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Silas Corrêa Leite


 


Ramos e Outras Grafias: O novo livro de Poemas de Antero Barbosa



Olhar bem para as coisas que de repente/Deixaremos de ver para sempre (Aníbal Machado)

 

O premiado literato português contemporâneo, Antero Barbosa, estudioso em prosa e verso de ilustres escritores da fauna luso-brasilis (inclusive de lusonautas atuais do mundo da net), dá-nos a sua mais nova obra impressa, o livro de poemas denominado "Ramo e De Repente", Coleção Ausência Quebrada, Editora Ausência, 2005, Porto, Portugal.

O poeta, ficcionista, ensaísta e crítico Antero Barbosa tem significante história curricular. Publica em sites e jornais portugueses (e alguns brasileiros), foi incluído em coletâneas de Portugal, tem um livro anterior denominado "Contextos", Prêmio Trindade Coelho; e também ganhou o Prêmio de Poesia Brétema com o trabalho "Cenografia", sendo Licenciado em Estudos Portugueses e ainda dirigente de Escola de Ensino Superior em Portugal.

Agora a poesia dele. Diferente, novidadeiro, ele é, quando viça seus poemas que parecem cortados com estilete cego; e dessa maneira vai ele aqui e ali quebrando palavras, torneando-as numa polifonia-tear que tem outras releituras (outra estética) outras ostras; poligrafias e polifonias de contemplações residuais, cortes obtusos, fragmentos e matizes de seu peculiar fazer poético muito bonito e todo próprio de ser.

Mistura joio e trigo - (troio ou jigro?). Ora, que diferença há nesse pós-moderno mundo canibal que é quase pré-húmus e pós nada? Sim, há tanta poesia moderna (ou pseudomoderna) que nem chega a ser poesia propriamente dita.

Antero Barbosa é extremamente criterioso, objeta objetos. Fenos líricos ou lirismo como remos a seco em contemplações rígidas? Talvez pinturas com lágrimas invisíveis, compotas de macadames. Severo no olhar-dizer, dá terra às palavras, habita-nas; perece cacos inominados, mas deixa-se rastro-lastro e lavra-larva.

Esse é o moendar de Antero Barbosa. Sai de si em olhares como incisões fidedignas, poetando espécies assim de desflores.

"Do texto
A epiderme
Apenas pode eclodir(...)"

 

O poetar de Antero Barbosa é isso: olhares que se entrecruzam, des-pregam peças, pinçam memórias-invenções, instigam travas-instantes, círculos epigramáticos e circuitos livres e por isso mesmo nada lineares. Cabem refluxos e expansões de vívidas vivências. O olhar (em prisma - olhar de águia) nu e cru trazendo closes, insight, fragmentos de. Ramos. Talvez espécies de derramas.

A superfície é epidérmica; o lanho íntimo é a tradução das erranças e inquietudes, iscas e nódoas e cracas e nodais. O pensar sobre as geografias, confluências, in-consciências sitiadas pelo arame sem verbo. A casca rompida revela o textamentar-se. Transposições. Crias.

"Morre e varre-se/Por imposto acidente de percurso/Para fora da mente" diz ele no poema A Geografia da Viagem. Riquíssimos percebimentos poéticos. Quase molduras enletradas.

"Por força de confluências/Lógicas o baixio/Atolava e era designado/Lapuceiro/Que remetia pés conspurcados/À missa dominical facto/Repelido/Por força/De sinergias hidráulicas aplicadas/No desvio/Das águas no entanto/Por força do registro/Resistente de silva/Na memória A LAMA/CONTINUA lá...(...)" Essa é uma marca da inominável poesia de Antero Barbosa.

Sim, a poesia de Antero Barbosa também tem casca volátil. Memórias convertidas em poemas e diferentes visões de. Sem cabimentos e estigmas, sem a matemática fria dos moldes. Antonio Machado dizia num poema: "O olho que tu vês/Não é olho porque tu o vês/É olho porque te vê(...)"

Antero Barbosa certamente segue o entendimento de Gabriel Perissé(in, Ler, Pensar e Escrever) "Cultura é o cultivo da própria alma, da própria inteligência, da própria memória, da própria vida(...)" Antero é esse cultivador de poemas.

Sendo sobriamente um vivedor altamente sóbrio, numa situação de desjardim em sua contemplação criativa, ele cria. E tece os ramos, colhe os ramos, transborda os ramos; ele mesmo também no lado de fazedor poético, assim ramificando poemas singulares, descascando situações, momentos, imagens, virtudes, ausências e inquietações da alma.

Antero Barbosa escreve o que em si grita para a sobrevivência possível, aproveitável, resgatadora, dando ramos de identificação íntima. Ramos portando poemas como galhos de si, abrangendo situações, deposições e calhas sobre o enlivramento poético da vida, refazendo-a, de repente, e, aqui e ali, ornando cenários, pontuando cactos, no tear de poemas que, sim, salvos dos incêndios de si, frutificam visões novíssimas acima de todas as coisas pitorescas, muito além (aquém?) de tantas situações bucólicas, contextualizando certos enfoques triviais que ele, sim, magnifica; que ele muitíssimo bem enverniza por intermédio de seu ferino olhar (catador de seivas humanas); terríveis & irremediavelmente da circunstancial natureza humana. Tudo entre o húmus da vida, as inversões de afetos torturados; como vislumbramentos ricamente poéticos desses tenebrosos tempos chamado hoje, que ele verseja em contextos e poligrafias, purgando vitalidades criativas em sua poética fraturada; duelos de palavras que, ao fim, como se numa espécie de árvore-livro (poemas enlivrados) ainda e assim casam congruências entre si, completando a lírica mordaz, voraz, por isso mesmo limpa e linda.
 



Antero Barbosa
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16/03/2006