Dimas Macedo
O escritor Enéas Athanázio
Se tivesse que
declinar as minhas preferências por cinco ou seis escritores
brasileiros da geração atual, eu não teria dúvida de incluir entre
eles o nome do ficcionista e ensaísta catarinense Enéas Athanázio. A
sua obra, desde quando sobre ela lancei os primeiros contatos, como
que me arrebatou a mais viva das admirações, induzindo-me a que nela
procurasse a moldura para espelhar a dimensão de escritor que ainda
não consegui alcançar.
A produção
cultural de Enéas Athanázio, que transita do campo da curta ficção
para os domínios do ensaio literário de feição biográfica e
memorialística, abrange já uma gama considerável de perspectivas
vivenciais e paisagísticas, com um enfoque predominantemente
acentuado para o resgate do regionalismo dos campos gerais
catarinenses.
No aspecto
particular da documentação do regionalismo, o que se pode dizer com
relação à ficção de Enéas Athanázio é que, efetivamente, ela
configura um painel da mais cristalina representação, inscrevendo
assim nas páginas da literatura brasileira o sabor mais sugestivo e
profundo das paisagens e vivências do seu Estado natal, trilhando
assim os mesmos caminhos anteriormente percorridos por Lacerda
Coutinho e Virgílio Várzea, pioneiro dos mesmos motivos estéticos e
das mesmas simbologias populares que Enéas Athanázio tem agregado ao
contexto da sua elaboração ficcional.
Como ficcionista
estreou com O Peão Negro, em 1973, livro que lhe daria,
aliás, a mais consagradora das reputações. Essa luminosidade de
ficcionista seria posteriormente confirmada com a edição dos
seguintes livros: O Azul da Montanha – 1976, Meu Chão
– 1980, Tapete Verde – 1983, Erva-Mãe – 1986 e
Tempo Frio – 1988, todos, inclusive o primeiro, publicados pela
Editora do escritor, de São Paulo, a par de convertidos em
autênticos sucessos editoriais.
A sua produção
de ensaísta, igualmente dimensional e sugestiva, abrange já o elenco
das seguintes publicações: Três Dimensões de Lobato – 1975,
Godofredo Rangel – 1977, O Promotor Público na Justiça
Eleitoral – 1978, O Mulato de Todos os Santos – 1982,
Figuras e Lugares – 1983, A Pátina do Tempo – 1984,
Presença de Inojosa – 1985, Falando de Gilberto Amado –
1985, Meu Amigo Hélio Bruma – 1987 e O Amigo Escrito –
1988, todos enfeixando trabalhos da mais elevada consideração, em
torno, principalmente, das figuras de Monteiro Lobato, Lima Barreto
e Godofredo Rangel, cujas trajetórias têm encontrado no escritor
catarinense a sua mais autorizada instância de interpretação.
Os contos de
Enéas Athanázio, como já observou Salim Miguel, “seguem uma tradição
que vem de longe nas letras brasileiras”. E prossegue Salim Miguel:
“dentro de um estilo e uma linguagem que o identificam, num cunho
regionalista bem marcado, cria por vezes algumas variantes, partindo
para uma linha fantástica da qual extrai bons efeitos”, resultados,
aliás, que se vão cristalizar finalmente nas páginas inconfundíveis
de A Cruz no Campo, São Paulo, Editora do Escritor, 1989,
novela na qual o autor nos revela uma instigante proposta literária,
de característica marcadamente regional e paisagística, costurada
por uma excelente urdidura emocional e psicológica, na qual o seu
mais conhecido personagem, o Dr. Janary Messias, adquire a sua mais
humana e totalizante dimensão, sugerindo-nos assim Enéas Athanázio
alguns horizontes tendentes à interpretação da sua cosmovisão de
escritor competente e inventivo.
E assim se vai
encaminhando a produção literária de Enéas Athanázio: um conjunto de
procedimentos sensoriais e imagísticos, documentados por um discurso
tipicamente regionalista e de forte conotação mundividencial. Uma
produção, em verdade, comprometida com as seduções da arte literária
e com os enigmas e encantos de pesquisa estética e estilística de
coloração regional.
De Ossos do
Ofício/1992
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