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Deise Assumpção

 

Fortuna Crítica: Tarso de Melo

Apresentação do livro Cofre

 

A poesia que vai neste Cofre de Deise Assumpção, primeiro livro da autora, afirma uma fala consciente: transparece que uma longa meditação sobre (e sob ) os versos aplaca quaisquer marcas de estréia. E em sua base está o jogo hábil de conter – sob palavras pensadas, linhas contidas, fôlego medido – o jorro da memória daquilo tudo que cruzou sua vida, não apenas os fatos marcantes, mas principalmente a alienação da rotina e dos encargos de mãe-mulher-professora, o que constitui uma densa matéria (experiência, existência) sobre a qual, para Deise, qualquer discurso é complexo e exige um escavar das feridas.

A poesia que escapa deste Cofre transita por entre as datas de um calendário pessoal repleto de apontamentos indeléveis que não lhe permitem estar completamente em seu passado ou em seu presente: a visita dos poemas de Deise tem sempre um pé na casa e outro na calçada, e talvez seja mais preciso imaginar que estende sua dança por duas pistas, iluminando uma com a luz da outra. (Não se achará, aqui, qualquer menção ao futuro, pois esta poesia tem em sua mira a contingência dos dias vividos, do dia que se vive, sem evocações de um futuro desta ou daquela cor – debruçada sobre sua condição e sobre como esta mudou e segue mudando, Deise fere-se com aquilo de que participou e participa, não com o que possa vir.)

Nessa tarefa a poeta se faz auxiliar de um rico referencial de escritores, filósofos e, mais que tudo isso, de uma sensibilidade bem treinada para as duras exigências da poesia e da vida (o que, de fato, aproxima sua voz e seu olhar dos da poeta Adélia Prado, influência que Deise homenageia, tentando entender, num belo poema como "Obra completa"). Mas ainda assim, e por causa disso, sua poesia se livra de uma apresentação complexa, obscura ao leitor: o trabalho de Deise Assumpção nesta sua primeira poesia parece ter sido justamente o de sair da "oficina irritada" da poesia com objetos simples, bem talhados, que por trás de suas camadas límpidas deixassem entrever traços que, por si só, já exigiriam demais do leitor.

Desta vez, para sorte dos invasores, o Cofre está aberto: basta trazer outra chave, aquela a que se refere a irretorquível pergunta de Drummond com que Deise Assumpção epigrafa apenas uma das valiosas peças de seu livro, mas que a todas elas protege.
 

                                           Tarso de Melo

 


Tarso de Melo é poeta, tendo publicadas as obras A lapso, Um mundo só para cada par (em parceria), Deserto: 20 poemas, e Carbono, além de História da Literatura em Santo André: um ensaio através do tempo. Edita, com Eduardo Sterzi, a revista Cacto.
 

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Mary Wollstonecraft, by John Opie, 1797

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Fernando Py