No horizonte da poesia mineira deste fin de siècle, poetas de linha
construtivista estão surgindo ou apenas aparecendo para o grande
público.
Há pouco tempo atrás, falei – aqui mesmo neste MINAS GERAIS – de um
certo Marcos Pedroso, que é um dos que vêm surgindo. O poeta Altino
de Castro Caixeta, sem dúvida um construtor exemplar em boa parte de
seu “rimário”, apareceu para o grande público há poucos meses atrás.
Agora está aparecendo mais um: Carlos Roberto Lacerda, nascido em
1947, que acaba de publicar O Azul Menos o Nome (60 páginas, Edição
do autor), seu terceiro livro de poesia.
Natural de Pirajuba, Lacerda integra, juntamente com os poetas Guido
Bilharinho e Jorge Alberto Nabut, o grupo que edita há dez anos a
revista Dimensão, especializada em divulgação de poesia
contemporânea, a qual tem circulado em vários países de um tempo
para cá. O primeiro livro do poeta, denominado A Paisagem do Morto,
foi publicado em 1973. O segundo só veio à tona em 1983, sob a
denominação de Astérion. Com O Azul Menos o Nome sendo publicado
somente agora, deixando a entender que seu processo de concepção
exigiu quase dez anos, a exemplo dos dois anteriores, já fica
evidenciado o cuidado com que Lacerda constrói os seus poemas.
Aspecto comprovável a cada centímetro de leitura.
A começar pela sua capa – uma constelação de signos – O Azul Menos o
Nome é um livro para ser lido com os “cinco sentidos educados”, em
estado de alerta permanente. Isto porque nele está instalada aquela
rede de coisas encontrável nas criações mais radicais de João Cabral
de Melo Neto e Augusto de Campos, está sempre insistindo em se
concretizar a profecia de Mallarmé: “Un coup de dés n’abolira jamais
le hasard”. Com uma consciência clara do velho, sabedor daquilo que
já foi feito, o poeta trabalha com rigor, explorando os recursos
verbal e espacial – no que é joyciano e mallarmaico – em busca do
poema novo.
Dividido em seis partes (Luz na Lâmina, Minimal Logos, A: o Z da
Fala, Mandrágora, Zoo(m), O Signo Transparente), O Azul Menos o Nome
é um livro difícil, que renuncia, do começo ao fim, àquilo que
Augusto de Campos, num recente “Brinde” a Arthur Rimbaud, chamou de
“idiotia da poesia”. O livro é aberto com um poema denominado “Não”
(vem comogo a dico / tomia pré e pós / mim), no qual, em poucas
palavras, é resumida toda a indignação do poeta com relação ao
fácil. Pela concisão (ver “Elo”), pelo ato de passar a “navalha”
para conter o discurso (ver “Antielogio”) e pela constante
instituição de neologismos (ver “Cidade”), uma legítima couraça
contra o comum que por todo lado impera, os poemas jamais se revelam
a uma leitura apenas. Daí porque a poética lacerdiana exige o
“leitor-boi”, o ruminador, o leitor-contra, aquele que Pound
considerava o melhor. Lacerda é, sobretudo, poundiano, porque pesa
as palavras. Nada é supérfluo em seus poemas.