Sinvaline Pinheiro
O Fusca verde
Dois amigos inseparáveis, seu
Chiquinho alfaiate e o Chaveiro que nunca fez chaves, só o apelido.
Apesar da idade avançada, eram alegres, cheios de piadas. Adotei-os
como amigos, como se fossem meus irmãos mais velhos. Sentiam-se
importantes e responsáveis por tudo e por todos.
Aos setenta anos, seu Chiquinho resolve comprar um automóvel, um
fusca verde. Para evitar perigos, fazia seus treinos diários ao
volante pelos arredores da cidade, levando sempre o amigo Chaveiro
para auxiliá-lo. Caso viesse algum carro atrás ou dos lados, o
Chaveiro lhe advertia, pois não havia tempo de olhar no retrovisor.
- Sai da frente, lá vem o fusca verde!
A meninada já saia correndo. Outros motoristas já freiavam ante a
visão do automóvel verde. Os dois, passageiro e motorista nem se
davam conta do tumulto que causavam, seguiam sorridentes com o fusca
acelerado sempre de 1ª e 2ª marcha.
Certo dia, sabendo que fui hospitalizada, os dois foram me visitar,
lógico que para ir mais depressa, tinha que ser de fusca.
No Hospital Municipal só permitia a entrada de uma pessoa de cada
vez, enquanto um entrou, o outro aguardava na portaria a sua vez.
Seu Chiquinho entrou primeiro. No quarto se mostrou preocupado e
para me distrair, contava suas peripécias no volante, veja só, tinha
ido me visitar dirigindo o fusca...
De repente o Chaveiro entra no quarto, alegre me cumprimenta,
pergunta se estou bem, senta, conta causos, faz piadas, sorrindo
muito tranqüilo. Daí a alguns minutos, seu Chiquinho se situa e
pergunta:
- Ué, Chaveiro, deixaram ocê entrá antes d’eu sair?
O Chaveiro coçou a cabeça, raspou a garganta e respondeu muito
sério:
- Não, é que eu só vim avisá que seu fusca ficou desengatado e está
descendo...
- O que?...
Os dois saíram correndo como crianças para acudir o Fusca, que nessa
altura dos acontecimentos já devia estar muito longe, se algum poste
não interrompera sua viagem...
Aos meus amigos Chaveiro e
Chiquinho, “In memoriam” São Luís de Montes Belos –Goiás
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