Dimas Macedo
Investigação Sobre Pedro Lyra
Da transitividade do ser aos processos
de reificação ou de transformação da consciência reina, de forma
soberana, a maior de todas as linguagens criativas. O ato de criação
ou de transfiguração da poesia é tão sutil e magnético quanto a
manifestação de todos os mistérios e mitos insondáveis.
Acho que podemos falar de uma mística
da poesia, assim como podemos supor a inexistência da matéria a
partir das suas formas plurais de energia. A espada e a lírica com
que se arma o empreendimento do poema tanto podem construir a
geopolítica de qualquer civilização planetária quanto transformar os
processos sociais e econômicos de qualquer modo de produção em
andamento.
Aquele que serve de parâmetro ao atual
estágio de regressão da cultura, até o limite da barbárie e da
violência plural e indiscriminada, isto é, o modelo de produção do
capitalismo financeiro, na sua fase superior de concentração de
riquezas e de exclusão social, está a questionar os potenciais de
indignação e de revolta que os poetas carregam em sua consciência.
A alienação das formas de construção
do poema e a alienação dos poetas malabaristas, nefelibatas e
provincianos não mais respondem às exigências da linguagem que a
nova desordem cósmica e mundializada erigiu como suporte da sua
contradição e da sua negação transformadora.
Creio que não é preciso ser marxista, socialista ou adepto dos novos
princípios políticos da insubordinação ou da desobediência para
constatar que o holocausto do capitalismo financeiro – unilateral,
concentrador e excludente – é tão perverso e assassino quanto as
concepções totalitárias que destruíram muitas esperanças durante o
século precedente.
Sou marxista, poeta, crítico de
literatura, ideólogo e militante político de esquerda. E sendo tudo
isso e menos aquilo que alguns setores da literatura e da política
da minha província me conferem, é que aceito com prazer a tarefa de
apresentar o novo livro de poemas de Pedro Wladimir do Vale Lyra,
intitulado Argumento (Rio, Editora Íbis Libris, 2006), isto porque
vejo nele o que há muito não era observado em poetas brasileiros
deste início de século e de milênio.
Pedro Lyra é um poeta de inquietações
criadoras e de recursos formais polifônicos, de contágios e de
amores bem concretizados, de desejos poéticos de viés metafísico e
de confrontos com a divindade, de decisões e desafios incrustados em
todas as potências da alma. Não tem medo de se expor como poeta, de
construir suas teses (na maioria das vezes contestadas), de apostar
no jogo do amor e do afeto em meio à coisificação dos vários objetos
da cultura.
Não faz dos seus livros o lugar onde
deposita as suas queixas de infelicidade, como muitos poetas da sua
geração, pois sabe que a felicidade do escritor é a sua luta
encarniçada e cotidiana com a palavra e com as suas formas supremas
de representação. Sabe, por outro lado, que a melancolia e as dores
de cabeça e de vaidades dos poetas nascem da sua indecisão de
assumirem a radicalidade da sua condição existencial.
A socialidade da arte, nos tempos
atuais, exige, de todos os arquitetos da palavra, um compromisso com
a verdade e com a vida, mas não exige que a arte se submeta às
camisas de força do mercado. Os dilemas ideológicos dos dias de hoje
não se devem vincular aos padrões monetários do mercado, aos estilos
de vida dos novos concentradores de riquezas, nem à linguagem das
filosofias que apostam na aceleração das tecnologias que desumanizam
o trabalho e agridem a dignidade das pessoas.
Os dilemas dos novos escritores devem
ser substituídos por suas ações conseqüentes. O humanismo e a
superação das misérias sociais, agora mais do que nunca, são
situações que devem desafiar a imaginação do escritor, pois neste
ponto latejam a condição humana e todas as ânsias de concretização
dos desejos e das formas reprimidas de realizações no plano do amor,
da fraternidade e da justiça.
Não pretendo, neste texto, falar de
Pedro Lyra enquanto crítico literário, ensaísta e pensador da
cultura. O doutor e o pós-doutor em literatura, o professor
universitário e o teórico da ideologia literária cedem lugar aqui à
maior de todas as possessões que os deuses, o destino e a
inquietação metafísica conferiram à sua personalidade polêmica e
fascinante.
Sou leitor de Pedro Lyra desde as suas
primeiras teses acadêmicas. Acompanho a sua decisão de remar contra
as velhas formas de construção da linguagem poética. Sou, ademais,
fã do ideólogo e do filósofo da literatura que ele representa para
todos nós.
Alguns bons e velhos escritores do
Ceará e do Brasil acham que a sua obra é cheia de novidades e de
proposições e recursos poemáticos incompreensíveis. Acho que nisto
reside o significado da sua contribuição literária e é por isto
mesmo que inscrevo-me no seu diversificado universo de leitores:
virtuais, blogueiros, internautas, leitores tradicionais e
admiradores de suas invenções metafóricas, em vários países onde a
sua obra já foi traduzida. E neste sentido, é correto afirmar, Pedro
Lyra não é um escritor cearense. É, antes de tudo, um cearense que
deu certo na literatura: como poeta, ensaísta e pensador dos seus
contrapontos e da sua verdade transcendente.
Leia Pedro
Lyra
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