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Maria Maia



Estudo

&

entrevista


Sophia de Mello Breyner Andresen,

substantiva e concreta

 

 

 

Conheci Sophia pelas mãos do poeta Fernando Mendes Vianna. Em 98, estávamos em Lisboa para o lançamento da revista Gárgula e Fernando convidou-me para ir à casa dela. Não sabia ainda que iria encontrar a maior poeta viva de língua portuguesa, que no ano seguinte ganharia o Prêmio Camões. Saí da casa de Sophia tão impressionada que no dia seguinte comprei o que havia disponível nas livrarias. A Obra Poética I, II e III, reunindo a produção de 44 a 89. Musa, de 94 e O Búzio de Cós, de 97. O ensaio, O Nu na Antiguidade Clássica. Passei na biblioteca pública e catei outro ensaio: A Poesia de Cecília Meirelles, escrito para a revista Cidade Nova, em 1956. Um dos três ou quatro que escreveu. Poucos, mas luminosos.
No alto da Graça, o apartamento da pequena mulher de aparência frágil exala rigor. Movimenta-se entre quadros de Almada Negreiros, Vieira da Silva e outros expoentes do modernismo português. Porta não apenas no nome o sentido mais fundo do étimo grego: Sophia é sabedoria.

A extensa obra, amplamente adotada nas escolas portuguesas é pouco conhecida no Brasil. Não existe edição brasileira de sua obra. Sequer o importante estudo crítico que Sophia fez sobre Cecília Meirelles, onde, a respeito de Cecília, escreve o que poderia servir para ela própria: "A beleza e a verdade dum poema de Cecília Meireles tem que ser vivida imediatamente e sem explicações, como a beleza e a verdade duma rosa... a limpidez de sua linguagem, a densidade de cada palavra, a exatidão de suas imagens, a nudez de seu pensamento, a serenidade da sua atitude, a ressonância grave e profunda de sua voz".

Sophia conhece muito bem a poesia brasileira. É admiradora de Manuel Bandeira, de quem desde a infância sabe de cor alguns poemas, e foi amiga pessoal de João Cabral de Mello Neto. Fernando Mendes Vianna, lá pelos idos dos anos 50, chegou a publicar uma saudação de poeta para poeta. Foi um esforço isolado. Continua inédita no Brasil. Mesmo depois de arrebatar o maior prêmio de língua portuguesa. Esta lacuna é inexplicável porque o humanismo de Sophia faz falta no Brasil. E por que Sophia é daqueles frutos milagrosos que já nascem maduros. Aos 24 anos, naquele longínquo 1944, já atestava para o que viera:

"Palavras que despi de sua literatura,
Para lhes dar a sua forma mais primitiva e pura,
De fórmulas de magia"

 

Ou ainda, Uma Flor Vermelha:

"Ninguém sabe onde vai nem donde vem
Mas o eco de seus passos
Enche o ar de caminhos e de espaços
E acorda as ruas mortas.

" Então o mistério das coisas estremece
E o desconhecido cresce
Como uma flor vermelha."

 

Os anos 60 trouxeram uma Sophia cada vez menos metafísica e mais concreta. É a vez de Cristo Cigano (61) e Livro Sexto ( 62). É como no soneto de Camões:

"Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades
muda-se o ser, muda-se a confiança
todo mundo é composto de mudança
tomando sempre novas qualidades"
 

Assim, no poema Musa de O Livro Sexto, que ganhou o Grande Prêmio de Poesia da Sociedade Portuguesa de Escritores em 1964, Sophia busca a essência do seu ofício:

"Musa ensina-me o canto
Venerável e antigo
O canto para todos
Por todos entendidos
...
Musa ensina-me o canto
Em que eu mesma regresso
Sem demora e sem pressa
Tornada planta ou pedra"

 

Em Geografia, ainda nos anos 70, enxerga com nostalgia o outro lado do mar português que tanto (a) perseguiu desde ( antes) do nascimento. Ela que nasceu no Porto, onde o Douro deságua no Mar. Amante da fala brasileira - que é uma coisa muito diferente da matriz portuguesa - atravessa o Atlântico
e extrai a substância do Brasil:

"Gosto de ouvir o português do Brasil
Onde as palavras recuperam sua substância total
Concretas como frutos nítidas como pássaros
Gosto de ouvir a palavra em suas sílabas todas
Sem perder sequer um quinto de vogal

Quando Helena Lanari dizia o "coqueiro"
O coqueiro ficava muito mais vegetal"

 

Sophia compreende o processo histórico que do lado de cá gestou o barroco brasileiro - resistência anticolonial - até hoje o ponto artístico mais alto que já alcançamos. Vê o túnel que do barroco brasileiro vai dar nas curvas e retas que Oscar Niemeyer imprimiu em Brasília - fulcro geográfico do projeto de construção da nacionalidade brasileira, prevista no artigo terceiro da primeira constituição republicana. Mestra em revelar essências pousou a linha de sua rigorosa escritura poética para traçar o desenho claro da capital que floriu no umbigo do Brasil. Vislumbrou, na paisagem clara de Brasília, o mapa da ruptura/continuidade do barroco para o modernismo. Mais além, viu a matemática pitagórica e a mão de Atena se erguendo do passado e pousando no Planalto:

"Brasília
Desenhada por Lúcio Costa Niemeyer e Pitágoras
Lógica e lírica
Grega e brasileira
Ecumênica
Propondo aos homens de todas as raças
A essência universal das formas justas

Brasília despojada e lunar
como a alma de um poeta muito jovem
Nítida como Babilônia
Esguia como um fuste de palmeira
Sobre a lisa página do planalto
A arquitetura escreveu a sua própria paisagem

O Brasil emergiu do barroco e encontrou o seu número
No centro do reino de Ártemis
- Deusa da natureza inviolada -
No extremo da caminhada dos Candangos
No extremo da nostalgia dos Candangos
Atena ergueu sua cidade de cimento e vidro
Atena ergueu sua cidade ordenada e clara como um pensamento

E há nos arranha-céus uma finura delicada de coqueiro"

 

A poeta inaugura os anos 70 com As Grades, uma antologia de poemas de resistência à noite salazarista. Porque Sophia, substantiva e concreta, não abstraiu o mundo que a cerca, mesmo quando é um mundo que não possui poesia. É assim que ela registra o horror obscurantista da ditadura:

"Quando a pátria que temos não a temos
Perdida por silêncio e por renúncia
Até a voz do mar se torna exílio
E a luz que nos rodeia é como grades"

 

Em Dual ( 72 ) ao traçar o Retrato de Uma Princesa Desconhecida, escreve um libelo contra toda forma de exploração, em especial àquela que a corte portuguesa submeteu o Brasil. Numa alegoria do processo que envolveu portugueses e brasileiros Sophia traça o retrato de uma princesa ( que bem poderia ser portuguesa), cuja beleza e perfeição é extraída do horror da escravidão ( que bem poderia ser a dos africanos no Brasil ):

"Para que ela tivesse um pescoço tão fino
Para que os seus pulsos tivessem um quebrar de caule
Para que os seus olhos fossem tão frontais e limpos
Para que sua espinha fosse tão direita
E ela usasse a cabeça tão erguida
Com uma tão simples claridade sobre a testa
Forma necessárias sucessivas gerações de escravos
De corpo dobrado e grossas mãos pacientes
Servindo sucessivas gerações de príncipes
Ainda um pouco toscos e grosseiros
Ávidos cruéis e fraudulentos

Foi um imenso desperdiçar de gente
Para que ela fosse aquela perfeição
Solitária exilada sem destino "

 

Sophia, a sabedoria poética viva, no vigor dos 80 anos, escreve com o mesmo senso de novidade de quem, na infância, inventou um "alfabeto" para fazer poesia antes mesmo de se alfabetizar. Ensina para o mundo que é impossível escrever sem viver. É o testemunho da resistência do poeta em um mundo que
matou seus deuses, mas não conseguiu calar seus poetas.



ENTREVISTA



Maria: Quando estive aqui com o Fernando Mendes Vianna há dois anos, a sra falou um pequeno trecho da Odisséia em grego. Falou de memória

Sophia: Falei em grego? Eu não sei grego, só uns versos.

Maria: Falou alguns versos... a senhora é muito marcada pela visão do mundo grego?

Sophia: Sim, sim, evidentemente.

Maria: Como assim?

Sophia: É natural, não é? É muito parecido. Como na Grécia tem a mesma cor, se come azeitona, figo, azeite. É como a Itália, não? Sabe, nós não sabemos ao certo como nos marcam as coisas que verdadeiramente nos marcaram. É como um amigo que perguntou: como fazer verso?

Maria: Não se explica.

Sophia: Eu pelo menos não explico. Só as pessoas que fazem maus versos podem explicar. O que marcou e o que fez verso.

Maria: Quando a senhora começou a escrever?

Sophia: Quando comecei escrever eu não sabia escrever. Eu tinha uma pena enorme (rindo ). Eu pedi a minha mãe papel e caneta. Escrevia uma grafia que eu tinha imaginado, imagine você...Uns desenhos de umas letras inventadas por mim. Eu contava em voz alta.

Maria: Muito criança ainda, antes de ser alfabetizada?

Sophia: É. Foi. E depois aprendi a ler e a escrever. Comecei a escrever cedo, sim. 14 anos, 12 anos. Primeiro mal, depois melhor, não é?

Maria: E publicou com uns vinte e poucos anos.

Sophia: 23 ou 24, já não lembro mais. Primeiro livro, sim. (pausa. Retoma decidida). Não, publiquei antes. Em revistas e coisas assim. Depois publiquei um livro. Creio que aos 24 anos.

Maria: Isso em 44. O livro Poesias, não é?

Sophia: Poesia. No singular.

Maria: Poesia. É. Depois então em 64 ganhou um prêmio importante aqui em Portugal.

Sophia: Um prêmio importante? Sim, foi no ano passado.

Maria: O prêmio Camões, no ano passado. Mas em 1964 um livro de poesia da senhora já tinha sido premiado.

Sophia: Sim.

Maria: E sua relação com a poesia brasileira, conheceu poetas brasileiros?

Sophia: Bem, eu acho que tive uma relação muito profunda com o João Cabral e com as coisas que ele procurava ( pausa ). Eu não pensava muito nisso. Nuca tive muita teoria. Fui sempre uma pessoa muito antiteórica. Mas encontrei muita coisa. Quando encontrei João Cabral ele disse-me assim: eu tenho muita admiração por si...que é que ele disse? ( pausa) como é que foi que ele disse? (procurando na memória) ...porque você é uma poeta que usa muito substantivo concreto.( ri ). Eu pensei: é? Mas é verdade, não é? Nos encontramos em Sevilha. Nós fomos com uns amigos brasileiros que iam lá convidados pelo João, para a casa dele. E o João disse: por que vocês não vêm e ficam no hotel? E fomos e ficamos num hotel lindo que o João descobriu. Era lindo, era um antigo palácio de uma família sevilhana. Já não existe, sabe? ( dando um trago no cigarro). Já destruíram ( jogando as cinzas no cinzeiro). O turismo é uma desgraça em toda parte do mundo, não é?

Maria: Vai acabando tudo, nivelando, pasteurizando... O encontro com João Cabral foi quando ele era consul em Barcelona, não? E a partir daí a senhora entrou em contato com a poesia brasileira?

Sophia: Não. Eu já tinha lido o Manuel Bandeira. Já tinha lido vários poetas brasileiros. É que nesse tempo havia uma relação muito mais próxima, sabe? Porque o mundo não estava tão confuso como agora. Sai tanto livro. Sai tanta confusão. Agora um poeta se projeta, fala-se de sua obra, não é porque escreveu livros bons. É porque tem uma boa pessoa encarregada de sua propaganda.

Maria: De preparação na mídia, nos jornais. É verdade.

Sophia: Naquele tempo não. Vinha um amigo que dizia assim: - "Li ontem um poeta brasileiro extraordinário". Ele não tinha nada a ver com propaganda alguma. Mas a gente, se queria, lia o livro.

Maria: E a senhora considera importante esta relação entre a poesia portuguesa e brasileira?

Sophia: Bem, eu considero importante a relação entre toda a poesia. A portuguesa com a brasileira é importante, como é importante a relação com a poesia africana. A poesia moçambicana é ótima, não é? Porque são países que falam português. Quer dizer, tem uma experiência de linguagem falada, de uma língua só.

Maria: E agora, ultimamente a senhora fez O Búzio de Cós, o último livro publicado foi O Búzio de Cós. E continua escrevendo?

Sophia: Sim, continuo.

Maria: E o sentido do trágico? A sua poesia é trágica, no sentido grego... A senhora se considera da mesma tradição de Fernando Pessoa?

Sophia: Não acho muito parecido com a tradição do Pessoa não. ( pausa longa ) O pessoa é um homem que para escrever renunciou a viver. Isso não se parece comigo nem com o João Cabral, não é?

Maria: A sua é uma poesia de quem vive, não é?

Sophia: Sim. É uma poesia de quem vive.

Maria: A senhora tem um artigo, um ensaio, sobre a Cecília Meirelles.

Sophia: Tenho. Foi o primeiro artigo que fiz na minha vida, não é mesmo? Porque eu não gostava nada de artigos. Mesmo hoje em dia não gosto nada. Mas naquela época eu gostava menos, sabe?

Maria: E por que escreveu sobre a Cecília?

Sophia: Porque havia uma homenagem à Cecília e me convidaram para ir. Então eu fiz o artigo. Correu bem. Houve muita palma na minha intervenção. Mas a Cecília não foi, você sabe? Então aconteceu uma coisa, uma história engraçada. Ela não foi porque tinha uma amiga - agora se pode dizer porque a Cecília já morreu e a amiga também. E a amiga dela era uma mulher feia, fazia muita intriga. E disse à Cecília que éramos comunistas. A Cecília teve medo. Tratou a sério e não veio. Eu fui e também li os poemas dela. Depois ela ficou um bocado escandalizada, não é? Então a Cecília no Natal mandou uma grande caixa com frutos de natal, sabe? Frutas secas, nozes, essas coisas de natal. Você sabe que todos os natais eu ponho na árvore de natal ainda hoje? Mas eu nunca agradeci à Cecília.

Maria: Foi um equívoco que aconteceu entre vocês. Lamentável.

Sophia: (Levantando-se para pegar o segundo cigarro). Foi pateta. Mas é melhor perdoar, não? ( longo silêncio. Sophia levanta-se, pega a carteira de cigarros na mesa em frente ao sofá e leva para o seu escritório, contíguo à sala onde estamos sentadas). Vou guardar para não fumar mais. Fumo muito pouco. Eu tenho muito pouco cigarro. É uma coisa terrível, porque não se vendem cá estes cigarros. Então quando vem um amigo, me traz.

Maria: Ah! Não se vendem aqui em Portugal?

Sophia: É. E também tenho que fumar pouco, não é? Então meus amigos dizem-me assim: - "Eu mando pouco para você fumar pouco." [Espero. Depois de instantes, Sophia retorna com um cigarro, que mantém apagado.]

Maria: A fonte de sua poesia é Portugal, o mundo ou é interior?

Sophia: Daí eu não sei a diferença entre interior e exterior. Eu vejo com os olhos, ouço com os ouvidos, como com os dentes, sinto com o nariz. Quanto a minha poesia, é Portugal, é interior e é exterior. Tenho uma parte intelectual, evidentemente. Tem uma parte de cultura, tem uma parte intelectual. Mas tem uma parte vivida, não é?

Maria: E a senhora teria uma definição para a atitude poética?
Sophia: Não, não é possível.

Maria: É fazer.

Sophia: É.

Maria: E suas fontes, referências dentro da poesia, da tradição poética?

Sophia: ( partindo o cigarro ao meio e me oferecendo metade ) Quer?

Maria: Não.

Sophia: Eu parto aqui ( dividindo um cigarro entre 2/3 e 1/3 ) É que até aqui não se fuma ( apontando a parte do cigarro que, por incluir o filtro, focou maior). Esta parte não se fuma, não é? Se eu partir aqui ( aponta o meio do cigarro ) não fica nada ( risos ).

Maria: Eu parei de fumar. Mas de vez em quando fumo um pouquinho.

Sophia (acendendo o meu cigarro e o dela) Estou muito mesquinha hoje. Estou um bocado cansada.

Maria: Quer parar?

Sophia: Não. Daqui mais um quarto de hora.

Maria: Então a senhora estava falando das referências. Eu perguntei sobre as referências poéticas da senhora.

Sophia: ( pausa, Sophia dá uma longa tragada) Pois, o que é que você chama de referências poéticas, ter lido Homero? Ter lido João Cabral?

Maria: Sim

Sophia: Eu acho que é muito mal um poeta que só lê o que escreve. Mas há muito poeta assim hoje em dia, não é? Por isso é que a literatura moderna está tão confusa...O texto mais bonito do Saramago é um artigo não muito longo que ele publicou quando teve o prêmio. Ele fala da sua relação com o avô quando era pequeno. É muito bonito. É o texto mais nostálgico e mais poético que o Saramago escreveu. É um texto que ele fala da sua própria vida. Ele fala o que os livros não falam ou se falam, falam de uma outra maneira.

Maria: Atualmente em Portugal se faz muita poesia boa?

Sophia: Há poetas bons, sim. Antonio Ramos Rosa é muito bom, e outros bons poetas.

Maria: A senhora considera a língua portuguesa uma língua boa para se tratar de poesia?

Sophia: Eu penso que sim. Porque é uma língua que tem uma grande dificuldade em dizer tudo. Falar com tudo, não é. Não é uma língua estereotipada como é um pouco o francês e o inglês. No inglês há muita coisa compacta. O inglês é muito rico, mas tem que ser num único sentido. Em inglês deve-se começar o verso pela primeira pessoa. Eu sei porque tenho colaborado com escritores que me traduziram. Faz muita diferença. A única língua na qual se pode traduzir bem o poeta português é o italiano. Porque é a mesma organização da frase, não é?

Maria: Interessante esta relação da língua portuguesa com outras. Porque também me parece que a língua portuguesa tem possibilidades extraordinárias.

Sophia: Sim, porque tem uma capacidade de dizer, de formar novas palavras.

Maria: Um pouco como o alemão, talvez?
Sophia: É.

Maria: O que é ser poeta hoje? Porque o mundo está tão confuso, tão fragmentário...tem lugar para o poeta hoje?

Sophia: Eu penso que tem, se ele arranja. Evidentemente que é importante que elas encontrem o eco da sua voz. (Toca o telefone, Sophia atende, era engano)

Maria: Este livro aqui foi encontrado entre os escritos de Fernando Pessoa, O que o turista deve ver em Lisboa . Foi encontrado há uns dez anos.

Sophia: Está escrito em que língua?

Maria: Ele foi escrito originalmente em inglês, mas esta edição é bilíngüe.

Sophia: Ah! Muito bom, muito interessante.

Maria: Porque ele achava que o povo português precisava ser mais respeitado dentro da Europa.

Sophia: Pois acontece uma coisa, sabe? Nós gostamos muito da Espanha, da arte espanhola. E o espanhol tem feitos extraordinários. Mas o espanhol é muito afirmativo, tem a mania de negar o outro. E eles têm feito uma política muito antiportuguesa. E eles atrás dos portugueses descobrindo a mesma coisa que os portugueses já tinham descoberto. E é preciso lembrar que as caravelas portuguesas que iam para os descobrimentos os espanhóis saqueavam na volta e mesmo na ida.

Maria: É também muito curioso que grande parte dos poetas contemporâneos importantes sejam poetas de língua portuguesa, não é? O Fernando Pessoa, a senhora, o Jorge de Sena...Mesmo poetas brasileiros importantes como Jorge de Lima, João Cabral...

Sophia: Você vê como o João Cabral usa a língua portuguesa - ele usa e quer usar - muito como Camões. Aqueles poemas conhecidos do Camões, da Índia, são poemas que brincam muito com a palavra. É muito parecido com o João Cabral.

Maria: E o seu exercício poético é também brincar com as palavras?

Sophia: É, sim. Jogo. Há muita parte de jogo, sim. Eu acho que o melhor momento da escrita do poema é quando as pessoas começam a sentir as palavras moverem-se sozinhas, sabe? E a brincarem umas com as outras. Andar a procura da rima, andar a procura do tempo, a procura da consonância, não é?

Lisboa, 10 de maio de 2000
 





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