Abílio Terra Junior
E naquele momento
E naquele
momento me deparei com representantes de um mundo oculto que estava
presente nos meandros da minha mente. Eles me alimentaram antigas
esperanças há muito adormecidas e me falaram de fórmulas mágicas, de
curas e de um mundo que freqüentei quando jovem. Eram misteriosos e
me esperavam junto à minha família, na minha antiga casa, com os
seus papéis timbrados com símbolos antigos. Abençoaram os meus
livros. Saí com minha filha, que demonstrou interesse e retornei com
os papéis assinados por mim.
Eles diziam que
é falso se imaginar um mundo em que tudo é perfeito, mas que é
preciso aceitar o mundo real, com suas imperfeições, sutilezas e
desigualdades, e procurar viver da melhor maneira possível neste
mundo, aceitando todos esses desníveis, choques e contrastes. Eu
acabara de retornar de um relacionamento que durou tempos com uma
bela mulher, em que nos amamos intensamente, vivendo momentos de
emoção, sentimento e de conflitos intensos, em que o amor vencera.
Agora, me deparava com a “outra face da moeda”, me voltaria para o
meu mundo interior, onde também viveria conflitos, dúvidas e
revelações. Seria outro tipo de aprendizado, mas que teria muito a
ver com o anterior, por mais paradoxal que pareça. Seriam formas
diferentes de se buscar o mesmo fim: o autoconhecimento. O
“conhece-te a ti mesmo”, afixado lá no antigo templo de Delfos.
Eram homens
pacientes e aparentemente comuns. Com aquelas poucas palavras
trouxeram-me do meu mundo contemplativo, idealista e utópico para
outro, em que a verdade se esconde nas entrelinhas, a condenação não
é inexorável, as aparências nos enganam, as trevas e a luz não estão
separadas, vida e morte são contíguas e se dão as mãos, a mulher é
um mistério a ser desvendado, no fundo do abismo há uma passagem
misteriosa e inovadora, ação e meditação se complementam, a
imaginação é a grande via de acesso à criação, o voltar-se para si
mesmo impede que se seja engolido pela voragem da insensatez, do
culto ao corpo, do modismo, do recurso fácil ao agrado da massa
nivelando-se por baixo, do apelo às cenas contundentes dos vícios e
misérias humanas na literatura, cinema, televisão, pintura, música.
BH, 16/08/2004
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