Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

 

 

 

 

 

 

 

 

Fernando Py


 


Ficção Variada


(in Jornal Tribuna de Petrópolis, 29.04.2001)
 

 

De uns anos para cá, diversos escritores brasileiros vêm apostando no conto mínimo, pequenas histórias que mal ultrapassam uma ou duas páginas, buscando o máximo de concisão possível em poucos parágrafos. O modelo inicial terá sido o do paranaense Dalton Trevisan, porém atualmente cresce cada vez mais o número de contistas que se dedicam a produzir esse gênero de ficção curtíssima. O gaúcho José Eduardo Degrazia é um deles e, depois de publicar A orelha do bugre (1998), já nos apresenta um segundo volume de contos mínimos, A terra sem males (Porto Alegre: Movimento, 2000, 80 págs.).

Ao contrário do que muitos poderiam pensar, o miniconto não é nada fácil. Exige que o autor tenha uma enorme capacidade de concisão e, levando-se em conta a exiguidade do espaço, saiba, em poucas linhas, narrar (ou expor um episódio) com toda a sua carga de verossimilhança e emoção, de tal maneira que a esse conto nada fique faltando nem sobrando coisa alguma. Nos textos de Degrazia observamos tipos variados de ficção, sejam contos que flagram um episódio da vida de um personagem, sejam histórias em forma de parábolas, às vezes definitórias de um sentimento, de uma sensação inexprimível, etc., tudo isso conduzido com mestria e exposto num estilo de quem domina o gênero à perfeição. Além disto, é grande a força poética dessas páginas, não fosse o autor igualmente um excelente poeta, tanto que alguns desses contos estão escritos em verso. A leitura dos minicontos de Degrazia é um exercício enriquecedor do espírito.

Também de minicontos é o livro de Nilto Maciel, Pescoço de girafa na poeira (Brasília, Bárbara Bela, 1999, 128 págs.). É um outro exemplo, muito bom, de histórias curtíssimas (raras são as que ultrapassam duas páginas), e o autor emprega igualmente modelos variados de ficção, indo das fantasias oníricas ao realismo mais cru, do flash mais imediato ao enredo desenvolvido em detalhes, tudo isto num estilo seguro, de quem domina às maravilhas o nosso idioma. E se muitas vezes se compraz em citações eruditas, tais citações se harmonizam de tal forma no texto que é como se sempre tenham feito parte dele. Não é de admirar que o livro tenha obtido o primeiro lugar na categoria conto, da Bolsa Brasília de Produção Literária em 1998, da Fundação Cultural do Distrito Federal. Vale a pena conferir.

Já as Pequenas histórias matutas, de José Hélder de Souza (Brasília, Verano, 2000, 126 págs.), apesar do título, não se enquadram necessariamente no gênero do miniconto. Embora curtas, não possuem aquela exigüidade e concisão próprias do gênero. Os contos deste livro antes narram episódios com riqueza de pormenores e uma mestria que prende o leitor, evocando saborosos lances do interior cearense, numa recriação extraordinária (para quem há mais de trinta anos reside em Brasília) da linguagem regional, em estilo vívido e matizado. Quando li seu volume de contos Rio dos ventos (1992), reparei que o autor expunha de preferência os aspectos cômicos e trágicos de seus personagens, o que veio cultivando através dos anos, sempre com muita dose de humor. Todo livro de José Hélder de Souza é satisfação garantida.

 


 

 

 

 


 

22/07/2005