Deise Assumpção
Poemas do Inventário de Mauá:
(Os dois poemas abaixo fazem parte do Inventário
Poético da Cidade de Mauá, projeto da Secretaria Municipal de
Educação, Cultura e Esportes, que reúne um grupo de poetas através da
Oficina Aberta da Palavra).
ANTIGA RUA SEIS
caracol no morro
última volta
antigamente só a pé
137 degraus
na placa novo nome
tão comprido
ninguém diz
nem se sabe
quem foi o homem
escadas domésticas
obrigam clãs
encarapinham portas
à esquerda escalam
à direita despencam
cachorros latem
ali
a moradora mais antiga
marido alcoólatra já morreu
visita os doentes do bairro
ensina catecismo
em frente
lado de baixo
safanões e berros
o pai despacha
o menino pra escola
carrinho de rolimã
braços para o alto
reveza campeões
duas meninas
chegam da escola
versão barata
da última moda
embrulha trejeitos
adolescentes
o bar da Rita
pão, pinga
e primeiras necessidades
cheiro de fritura
jogo e sorvete
vende na caderneta
menos o gás
de repente acaba
caminho do céu truncado
mirante de avenida e varais
manobrar o carro
desconjunta o braço
no retrovisor juro:
um anjo da guarda azul
como naquele quadro
da casa da minha vó
SICUT
LILIUM
dos corações de pedra
lascas
em dízimo
(as portas do inferno não prevalecerão):
a gruta
pré-adâmica
no miolo da cidade:
recôndito ostensório
da pedra virgem de cor
(serpente calcada aos pés
coroa de doze estrelas)
prenhe
de rostos:
barro arrebatado da multidão esquizofrênica
tecido
na fonte batismal
hóstias de carne e sangue
assim paridas remissas
à fome abissal:
(Obs.: Poema alusivo à Igreja Matriz Imaculada
Conceição de Mauá, em cujo altar-mor há a inscrição Sicut Lilium, com
a disposição e formato de letra do título do poema.)
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