio Negreiro em
plena efervescência republicana, quando já fora extinto o tráfico de
escravos africanos para as lavouras do Brasil. De fato, a Lei
Eusébio de Queirós, que proibiu o odioso comércio, fora promulgada
antes, a 4 de setembro de 1850. Mas nós sabemos bem como são as leis
no Brasil. Dizem que há leis, aqui, que pegam ou se anulam. Nunca
nos faltaram leis, e muitas vezes leis bem intencionadas, mas lhes
falece o instrumento fiscalizador. Afinal, não é a justiça da lei
que lhe dita a eficácia e lhe impõe respeito e acatamento, mas,
exatamente, a sua complementação — ou seja, as providências tomadas
para que se faça cumprir a lei.
No caso da lei
Eusébio de Queirós houve, provavelmente, mais idealismo do que
esforço de aplicação. Tanto assim que, embora declarado extinto o
tráfico, em 1850, foi necessária outra lei — a Nabuco de Araújo, de
5 de junho de 1854, portanto quatro anos após — para impedir que
barcos negreiros continuassem a descarregar nas costas brasileiras.
Se, naqueles quatro anos, o "brigue imundo" a que se refere Castro
Alves não fora varrido dos mares, é de supor-se que ele continuasse
em rota por mais anos, entre África e Brasil. Leis de proibição do
tráfico, emanadas da Bahia, também foram desrespeitadas por algum
tempo.
Todos nós
sabemos que o fim da escravidão negra no Brasil foi obtido por
etapas devido à resistência dos proprietários de latifúndios que
temiam, naturalmente, o esvaziamento repentino da economia. Esses
proprietários tinham assento majoritário nas Assembléias,
confrontavam abertamente o Imperador ou, então, estavam nelas
representados pelos deputados e senadores que eles elegiam. Veja-se
que, entre a Lei Eusébio de Queirós e a Lei Áurea, assinada pela
princesa Isabel em 1888, decorrem 38 anos de acesa campanha
abolicionista. Se a Marinha Britânica, com todo o seu poderio, com o
domínio que tinha dos oceanos, mostrava-se incapaz de conter o
comércio negreiro, o que esperar-se da ação repressora da nossa
Marinha imperial ?
Com certeza o
"veleiro brigue", no dizer do Poeta, continuou a navegar com a sua
carga de homens seqüestrados nos porões. Evaristo de Morais, citado
por Jorge Amado no ABC de Castro Alves, vê os barcos de escravos
ainda em atividade plena no momento em que Castro Alves os fulmina
com a sua ira condoreira. Sim, o Poeta desconhecia pormenores do
comércio que, se utilizados, imprimiriam ao Poema uma verdade por
assim dizer documental. O baiano Édison Carneiro, em posfácio à
edição de Navio Negreiro pela Livraria progresso Editora, de
Salvador, em 1959, enumerou alguns equívocos, entre os quais o da
cena no convés, que Castro Alves pintou com mão pesada, igualando-se
nas vergastadas dos versos aos chicotes dos marinheiros, por
esquecer-se ou ignorar que no convés os negros africanos revivesciam
das crueldades nos porões.
Mas são
pormenores que não comprometem a beleza, a majestade, a fúria do
poema. Navio Negreiro é um poema historicamente atual. Não somos
ingênuos ao ponto de supor que a escravidão do homem pelo homem
esteja extinta. Ela assumiu aspectos novos, não tão ostensivos,
naturalmente, como no passado, porém velados, ou semivelados.
Voltaremos a este ponto daqui a pouco.
De todos os
Estados brasileiros, a Bahia, que até 1870, pelo menos, comandava a
economia brasileira, foi o que recebeu o maior contingente de braços
negros. É natural que, em pleno movimento abolicionista, quando os
republicanos se utilizavam do tema como bandeira de luta, Castro
Alves o assumisse. Já lembramos que a composição de Os Escravos foi
iniciada no Recife, em 1865. Um dos poemas desta série, e que datava
de 1863, falava no "sangue escravo que nodoa o chão". Poucos anos
depois, em São Paulo, o Poeta seria atraído para a batalha entre
monarquistas e republicanos. Surge, no estridor dessa batalha, o
Navio Negreiro. De composição posterior são Vozes d’África. Não
houve repentismo, não houve adesão de última hora, não houve
oportunismo poético da parte de Castro Alves. Houve, isto sim, um
compromisso anterior, amadurecido na sua consciência de Poeta
libertário, de Poeta que, conforme anotou Jamil Almansur Haddad, foi
o pregoeiro não apenas da Liberdade, no singular, mas de todas elas:
a liberdade política, a liberdade social e até mesmo a liberdade
sexual.
Com o subtítulo
de "Tragédia no Mar", o poema Navio Negreiro é produto direto da
escola romântica de conteúdo liberal. É um poema comprometido com
uma idéia em movimento, uma ideia-força que ainda perdura. O teme é
realista na sua pungente atualidade, a forma que o reveste segue,
porém, o modelo romântico calcado no discurso que se dirige mais ao
ouvido, sem aquela densidade e simplicidade de efeitos que marcaria
algumas peças castroalvinas de sua fase derradeira. Poeta cênico
quando seguia o vôo do condor, Castro Alves descortinava cenários,
descrevia horizontes com uma imaginação plástica. Eis porque o
baiano Hildon Rocha observou que, nele, eloqüência e poesia se
misturavam, "prevalecendo a primeira nos momentos de improvisação e
circunstância".
Mas, diremos
nós, há no Navio Negreiro, além da estilística fônica que arrebata,
uma força motriz que transcende os efeitos, às vezes fáceis, da
retórica, os moldes transitórios da semântica, para ficar bailando
sob forma daquela "selvagem, livre poesia" a que se referiu o Poeta
baiano. Eis, portanto, a nossa conclusão: a poética do cantor dos
escravos está presa à palavra, depende do fluxo encantatório da
palavra, e, no entanto, preserva uma essencialidade que a
transfigura, projeta e despoja, fazendo-a valer não somente pela
imagem m si mesma, mas também pelo que a imagística vem a
representar na sua metamorfose artística.
‘Stamos em pleno mar...
O Poeta, claro
está, dirige-se a um auditório. Na sua função de criador e ao mesmo
tempo apresentador da cena, pretende traçá-la, esquematizar o
cenário, como se assomasse ao palco próprio dos acontecimentos que
irá denunciar. O poema começa, pois, descritivo — e a afirmação
inicial, reiterada nas próximas três estrofes, pretende reforçar, na
sua enfatização estilística, uma atmosfera de sugestão poderosa.
...Doudo no espaço
Brinca o luar — dourada borboleta;
Esta comparação,
primeira metáfora do poema, é perfeita. Parece até que o Poeta
pretende renunciar ao descritivo a fim de realizar o poema
mergulhado no seu cerne, de dentro para fora, a partir de suas vezes
intrínsecas. O luar seria "uma dourada borboleta" porque visto, como
se a esvoaçar, do brigue em movimento, a subir e descer sobre as
ondas. Mas a interiorização da perspectiva não tarda a se desfazer
nos veros de ação. As vagas correm. Os astros saltam. O mar "acende
as ardentias". O brigue corre. O Poeta, da sua órbita privilegiada,
vê e descreve.
A primeira parte
de Navio Negreiro contém onze estrofes compostas em quartetos
eruditos, com dois versos rimados,
decassilábicos. A intenção de Castro Alves foi mostrar as duas
imensidades — o oceano e o firmamento, que "ali se estreitam
num abraço insano". A onisciência do Poeta cede lugar, pela primeira
vez, à interrogação, à dúvida, na quinta estrofe:
Donde vem ? onde vai ? Das naus errantes
Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço ?
Este será o
primeiro toque de mistério, a sugestão que há de inquietar o
auditório. O quadro panteísta impressiona pela
plasticidade. Ao referir-se à "música suave" das vagas, à "doce h
armonia da brisa", à orquestra do mar e ao sibilar dos ventos nas
cordas, o Poeta cria nesse enleio do homem com a Natureza as
condições que lhe acentuam, a partir da quarta parte, a indignação.
As três primeiras partes constituem, assim, uma antítese,
provavelmente deliberada, das três seguintes. A poética castroalvina
assenta muito no jogo das antíteses. Há um constante paralelismo de
idéias e imagens, e esse paralelismo foi acentuado por Eugênio Gomes
quanto à composição de Navio Negreiro. O leitor é levado a deduzir
que o quadro grandioso descrito no proêmio do poema não pode
permitir a nódoa infamante, "este borrão" que é o brigue negreiro.
Albatroz ! Albatroz ! Dá-me estas asas.
O recurso, tão
habitual na poemática clássica, do apelo às musas, às entidades,
encontra aqui uma variante. Castro Alves socorre-se do albatroz a
fim de inquirir, mais de perto, o motivo por que o "barco ligeiro"
foge "do pávido poeta". Todo o horror da cena é entrevisto, de
inopino, na terceira parte do poema, constituída de uma única
estrofe — uma sextilha em versos dodecassilábicos. Ainda antes, na
segunda parte, em décimas de redondilha maior, com rimas alternadas,
Castro Alves insiste no objetivo do contraste, ao cantar o fado e a
glória dos marinheiros de todo o mundo:
Nautas de todas as plagas,
Vós sabeis achar nas vagas
As melodias do céu !...
A cesura entre a
contemplação plácida, satisfeita, e a descoberta brutal do brigue,
fermenta a indignação. A quarta parte, em estrofes heterométricas,
combinando alexandrinos com hexassílabos,presta-se admiravelmente ao
verso direto, cortante e afiado, que fulge, no ar, em lampejos de
ira concentrada, quais estalos de chicote:
Era um quadro dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho
Em sangue a se banhar.
As palavras,
sobretudo os adjetivos, valem pela carga emotiva. Parecem varadas de
luz, como os vitrais. São palavras-objeto, usadas com todo o impacto
semântico. Elas refulgem, prismáticas e cromáticas, na sua função de
espelhos. O enleio fonético, sendo imediato, acentua a musicalidade.
De tão audíveis, as palavras parecem conter em si mesmas, na sua
identidade imediata, de superfície, os transportes do poema. Carecem
ainda, é verdade, da revalorização semântica, da música interior, da
densidade de idéia que Castro Alves iria obter mais tarde, em
"Crepúsculo Sertanejo" e outros quadros de A Cachoeira de Paulo
Afonso, conforme anotação de Eugênio Gomes que subscrevemos. E, no
entanto, aquelas palavras, entregues à sua força imanente, apoiadas
na grandiloqüência do discurso, comunicam em cheio a poesia. Pouco
importa que estejamos avisados contra a sedução fácil, o repentismo,
o barroquismo de efeito externo. O contágio vence a vacina das
prevenções. Observou, a esse respeito, o poeta Godofredo Filho, na
introdução à edição de 1959 de Navio Negreiro pela Livraria
Progresso Editora, de Salvador: "... as relações de sua linguagem
ordenam-se à base de uma dinâmica que, em determinados estágios, ele
já não poderá controlar. Os sintagmas, progressivos, como que se
projetam em espiral".
A quinta parte,
em décimas de redondilha maior, com rima variada, acentua o
exercício de indignação. O poema passa do motivo às conseqüências. A
declamação procura sensibilizar mais ainda as consciências, através
da imprecação e da apóstrofe. O Poeta interpela o Deus dos
desgraçados. Apela para a fúria das tempestades, noites e astros.
Convoca o tufão a varrer dos mares o brigue dos horrores:
Quem são estes desgraçados
Que não encontram m vós
Mais que o rir calmo da turbas
Que excita a fúria do algoz ?
Encontram-se
nessas estâncias alguns dos mais conhecidos — e conseqüentemente
admirados — versos da poética de língua portuguesa. Ainda que a
África seja, ali, uma vaga ressonância, sem maior documentação
geográfica, a imaginação se precipita espumejante nas suas ardentias.
E, mais uma vez, na capacidade de motivar e comover, o Poeta exerce
a predominância dos sentidos, força uma aceitação imediata. É que a
sua oratória também se embebe de subjetividades. No fervor de suas
causas, na exaltação do temperamento libertário, o Poeta pôs toda a
alma e firmou, então, a arquitetura do poema.
A última parte
de Navio Negreiro, em oitavas heróicas, decassílabos camonianos,
ajusta-se aos açoites finais da
indignação de Castro Alves na montagem de dois quadros díspares — o
canto da Natureza não conspurcada, a poluição do mar pelo barco de
escravos — e, entre um e outro, o hemistíquio de suas interrogações.
Novamente aí, no majestoso final, estão alguns dos versos mais
encantatórios e flamejantes da escola que Castro Alves personificou
no Brasil:
Meu Deus ! Meu Deus ! mas que bandeira é esta
Que impudente na gávea tripudia ?
(...)
Auriverde pendão da minha terra
Que a brisa do Brasil beija e balança.
Este final,
concebido em forma de estuário, é uma peroração. Ao conclamar os
heróis do Novo Mundo, o Poeta deixa no ar, de chofre, toda a carga
emotiva do discurso. Os ecos ressoam. Estão predestinados a se
reproduzirem nos contrafortes da nossa sensibilidade.
Definitivamente,
a obra literária não é um ato isolado de criação. Mais importante do
que o que dizer é o como dizer. No mais, predomina a rotina de
idéias. Navio Negreiro, com um tema e uma temática tão sedutores, há
de ter também as suas fontes paradigmáticas. Josué Montello citou
uma: em Estampas Literárias, de 1956 (Organização Simões, Rio de
Janeiro), ele admite que o poeta Guilherme Braga, autor de Heras e
Violetas, volume lançado em 1869, no Porto, teria influenciado
Castro Alves. Com efeito, em poema de 1863, o português escreve:
Que perguntas sem fim ! Ninguém responde !
Deus em que nuvem negra assim se esconde,
Ó alma, que o não vês ?
E Guilherme
Braga também invoca Cristóvão Colombo:
Colombo, inda te espera o mar profundo...
Vai pedir outra vez um novo mundo
Aos países do sol !
O ensaísta
gaúcho Augusto Meyer, em artigo no Correio da Manhã, de 2.2.1963,
intitulado "O Navio Negreiro", e em
O Estado de S. Paulo, de 5.8.1967, sob o título "Navios Negreiros",
estabelece pontos de contato entre o poema de Castro Alves e o de
Heinrich Heine. O tema, pelo menos, é idêntico. O Das Sklavenschiff
de Heine se teria inspirado, por sua vez, ao que parece, no Béranger
de Les Negres et les marionettes. É de Heine, aliás, a epígrafe em
francês com que o Poeta baiano abre Os Escravos.
Mas as
semelhanças entre Castro Alves e Heine estariam limitadas à
descrição oceânica e à dança dos escravos. Ainda assim, cuidadoso,
Augusto Meyer faz o reparo: "De qualquer modo é bom lembrar que
fonte, no sentido restrito e literário, não envolve senão uma idéia
de sugestão, subsídio, informação, estímulo, não implicando
necessariamente a idéia de influência".
O comércio de
escravos trazidos em barcos negreiros não foi um tema circunstancial
na poética castroalvina. O compromisso do Poeta, nele e em outras
peças de teor social, ia além da emotividade, era mais fundo. Por
isso, Eugênio Gomes fala em "compromisso moral". Lembra o ensaísta
que, a partir de 1864, quando aderiu ao abolicionismo, Castro Alves
passou a defender as liberdades públicas em geral. Ele já tinha
proclamado, por exemplo, que:
A praça ! A praça é do povo
Como o céu é do condor.
No seu evangelho
pelos humildes, o Poeta torna-se, até, anticlerical, ao sugerir que
o manto do Papa servisse para cobrir os ombros nus dos excluídos. E
nenhum poeta do seu tempo, para espanto, aliás, da jovem burguesia
intelectual que o admirava e o aplaudia, investiu com maior furor
contra o tirano — contra todos os tiranos:
Cai, orvalho de sangue do escravo,
Cai, orvalho, na face do algoz.
Cresce, cresce, seara vermelha,
Cresce, cresce, vingança feroz.
A escravidão é
um tema indissociável da condição humana. A palavra trabalhar, em
português, deriva de tripaliare, que, em latim vulgar, significava
martirizar com o tripaliu — um instrumento de tortura. Em inglês,
slave, escravo, vem de slav, eslavo — porque os eslavos foram os
escravos dos impérios europeus antigos, principalmente o Império
Romano. Os impérios chinês e otomano floresceram graças ao braço
escravo. O Sul dos Estados Unidos, com a sua vocação agrícola,
manteve a escravização do negro africano em regime mais duro que o
nosso. A palavra rabota, em russo, quer dizer trabalho, e tem como
raiz rab, que significa escravo. O sociólogo Theodore Zeldin, em seu
livro An Intimate History of Humanity afirma que, "antes dos doze
milhões de africanos serem seqüestrados para escravização no Novo
Mundo, as principais vítimas eram os eslavos", os quais, "caçados
pelo romanos, cristãos, muçulmanos, viquingues e tártaros, foram
exportados para o mundo inteiro" e "deram seu nome à escravidão".
Segundo ele lembra, a Arábia Saudita foi o último país a abolir
formalmente a escravidão — o que só fez em 1962.
Parece que o
romancista inglês Graham Greene tinha raão ao referir-se, por
intermédio de um personagem seu, aos que nascem para ser "second men".
Teríamos então a humanidade dividida, a grosso modo, em primeiros
homens, os que detêm o bastão de mando, e os segundos, que são os
que trabalham. Eis uma reflexão que nos repugna a consciência, mas
que é oportuna para o tricentenário de morte de Zumbi dos Palmares.
O poeta Castro
Alves, aliás, também saudou Palmares. Num poema escrito em agosto de
1870, na Fazenda de Santa Isabel, ele disse, a propósito do quilombo
histórico:
Ninho, onde em sono atrevido,
Dorme o condor... e o bandido !...
A liberdade... e o jaguar !
Eu pergunto,
agora, se houve poeta que defendesse, mais do que este, os
oprimidos, os injustiçados, os excluídos, os escravizados de todos
os tempos e de todos os lugares, desde que o mundo é mundo. Eu
pergunto se outro houve que, sensível aos fatos sociais da condição
humana fragilizada ainda mais pelas péssimas condições de vida que
lhe são impostas, houvesse tão destemidamente cantado o povo como
fez castro Alves no poema "Prometeu".
Povo ! Povo infeliz ! Povo, mártir eterno,
Tu és do cativeiro o Prometeu moderno...
Leia obra de Castro Alves
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