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Nicodemos Sena

 

Entrevista concedida a Maria João Cantinho
(Revista Storm-magazine/ Portugal/2003)


 

Nicodemos Sena, nascido em 1958, jornalista de profissão, é um dos grandes escritores paraenses, aclamado pela crítica brasileira. Com a sua extraordinária saga “A Espera do Nunca Mais”, estreou-se na ficção, narrando as histórias da Amazónia com sedução, seriedade e muita poesia. Com a sua obra, recebeu o prémio Lima Barreto-Brasil 500 anos, da União Brasileira de Escritores, no Rio de Janeiro.
Escrito ao longo de sete anos, “A Espera do Nunca Mais” é uma lição magistral de exaltação da palavra, como igualmente de consciência ética da escrita e da responsabilidade do escritor. “Uma lição de literatura e de brasilidade”, como dele disse a escritora e crítica Olga Savary. O seu segundo romance, “A noite é dos pássaros” foi recentemente lançado em São Paulo e em Belém do Pará e apareceu, antes, em forma de folhetim, no jornal “O Estado do Tapajós” (Pará, Brasil) e na revista eletrônica portuguesa “TriploV”. Alguns excertos do romance foram publicados no “Dossier Amazónico” elaborado pela revista “Construções Portuárias” (nº01, 2002) e na revista “Palavra em Mutação” (nº02, 2003), ambas de Portugal, onde o romance será editado pela Íman Edições.


 

Maria João Cantinho – Em 1999, o panorama da literatura brasileira ficou marcado pela sua saga amazónica “A Espera do Nunca Mais”. Como romance de estreia, como guarda a experiência da sua escrita?

Nicodemos Sena – Eu tinha 41 anos quando foi publicado o meu primeiro romance. Um livro de 876 páginas! Muitas pessoas ainda me perguntam como pude, já na estréia, aparecer com um livro desse tamanho, e que logo de cara conquistou um prêmio nacional de literatura, o Lima Barreto, da UBE-União Brasileira de Escritores? Poucos sabem que escrevo desde pequeno. Aos 13 anos de idade, ainda morando na Amazônia, escrevi um romance que, sete anos depois, joguei fora por absoluta impossibilidade de revisá-lo, já que apresentava muitos defeitos. Eu era uma criança cheia de imaginação, mas ainda não tinha cultura literária para escrever um romance. Como quase todo adolescente, “cometi” também poemas românticos, que até foram publicados em “A Província do Pará”, então o maior jornal da Amazônia. Mas o meu veio “poético” logo secou. Nos quinze anos seguintes, já em São Paulo, enquanto estudava e trabalhava (e criava filhos, que cedo vieram), só me sobrava tempo para escrever histórias curtas, chegando até a ganhar um concurso de contos entre universitários, mas nunca me preocupei em reuni-los em livro. Como contista, eu tinha um sério problema: a história queria sempre continuar; era com certa relutância que eu concluía o relato. Por isso, talvez, apenas três contos sobreviveram, joguei quase todos no lixo. Depois de passar pela poesia e pelo conto, voltei ao romance, à história longa. Era como se eu quisesse refazer o romance que eu escrevera aos 13 anos. Aos 34, formado em Jornalismo e Direito, larguei praticamente tudo para me dedicar à literatura. Num país como o Brasil, de relativamente poucos leitores e milhões de analfabetos, a opção pela literatura parecia uma loucura – foi o que acharam alguns amigos. Pois foi como um louco que me lancei na aventura de escrever o romance que veio a se chamar “A Espera do Nunca Mais”. Até saí de São Paulo e fui morar em São José dos Campos, uma cidade menor, onde, sem que nenhum editor soubesse que Nicodemos Sena estava escrevendo um romance, lancei-me ao trabalho, que me consumiu sete anos: um e meio em pesquisa, quatro escrevendo e mais um ano revisando. Foi como meter-me num túnel escuro e profundo sem saber se teria fôlego para sair do outro lado.

M.J.C. – Foi um longo exercício de maratonista. Poderia descrever a caminhada?

N.S. – Busquei inspiração estética na própria geografia amazônica, com seus labirintos de rios, a selva intrincada, os cipoais, a lentidão que a tudo rege. Nessa geografia, não só os rios, mas também as idéias, os desejos, os projetos de vir a ser, tramam labirintos. Alguém já me disse que meus livros são “barrocos”. Sim, são barrocos, como barroca é a região em que se ambientam as histórias. Barroca, aberta e canibal. O tempo na cultura amazônica é algo bem particular, suave. As horas são medidas pelas luas, pelos dias de canoa ou de barco para chegar a tal lugar. Pela época da piracema, a época da desova. O homem amazônico, o homem dos rios, é fruto daquilo que o cerca. Na Amazônia, “o rio comanda a vida”. “A Espera do Nunca Mais” reflete bem isso; é um livro líquido, com grandes remansos. Como nas lendas e mitos indígenas, a linearidade da trama é apenas aparente, pois a história, ou as histórias, vão e voltam, e o narrador não tem pressa em acabar o que está contando.

M.J.C. – Não falámos nisso, mas será que Graciliano Ramos teve algo a ver com a sua aventura?

N.S. – Como leitor, iniciei-me com os românticos brasileiros e portugueses – José de Alencar, Joaquim Manoel de Macedo, Bernardo Guimarães, Camilo Castelo Branco, o “primeiro” Machado de Assis – de forma que a leitura de “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, quando eu tinha 15 anos de idade, foi uma verdadeira “paulada”. Até hoje, quando releio este pequeno grande livro, emociono-me. “Vidas Secas” (1938) conta a triste história de um casal de sertanejos, aviltados pelas mesquinhas condições de vida do campo, que procuram inutilmente cultivar. Fabiano, alma elementar, é subjugado pelo “soldado amarelo”, em cena de covardia. Quando sente que pode vingar-se, recua: “Governo é governo”. Mas, dentro daquela pobreza extrema, abre-se uma esperança para o casal infeliz, movido pela iniciativa da mulher, Sinhá Vitória – procurar região mais próspera: “E andavam para o sul metidos naquele sonho”.
Depois de Machado de Assis, Graciliano Ramos é, na minha opinião, o maior romancista brasileiro. Nele, a obra de arte cumpre sua função social, de não apenas entreter, mas principalmente “esclarecer as consciências e elevar a alma” acima de tudo o que é mesquinho. Mesmo num romance “psicológico” como “Angústia” (1936), ele não perdeu de vista o ambiente social. E nisso somos parecidos. Também mostro o homem simples engolido pela complexa trama social. Aprendi com Graciliano que um texto longo pode ser conciso, pode ser “líquido” sem ser aguado, amplo mas não esparramado, extenso mas não frouxo. Afora isso, somos bem diferentes. O texto de Graciliano é seco e sólido, quase pétreo, pois expressa a magreza gerada pela seca nordestina, enquanto o meu estilo é como a água que se amolda no espaço vasto e no tempo infinito da planície amazônica. Nos livros de Graciliano, as personagens expressam a aspereza do sertão, numa economia extrema; parece que o homem economiza até mesmo as lágrimas. Já as minhas personagens deixam-se levar, sem nenhuma pressa, pelas águas abundantes que brotam das cordilheiras e descem pelo Grande Vale; vou desfiando histórias que se cruzam, depois se bifurcam, e de novo se cruzam num lento e angustiante entrelaçar de pontas que terminam se juntando na mesma direção, como a labiríntica malha dos rios que vão desaguar no mar.

M.J.C. – Pode-se dizer que “A Espera do Nunca Mais” se situa em contra-corrente, relativamente ao que se faz no Brasil? O que o levou à escrita deste romance?

N.S. – Fernando Pessoa escreveu que a finalidade da arte não é agradar, mas elevar o homem por meio da beleza, erguer a alma acima de tudo quanto é estreito, acima dos instintos. Cervantes afirmou que o romance deve divertir e ensinar juntamente. Venho da Amazônia, um lugar de terríveis contradições. Ao lado da Amazônia paradisíaca, dos grandes rios e das florestas catedralescas, que desperta fascínio (e medo) em pessoas de todo o mundo, existe uma outra Amazônia – do genocídio do índio pelo branco, da exploração criminosa dos recursos naturais, do servilismo e escravidão, da destruição do antigo modo de vida nativo, sob o patrocínio do grande capital que invadiu a região nas últimas quatro décadas. A verdadeira face da tragédia que se chama Amazônia não é revelada ao mundo. Mostra-se apenas a terra exótica, de ninguém, espaço vazio e acéfalo a ser ocupado segundo planos elaborados pelos tecnocratas de Brasília ou do estrangeiro acumpliciados pelas corruptas elites locais.
Desde pequeno, convivi com a injustiça na região. Vi de perto a luta do pobre para sustentar a família, debaixo das piores humilhações; a guerra que é sobreviver nesse mundo, sem perder a dignidade. Dessa experiência de vida no paraíso/inferno amazônico extraí a matéria-prima usada no “A Espera do Nunca Mais”. Não escrevo apenas para divertir; também quero provocar uma reflexão sobre a “realidade”. Assumo, portanto, um compromisso ético. Não pode ser outro o comportamento do escritor numa sociedade que converte tudo (inclusive o imaginário) em mercadoria, uma sociedade que gera, em todos os setores da vida, inclusive nas artes, um certo “esplendor do vazio”; uma sociedade que avançou materialmente mas vai retrocedendo à barbárie; uma sociedade que cria consumidores de produtos descartáveis e não homens que valorizem as perenes coisas do espírito; uma sociedade da imagem, do espetáculo e do corpo, que valoriza o egoísmo e o sucesso a qualquer custo; uma sociedade urbana onde a palavra, que antes era sagrada e plena de sentido, chegou ao nível mais alto de estafa e esvaziamento; uma sociedade do “vale tudo” (tudo pelo mercado, tudo pelo sucesso, tudo pelo público), cuja lógica também tem condicionado a poesia e o romance. Infelizmente, muitos artistas acabam adotando os valores dessa sociedade. E a arte, que nasceu para questionar as aparências, revelar o oculto, esclarecer as consciências e elevar a alma, é convertida em mera diversão que aos homens imbeciliza. Diversão do “público”, que espera sempre coisas palatáveis. Ou diversão do autor, quando este se contenta com a “arte-pela-arte” ou se alheia “na linguagem”, esquecendo-se de que o artista, a arte e a vida precisam andar juntos.

M.J.C – Então não achas lícito desejar ser lido pelo maior número de leitores?

N.S. – Como artista, busco alcançar o “outro”, mas, quando me ponho a escrever, não penso no “leitor” ou no “público”, personagens imaginárias, que “não têm mais tempo para longas leituras”. Acho que um autor tem que correr riscos: não pode deixar-se escravizar pelos temas, ou pela exigência editorial, na esperança de agradar a quem o lê e obter sucesso de venda. O escritor precisa ser honesto naquilo que escreve e transparente consigo mesmo, obedecendo somente à sua própria consciência. No Brasil, país que possui um rico imaginário herdado dos índios nativos e dos africanos que foram trazidos como escravos, vem acontecendo uma sinistra “assepcia da imaginação”. Os escritores brasileiros precisam voltar a interessar-se pelo mítico e o antigo que estão na raiz da nossa cultura. Muitos romancistas, como mariposas atraídas pela lâmpada, na ânsia de agradarem ao público, deixam-se seduzir pelos temas mais explosivos, escrevendo textos que pouco diferem do relato jornalístico. No afã de integrar-se ao mundo civilizado, dito “moderno”, o escritor brasileiro, com poucas exceções, se esquece de que, faça o que fizer, será sempre um brasileiro.

M.J.C. – A globalização, em todo o mundo, tem sido o pior dos flagelos para a identidade cultural de cada país, não te parece?

N.S. – Sim. A perda da identidade nacional é uma das conseqüências funestas da globalização, uma verdadeira catástrofe. No mundo “globalizado” em que vivemos, podem até desaparecer as fronteiras visíveis da política e da economia, mas as diferenças do mundo invisível da cultura não se eliminam impunemente. Fica cada vez mais claro que o desprestígio da expressão local, das marcas do tempo, do vento e da terra, a pretexto de alcançar-se um elevado universal, não passa de imposição totalitária de culturas velhas, esgotadas, agonizantes. O mundo de cada um de nós é o mundo de todos os homens. O homem é o mesmo em qualquer parte do mundo. Podemos ser universais sem deixarmos de ser brasileiros (ou portugueses, ou italianos, espanhóis ou japoneses...), desde que o façamos com engenho e arte. Ouso afirmar que o “regional” e o “universal”, assim como a “humanidade”, em arte, não passam de abstrações vazias. Não existem. O que há é o ser humano concreto, que nasce, cresce e morre nalgum lugar. Captar esse homem, esse “outro”, que o próprio escritor traz dentro de si, com suas alegrias e tristezas, esperanças e decepções, heroísmos e vilanias, deve ser o objetivo do artista.

M.J.C. – A propósito dessa transformação do regional em universal, relembro aqui a obra de Vicente Franz Cecim, que é igualmente um caso de transfiguração da Amazónia e que, justamente, se transformou numa obra universal, considerando o seu universo mítico de Andara. Cecim é o único autor da Amazónia que chegou a Portugal, publicando “Ó Serdespanto” (Íman Edições, 2001). Mas existe uma constelação de escritores da Amazónia que nos é desconhecida, não é? Para nós, a quem apenas nos chega a literatura do Rio de Janeiro e de S. Paulo, que autores são importantes descobrir?

N.S. – Antes de falar dos escritores nativos, é bom lembrar que, até o século XIX, praticamente apenas europeus haviam escrito sobre a Amazônia – Gaspar de Carvajal, Cristóbal de Acuña, João Felipe Bettendorff, Luiz e Elizabeth Agassiz, Frederick Hartt, Alfred Russel Wallace, Carl Friedrich Philipp von Martius, Charles-Marie de La Condamine e tantos outros. Mais do que inventariar ou noticiar as maravilhas da nova terra, alguns estrangeiros pretenderam contar de forma “artística” as coisas do paraíso/inferno amazônico. Conan Doyle, Júlio Verne e Le Carré ambientaram histórias na Amazônia, produzindo páginas das quais não se pode afirmar que sejam o ponto alto de suas obras. O alemão Von Martius, com o material colhido em andanças pela Amazônia na primeira metade do século XIX, num momento de folga do seu trabalho de naturalista, escreveu “Frey Apolônio”, o primeiro romance ambientado no Norte do Brasil. A despeito dos defeitos de composição literária, o livro, ainda hoje, pode ser lido com interesse, pois Martius, que amava a Amazônia, era um excelente pintor de paisagens e costumes. Todavia, tais peças literárias fracassaram em seu intento de revelar ao velho mundo a fantástica realidade da nova terra, abrindo-se um abismo entre a imagem e a sua expressão. É que, nessas obras, o contexto invadiu o texto; a portentosa natureza amazônica fez o alienígena perder o ritmo e o fio da narrativa – talvez a única exceção à mediocridade dos textos escritos por europeus sobre a Amazônia seja a “Carta sobre o Tocantins” (1654), do padre Antônio Vieira.
“A Muhraida”, escrita em 1785 pelo tenente português João Wilkens, epopéia dos índios Muras do alto Amazonas, forjada nos moldes de “Uraguai” de Basílio da Gama e “Caramuru” de Santa Rita Durão, e publicada na mesma época, apresentando mais ou menos as mesmas virtudes e defeitos, não obteve, ao contrário das duas últimas obras, sucesso ou “fortuna crítica”. Mais sorte teve Ferreira de Castro, outro português, que escreveu, a partir de sua experiência de seringueiro no rio Madeira, o romance “A Selva” (1930), que se tornou repentinamente um “clássico”.
Depois dos estrangeiros, a Amazônia foi descrita por brasileiros de fora da região. O pernambucano Alberto Rangel escreveu o célebre “Inferno Verde” (1908, contos), com prefácio de Euclides da Cunha. O próprio Euclides, carioca, a exemplo do que já fizera com o Nordeste ao escrever “Os Sertões” (1902), legou-nos páginas inesquecíveis sobre a Amazônia, em “À Margem da História” (1909). O potiguar Peregrino Júnior escreveu “Matupá” (1933, contos), “Histórias da Amazônia” (1936, contos) e “Puçanga” (1930, contos). O carioca Gastão Cruls escreveu “A Amazônia Misteriosa” (1925, romance). O mineiro Oswaldo França Júnior - “De Ouro e de Amazônia” (1989, romance). Outro mineiro, Antonio Olinto - “Sangue na Floresta” (1992, romance). Partindo do mito amazônico de Macunaíma, referido por Koch-Grünberg num dos 5 volumes da obra “De Roraima a Orinoco”, o paulista Mário de Andrade escreveu a rapsódia de mesmo nome, onde fixa, de modo impressionante (embora questionável), a índole do homem Brasileiro, na face do “herói sem nenhum caráter”. Mais recentemente, o mineiro Aricy Curvello deixou-se enfeitiçar pelas coisas do Grande Vale; quando trabalhava para a Mineração Rio do Norte, que explora bauxita no rio Trombetas, escreveu o magnífico “O Acampamento” (1975), um dos melhores poemas do livro “Mais que os Nomes do Nada”.
A Amazônia, todavia, já pode se orgulhar dos seus próprios escritores, desde que Tenreiro Aranha (1769-1811), o mais antigo poeta autóctone, escreveu seus versos, a maioria extraviados no tempo. Alguns alcançaram até projeção nacional, como José Veríssimo, com “Cenas da Vida Amazônica” (1886), primeiro livro de contos amazônicos de que se tem notícia; Inglez de Souza, autor do clássico romance “O Missionário” (1891); Dalcídio Jurandir - “Chove nos Campos de Cachoeira” (1940); Benedicto Monteiro - “Verde Vagomundo” (1972, romance); Haroldo Maranhão - “Rios de Raiva” (1987, romance); Ildefonso Guimarães - “Senda Bruta” (1965, contos); Sant’Ana Pereira - “Invenção de Onira” (1988, romance) e Alfredo Garcia - “O Livro de Eros” (1998, contos). Mas é “Cobra Norato” (1931), do gaúcho Raul Bopp, o poema “amazônico” por excelência, a ele se ombreando apenas o “Repertório Selvagem” (1998, poemas) e “Berço Esplêndido” (2001, poemas), ambos de Olga Savary, e “Viagem a Andara, o Livro Invisível”, monumental obra ficcional e poética que Vicente Franz Cecim vem edificando há 23 anos.

M.J.C. – Achas que a política cultural dos dois países caminha no sentido de favorecer o intercâmbio cultural?

N.S. – Noto uma distância muito grande entre os dois países. A literatura portuguesa contemporânea é quase completamente desconhecida dos leitores brasileiros. No Brasil se fala muito de Fernando Pessoa e José Saramago, não apenas pela grandeza de suas obras, mas também porque outros, do mesmo porte, aqui não são editados. A distribuição das edições portuguesas é bem limitada. Desconfio que o governo português não tem desempenhado um grande papel no campo da divulgação da cultura e das artes portuguesas no Brasil. Os governos brasileiros, até onde eu sei, também pouco ou nada têm feito para levar a cultura e as artes brasileiras aos portugueses. Tem-se a impressão de que os dois países viraram de costas um para o outro. Ou será que estou enganado? Se pensarmos nos outros países de língua portuguesa, a coisa fica ainda mais complicada. Não contentes em não promover o necessário intercâmbio cultural, obstáculos absurdos à integração são criados, como, por exemplo, a recíproca cobrança de impostos sobre a entrada de livros em seus territórios, o que eleva o preço final do livro e inviabiliza a sua comercialização. A conseqüência principal dessa situação é o enfraquecimento da língua portuguesa, o nosso instrumento cultural mais importante.
 



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Albert-Joseph Pénot (French, 1870-?), Nude with red flowers in hair

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Juarez Leitão