A Lista [nova] de dona
Heloísa Buarque de Hollanda
Vinte e dois poetas, hoje:
Alberto Martins -
ainda não está no JP
Aníbal Cristobo -
ainda não está no JP
Antônio Cícero
Arnaldo Antunes
Augusto Massi
Carlito Azevedo
Cláudia Roquette-Pinto
Eucanaã Ferraz -
ainda não está no JP
Felipe Nepomuceno
Guilherme Zarvos -
ainda não está no JP
Heitor Ferraz
Ítalo Morriconi -
ainda não está no JP
Josely Vianna Baptista -
ainda não está no JP
Lu Menezes - ainda
não está no JP
Marco Antonio Saraiva -
ainda não está no JP
Moacir Amâncio
Nelson Ascher
Paulo Lins - ainda
não está no JP
Ricardo Aleixo
Rodrigo Garcia Lopes
Valdo Motta - ainda
não está no JP
Viven Kogut - ainda
não está no JP
[Jornal de Brasil, 05.12.1998]
Vôo da nova poesia
Heloísa Buarque de Hollanda
cria a editora Aeroplano e volta
a radiografar nova geração de poetas
EDUARDO GRAÇA
Primeira metade dos anos 70. Mais precisamente
um par de meses entre 1972 e 1973. Em um cenário cultural combalido
pela opressão dos governos militares, um grupo de jovens artistas
protagonizou o que eles próprios classificariam anos mais tarde
como um surto poético. A imprensa, é verdade, se encarregaria
de elaborar alcunha mais polêmica. Simbolizada pelos mimeógrafos,
utilizados para a reprodução de suas alucinadas criações,
concentrados em Ipanema ou arriando as costelas nos pilotis da PUC, os
poetas marginais apontaram, na seara improvável da poesia,
a necessidade de se romper com padrões pré-estabelecidos.
De virar a cara para as vanguardas e, avessos a compromissos, bandeiras
ou plataformas, apontar sua lupa irreverente para o próprio indivíduo.
Rodeada mais uma vez por jovens artistas, às
voltas com a publicação de outra coletânea, radiografando
uma nova geração de poetas, a professora Heloísa Buarque
de Hollanda, 58 anos, não consegue evitar um certo déja
vu. Vinte e dois anos depois de organizar a publicação
de 26 poetas hoje, o livro que reunia a inovadora produção
da Geração-70, a comandante da novíssima Editora Aeroplano
promove, ao lado da reedição do esgotado clássico,
o lançamento de Esses poetas. Trata-se de uma decidida pincelada
sobre o que se produz de melhor na poesia contemporânea.
Sinal dos tempos, uma festa lounge, no
Museu de Arte Moderna (MAM), no próximo dia 10, apresenta ao público,
entre sofás e uísques, a face heterogênea desta nova
geração. Que reúne o titânico Arnaldo
Antunes ao lírico Antônio Cícero, a realidade acachapante
de Paulo Lins aos poemas de temática homossexual de Guilherme Zarvos,
o experimentalismo de Felipe Nepomuceno à calmaria fervente de Eucanaã
Ferraz.
Por muitos anos Helô recebeu convites para
reeditar 26 poetas hoje. Não quis. "Sempre pensei que atualizá-lo
seria um absurdo em si. Ele é, afinal, tombável", brinca.
O livro é, sim, um clássico. Trata-se de registro exato da
época. E o lançamento conjunto, com obra aparentemente idêntica,
embaralha o tempo com espantosa naturalidade. A referência é
inevitável. E proposital. "Penso que este também seja um
lançamento característico de uma geração. Ao
menos foi esta uma das expectativas de sua concepção", diz.
Mas Helô sabe que hoje talvez seja mais
improvável que se consiga bisar o quase balbucio de Cacaso ao justificar,
em apenas uma sentença, o que faziam, lado a lado, os textos de
Antônio Carlos Secchin e Capinam. De Torquato Neto e Roberto Piva.
De Chacal e Roberto Schwarz. "Fizemos um poemão. É
como se estivéssemos escrevendo o mesmo poema a 1.000 mãos",
dizia à época.
Compreende-se. Havia algo que os identificava:
a explosão. Das maneiras mais diversas, a partir de uma lista de
produtos no supermercado ou das mechas descoloridas da garota da capa,
fincava-se um esboço de projeto. O de falar, com uma postura quase
sempre tão triste quanto irreverente, de um dia-a-dia sufocante,
em que política e literatura não poderiam, por princípio,
arriscar uma separação.
Em contrapartida, uma das marcas dos poetas da
Geração 90 é justamente a heterogeneidade. São
poemas com temática gay, experimentalismos gráficos, buscas
da oralidade primitiva, reconstruções do concretismo, lirismo
negro. "Nós não temos mais vergonha de transitar por todos
os cantos. Mas temos vergonha de percorrer os mais variados caminhos de
modo inocente", diz o poeta Eucanaã Ferraz.
Distante dos anos 70, em que a direção,
clara, era a do desmonte. De padrões, de produção,
de espaço e, por que não, de qualidade. Para boa parte da
crítica, eles seriam, como lembra Heloísa na nova introdução
de 26 poetas hoje, os arquitetos de uma "poesia ruim, suja e sem
qualidade". Hoje o caminho é oposto. Os jovens poetas falam em construção.
Em elaboração. Em retorno à academia. Nada mais demodé
que drop-out. "Na época, fazer soneto era quase um crime.
Hoje não. Pode-se fazer um soneto e musicá-lo. Ou remexê-lo
visualmente. Ou ainda entoá-lo como um rap", aponta.
A época do mimeógrafo, é
certo, passou. Vive-se o tempo do Docutec, que permitiu à
editora Sette Letras publicar, nos últimos cinco anos, livros de
uma centena de poetas. Com tiragens médias de 200 exemplares. "A
pista é a mesma. Pode-se atirar na mesma medida", diz Heloísa.
Nem um pouco assustada com outros sinais que identificam este novo surto
poético.
Que podem estar na produção em
massa de Elisa Lucinda. Ou na Internet, com os impressionantes sites de
poesia do mangue bit, das mulheres negras e dos poetas do MST. Ou
ainda na impressionante longevidade do CEP 20.000, centro de experimentação
poética que namora sem culpa, desde os anos 80, as mais diversas
tecnologias. Basta ligar a tevê para encontrar dois de seus mais
representativos artistas, Bianca Ramoneda e Michel Melamed, apresentando
programas culturais. Que, assim como Lucinda, não fazem parte da
coletânea de Heloísa. Prova apenas de que esta é uma
geração de fôlego imenso, que abandonou, há
tempos, os alegres limites de Ipanema.
Onda
Conheci-o no Arpoador
garoto versátil, gostoso,
ladrão, desencaminhador
de sonhos, ninfas e rapsodos.
Contou-me feitos e mentiras
indeslindáveis por demais:
eu todo ouvidos, tatos, vistas,
e pedras, sóis, desejos, mares.
E nos chamamos de bacanas
e prometemo-nos a vida:
Comprei-lhe um picolé de manga
e deu-me ele um beijo de língua
e mergulhei ali à flor
da onda, bêbado de amor.
Antônio Cícero.
Los Angeles
Área roubada
que agora pergunta ao pó.
Carros, estrelas
de Hollywood,
carros, só.
Yankees desconhecem seu nome,
e chamam a cidade L.A.
(seis milhões de índios
entregam pizza, limpam chão)
Felipe Nepomuceno
Obá Kossô
xangô, obá kossô, cobre
a cabeça com com sua cobra de cobre
e chega, portando a pedra do raio:
tudo brilhando nele, tudo
mudado em segredo, todas as
loas para ele - elefante
que anda com porte de rei,
cavalo que manda e desmanda
como um rei, pantera preta,
senhor rei de agasu -, aganju
que bloqueia o rio e queima
a chuva com o raio.
Ricardo Aleixo
Daniel Piza escreve sobre as antologias de dona
Heloísa
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