Nilto Maciel
O campeão
Terminada a
competição, o repórter encontrou o campeão. Queria uma entrevista
exclusiva. E pôs-se a fazer os mais levianos elogios ao vencedor.
Comparou-o aos deuses da mitologia greco-romana. Chamou-o
super-homem.
Para surpresa
sua, no entanto, o campeão não só recusou os louvores, como tratou
de depreciar o próprio feito. Tudo obra de truques.
O repórter
sorriu, certo de estar ouvindo uma brincadeira de mau gosto. Afinal,
estava no exercício de sua profissão. Porém o entrevistando fazia
questão de estragar a festa, degradar a competição.
O jornalista
mal sabia, no entanto, que realizava a mais importante entrevista de
sua carreira.
– Minha vida
está no fim.
Nada mais podia
ser feito. Todos os exames denunciavam a doença mortal. Os mais
eficazes remédios só adiariam a morte.
Questão de dias.
– E como você
sente tudo isso?
– Eu me sinto
como o viajante com hora marcada para partir. Todos nós vamos viajar
um dia. A diferença entre uns e outros está em saberem ou não
saberem o horário da partida.
Embasbacado, o
repórter não fazia mais perguntas, enquanto o outro falava, sem
parar.
– Quem compete
se arrisca a trair, mentir, fraudar. E quem compete tem consciência
disso. Muitas vezes os melhores não participam de competições.
Preferem ser os melhores apenas para si mesmos. E para aqueles que
não vão às arenas aplaudir os gladiadores. Assim, o melhor poeta não
é o ganhador do Prêmio Nobel.
Com certeza o
homem delirava ou enlouquecera. Talvez a emoção da vitória tivesse
perturbado os mecanismos centrais de seu cérebro. Precisava
repousar, dormir.
– Não quero
falar da Igualdade, porque ela se confunde com a Utopia. No entanto
posso continuar falando da mentira, da traição, da fraude. Posso
dizer, por exemplo, que nas competições todos se igualam:
competidores, julgadores e espectadores.
– Vá dormir,
campeão.
– Há ainda a
competição primordial, entre o ser e o não-ser. E esta é sem
significado, completamente inútil.
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