Fabrício Marques
Imagem contra Imagem
IMAGEM CONTRA IMAGEM. É disso que se
trata: no mundo contemporâneo, tudo e todos são devorados pelas
imagens, vorazes, cínicas, onipotentes e ilimitadas. Com o avanço
tecnológico, cada vez mais elas nos invadem, nós que estávamos
quietos em nosso canto.
E fechamos os olhos e reinventamos a
(nossa) vida, em uma cidade pequena. Depois que o mundo chega ao
fim, essa é uma boa imagem para começar de novo: um circo, o
picadeiro, e crianças como platéia, descobrindo a dança das letras
no caminho da pólvora.
Não se trata de nostalgia: é antes a
evocação de uma ética das imagens. Como escreveu Nelson Brissac
Peixoto, uma ética que dá tempo e lugar para as pessoas e as coisas.
Contra o ataque de qualquer veneno
disponível no campo do olhar, um tempo para apreciar o rumor das
imagens, como uma multidão de anjos e prostitutas no céu de
Apollinaire, ou o som de rodas na curva dos trilhos, ou a fantasia
da cor de Chagall. De Drummond toma-se emprestado o jardim botânico
habitado por ipês, risadas e a rosa do povo, nua; roubam-se de
evidências do impossível no labirinto branco da tela de Iberê
Camargo. Paramos pra perceber uma Havanola nas ruas de Cuba;
reparamos num conselho pregado no díptico: - ´se podes olhar, vê. Se
podes ver, repara’. Imagens em meio a imagens distorcidas, vistas
por olhos míopes...
Em 1949, Rubem Braga escreveu uma bela
crônica em que dizia: ´Fala-se muito em mistério poético e não
faltam poetas modernos que procuram esse mistério, enunciando coisas
obscuras, o que dá margem a muito equívoco e muita bobagem. Se na
verdade existe muita poesia e muita carga de emoção em certos versos
sem um sentido claro, isso não quer dizer que, turvando um pouco as
águas, elas fiquem mais profundas...´. Contudo, não se trata de
procurar esse mistério, envolto em asas pela metade em azul cobalto.
É que não vemos mais as imagens. São elas que nos olham,
desconfiadas, prontas para o bote. E, ao mesmo tempo, a memória
morreu.
Resta plantar uma nova memória e, a
partir daí, colher as imagens que clamam para ser lembradas. PAVIOS
CURTOS.
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Pavios Curtos,
Poesia de José Aloise Bahia, 100 páginas, anomelivros,
bhz, mg, 2004 |
* Fabrício Marques (Belo Horizonte/MG/Brasil)
é jornalista, professor, ensaísta, poeta premiado, Doutor em
Literatura Comparada pela UFMG, autor entre outros de Dez conversas:
diálogos com poetas contemporâneos (Editora Gutenberg, 2004) e
ex-editor do Suplemento Literário de Minas Gerais.
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José Aloise Bahia
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