Fabrício Marques
A volta do sátiro multimídia
Videodocumentário
e relançamento
da obra completa de Sebastião
Nunes colocam em evidência o autor
e artista gráfico mineiro
Omar Freire/"O Tempo"
Sebastião Nunes, 62,
exibe instalação que
embalava seu
"Décalogo da Classe
Média", de 98
FABRÍCIO MARQUES
ESPECIAL PARA A
FOLHA
(Folha de São Paulo, 16.12.2000)
Em um dos mais antigos
povoados das Minas Gerais, Sabará (a 25 km de Belo Horizonte), vive
o provocador artista plástico e escritor Sebastião Nunes, 62, num
sobrado de estilo colonial.
Tendo merecido a atenção
de autores como Sérgio Sant'Anna e dos críticos Silviano Santiago e
Flora Sussekind, o "ex-poeta" (Nunes deixou o gênero em 88 por achar
que, depois dos 50, o poeta "fica de miolo mole") pode agora
alcançar um público maior.
Ele é o tema do
documentário "Tião Nunes in Provocaçam", lançado na próxima quarta,
dia 20, na sala Humberto Mauro, em BH. Também está tendo toda sua
obra relançada pela editora Altana, após passar a vida à margem das
grandes editoras.
Essa revisão, que se
completará no ano que vem, começou em junho, com "História do
Brasil". Agora é a vez do recém-lançado "Somos Todos Assassinos".
A movimentação em torno do
escritor não se limita a esses eventos. Ele mesmo investe no projeto
de um média-metragem, com criações poéticas. Já produziu oito
minutos, com 16 animações. O grupo musical Tão e Qual, do também
escritor André Sant'Anna, cuida da trilha sonora.
"Não quero nada cheio de
efeitos, mas apenas animar meus poemas, recriá-los em outro meio, de
público mais amplo."
Outra atividade que ocupa
o seu tempo são as histórias para crianças, que começou a escrever
em 96 -motivado pela "liberdade poética" do sonho de uma das filhas,
Tetê, em que um velho dizia: "Ontem em dia passam muitos bebês
dirigindo carros nessa rua".
De lá para cá, escreveu,
diagramou e ilustrou ao menos 20 infantis, sob o codinome de
Sebastião Nuvens, muitos ainda inéditos. Por conta disso, fundou em
99, com amigos, a editora Dubolsinho, irmã caçula da Dubolso, que
abriga seus títulos "adultos".
Produção tamanha contrasta
com o "atoísmo", filosofia de cunho dadaísta que criou em temporada
no Rio, em 71. "Via filmes de graça no MAM, batia perna nas praias,
visitava galerias, ia à casa de amigos filar comida e bebida, enfim,
uma fase meio hippie."
Ex-publicitário, Sebastião
Nunes é crítico feroz também dos ex-colegas, membros efetivos dos
inclames (ou indivíduos classe média) a quem dedicou "Decálogo da
Classe Média", de 98.
Sempre sonhou em trabalhar
com literatura. "O atoísmo tem a ver com essa necessidade de tempo
ocioso para pensar, ler, escrever. Trabalhar desse modo sempre foi
uma necessidade vital." Costuma dizer que não escreve por vocação,
mas por necessidade. "Sem a necessidade visceral de fugir ao absurdo
que é nascer, trabalhar e morrer sem deixar rastros, nada de bom é
feito", afirma.
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