O FOLE
DO CURURU
Dizem que um Cururu
mora na caixa, a caixa que fica debaixo da cama de tia Maria. À
noite, quando todos dormem, o Cururu puxa o fole. De dia, quando os
chinelos se arrastam, ele guarda sua música no papo.
Dizem também que o
menino que mora na casa de tia Maria nunca caçou cururus, mas morre
por ter um deles
Um dia, quando o vovô
chegou de viagem, o menino teve que se arranjar no quarto da tia.
Com o sono da vizinhança, o fole do Cururu começou a tocar. O menino
então se agachou o necessário para pôr-se à altura da cama, embaixo.
E com a pontinha dos dedos o Cururu prendeu o menino na caixa.
O
CURURU
INCHADO
O Cururu já não sabia mais o que
fazer e pôs-se a inchar.
No começo, ninguém botou fé, mas logo o Cururu ficou do tamanho de
um cabrito; um pouquinho mais e já passava do boi; de tarde, já era
maior que o elefante; de noite, avistava o mesmo que a girafa.
No outro dia, o Cururu estava tão
grande que ninguém mais pôde encontrá-lo. A partir de então, nenhum
bichinho duvidou mais de Compadre Cururu.
A
VOLTA
DO MENINO PERDIDO
O mesmo menino que, todas as
noites, salpicava sal no Cururu se perdeu no escuro da cidade.
Ninguém sabia em que rua ele chorava perdido.
Por sorte, naquele instante, o
Cururu passava por ali. E reconhecendo o menino, disse:
— Ei! Entra aqui no meu papo que
eu te levarei de volta!
O menino entrou no papo do Cururu
e coaxo, coaxo, coaxo, achando muita graça no balanço do sapo.
Quando chegaram em casa, o Cururu
foi para detrás do gelágua e o menino foi recebido em muita festa,
com brigadeiro e pipoca de microondas.
A
FESTA
NO CÉU E NAS ÁGUAS
O Cururu — sabendo da notícia —
escondeu-se na viola de Compadre Urubu. Chegando à festa do céu,
brincou com os outros pássaros, dançou e fez o que bem quis.
Depois de tudo, voltou a
esconder-se.
Quando já iam no meio do caminho,
um avião quase-quase derrubou Compadre Urubu, que conseguiu desviar
por pouco, largando a viola com o Cururu e as músicas.
E no meio da queda, quando não
havia o que fazer, o Cururu gritou bem alto para o seixo que iria
espatifá-lo:
— Arreda daí, pedra, que lá vou
eu!
A pedra então se afastou, e, da
pedra-saltada, saltaram as águas, e o Cururu sentiu-se em casa.
A
CAIXA
DE SAL
O menino pegou a caixa de sal e
foi para fora.
Quando o moleque levantou a pedra
do quintal, o Cururu que morava embaixo fechou os olhos, respirou
fundo e pensou: “Lá vem sal”.
Dito e feito, o menino abriu a
caixinha e sapecou sal no Cururu.
Aí?! Aí foi a maior festa! O
Cururu, com a pele protegida pelas águas da queda, pulou, riu e fez
piruetas no chão! O menino também! Fez mímicas e dançou, achando
graça da travessura do Cururu.
BANDA
CELESTE DA LAGOA
No fim dos tempos, Nosso Senhor
veio julgar os bichos. Compadre Cururu era o quinto da fila.
Chegando sua vez, Nosso Senhor perguntou:
— Então, irmão Cururu, o que
fizeste dos dias que te dei?
— Ah, Senhor, banhos de lagoa,
festas e viola! Dormi verões inteiros, merendei muito, sim, dei
voltas ao mundo; costuraram minha boca, mas foi uma festa que eu
nunca vou me esquecer.
— Não trabalhaste um só
expediente, irmão Cururu?
— O Senhor ainda acha pouco?
Nosso Senhor pensou bem e lhe
arrumou o lugar mais nobre na “Banda Celeste da Lagoa”.
TRÊS
PARTES
Uma fada desastrada decidiu
transformar todos os cururus em borboletas, por achar os bichinhos
muito feios e desarrumados.
Mas quando ela tocou aquele Cururu
com a varinha de condão, a varinha se partiu em três partes: a
primeira parte desfez o encanto, e os cururus que haviam virado
borboletas voltaram aos pulos; a segunda parte não fez nada e a
terceira transformou a fada numa rã para lá de encantadora!
VUPT,
VUPT, VUPT
Quando a véia Chica decide, está
decidido.
Naquela noite, a velha pegou linha
e agulha; ia costurar a boca do Cururu.
Lá pelas tantas do mato, ouviu o
fole do bicho. Véia Chica agarrou-o pelas pernas, prendeu-o nas mãos
e vupt, vupt, vupt...
Mas quando a velha foi rir – ao
invés de um riso frouxo - saiu foi um coaxo dos grandes. E toda a
saparia restante respondeu à altura.
O
QUINTO BEIJO
Era o quarto beijo que a menina
dava no Cururu e nada de o bicho virar príncipe.
— Pois bem, se queres assim, fique
Cururu até não poder mais... – falou, deixando-o quietinho.
Mas no meio da estrada, a menina
voltou. Quem sabe se o quinto beijo não quebraria o encanto? E
aplicou lá nele o beijo que faltava.
O Cururu agradeceu e pulou para o
ombro da menina e foi-se embora com ela até Mané dizer basta!
AS
SETE PELES DO CURURU
Uma vez, contaram que o Cururu era
filho do Rei. E o Rei e o Cururu acharam, por bem, acreditar. Daí,
foi um passo para o resto do mundo dar boas-vindas ao novo príncipe:
o trompetista, o flautista, o poeta real, a moça da sacada, a moça
dos cântaros e a velha do outro lado do rio.
Porém, quando o Cururu chegou ao
Palácio, o Rei pediu-lhe que ele retirasse as sete peles que o
faziam sapo. O Cururu disse “pois não” e pôs-se a retirá-las. Na
sétima pele, o Cururu permaneceu sapo. O Rei, com voz triste, falou
que aquele não era seu filho, que seu filho vivia sob sete peles de
cururu, como o amaldiçoara, há muito tempo, um gênio mau que por ali
passou.
O Cururu, então, abriu bem os
olhos e disse:
— Por que Vossa Alteza não retira
os sete mantos que o fazem Rei?
E assim despiu-se Vossa Majestade.
E no sétimo manto, o Rei levantou-se sapo. Imediatamente, todos que
estavam ao redor retiraram as “sete peles” que os encobriam: alguns
macacos viraram onças; outras onças viraram macacos; o trompetista
tocou flauta; o flautista, trompete; uma flor saiu-se borboleta e o
mundo inteiro tornou-se o que ele sempre quis, sem que ninguém
soubesse...
O
CURURU E A COBRA
Sem querer, o Cururu entrou na
casa da cobra:
— Amiga Cobra, sei que não custa
nada você me comer. Por isso estou à sua disposição...
Ora, um Cururu caído do céu e
ainda por cima todo oferecido era demais para a cobra (que o julgou
muito venenoso):
— Não sei, Cururu, já passou da
hora... e além do mais não como mais cururus...
— Que é isso, dona Cobra, assim a
Senhora me ofende! — respondeu o Cururu arregalando bem os olhos.
— Nada contra sua pessoa. O Sr.,
por favor, me dê licença.
E a cobra saiu muito ofegante, com
um medo danado de ser devorada por aquele Cururu.
UM
GUERREIRO ENCANTADO
Um dia, um guerreiro vestido numa
couraça e de lança em punho ficou preso nas pedras. Um lavrador que
por ali passava, ajudou-o a sair. O guerreiro agradeceu e sumiu.
No ano seguinte, a lavoura do
lavrador ficou, por cargas d’águas, empestada das maiores pragas.
Desanimado, o lavrador pôs-se a chorar.
Mas qual! Admirado, o homem viu um
ágil Cururu acabando com a farra das pragas. Feliz da vida, o
lavrador não sabia como agradecer ao distinto sapo.
— Nada tens que agradecer-me. Eu
sou aquele guerreiro a quem salvaste a vida tirando-o de entre as
pedras que o esmagava. Era um Cururu a quem um mau feiticeiro
transformara em príncipe, colocando-me debaixo das pedras, para que
alguém me salvasse e eu depois salvasse o meu salvador. Estou agora
desencantado. E eu é que devo agradecer.
Dito isto, levou o lavrador para a
sua lagoa, uma lagoa muito rica, e deu-lhe um alto posto.
PEGA-NÃO-PEGA
Guaxinim-vilão, há dias, que
estava na cola de Compadre Cururu: pega-não-pega, pega-não-pega. Até
que, cansados, os dois resolveram respirar um pouco à sombra de um
robusto juazeiro:
— Compadre Cururu, o Sr. nunca me
deu tanto trabalho! Por que essa agora?
— Acho que estou aprendendo,
Guaxinim-vilão, acho que estou aprendendo... — respondeu o Cururu
abrindo a boca de cansado.
E ficaram assim, um ao lado do
outro, respirando, debaixo do juazeiro, exaustos. E quando estavam
bem descansados, Guaxinim-vilão olhou para Compadre Cururu e
perguntou:
— Já está na hora, Compadre
Cururu?
— É, Guaxinim-vilão, acho que sim;
já está na hora.
E a perseguição começou novamente:
pega-não-pega, pega-não-pega, pega-não-pega... que sempre foi assim.
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