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Regina Ribeiro


 


Rápido feito veneno

(Jornal O Povo, 06 de maio de 2006)

 



Conto até Dez é uma coletânea de textos produzidos por dez autores e organizada pelo escritor pernambucano Marcelino Freire. O livro faz parte dos lançamentos que marcam um década da Ateliê Editora

 

Texto curto não é necessidade dos dias que passam. Nem deve ser escrito porque o leitor não pode, nem consegue ficar diante de palavras que se encadeiam formando frases e frases e ele imaginando como que terá sido o episódio. Texto curto também não é o que foi cortado pela metade nas mãos de um editor que tem preocupação única: imprensar o escrito no espaço tal, de forma de faça algum sentido. Dependendo da hora, nem que seja sentido visual. E tem mais um: os textos menores também não são aqueles desprovidos de profundidade ou coisa que o valha. Às vezes está nos diálogos, com frases entrecortadas por coisas não ditas, o que mais importa por uma vida inteira.

Um texto curto é justo aquele que tem o tamanho que deveria ter. Tais e quais os que foram editados no livro - pequeno mesmo - Conto até Dez, organizado pelo escritor Marcelino Freire, editado pela Ateliê Editorial. O número "cabalístico" da coletânea é dez. Como os dedos das mãos. Ou aquelas dez idéias fixas que você não tira da cabeça há tempos.

Os textos são rápidos. E mesmo com essa pressa toda - que não é aquela pressa de passar adiante sem fôlego, mas aquela distensão do tempo própria da vida que corre - tem conto que segue o ritmo de uma trajetória de 50 anos.

A narrativa é enxuta, dispensa atalhos para se fazer entender. Como em A última tentação do monge, de Ademir Assunção. Nele, o monge é tentado por uma serpente. Não seja por isso: "A serpente disse ao monge que o mestre estava mentindo. As águas eram límpidas e a mulher banhava-se todas as tardes em seu leito. O monte cortou a serpente ao meio com a espada. Agora, eram duas serpentes". Assim, delicadamente rápido. O efeito é vagaroso e bom.

Em Dez anos, de Ivana Arruda Leite, uma avalanche de sentimentos cabem em frases tão curtas que a eternidade parece caber na palma de uma mão. Mas é pura ilusão de poeta. "Quem merece viver cem anos? - perguntei (...) Quando tempo ainda viverei sem que o telefone toque e seja ele me dando os parabéns, achando que estou cada vez mais moça? E eu que pensei que, depois da morte de Marcos nada mais me abatesse".

Márcia Denser, em Horizontes, sai tangendo um conto sôfrego numa linguagem que às vezes chega a ser impiedosa. Sem ponto, nem sossego. Uma Saramago. "porque sou eu quem vai ao encontro do destino que mora - e continuará morando, esperando - no Paraíso. Mas eu fui e voltei. Eu ontem ontem e seriam 23:58 nos relógios da Paulista, 23:55 no farol da Casa Branca com Peixoto Gomide, porra, deviam estar andando ao contrário, contando o tempo que perdi ou já passou...". E por aí vai. Ou outros, dêem uma olhada, ou melhor lida. E releiam pelo tempo que for necessário.

SERVIÇO
Conto até Dez. Organizado pelo escritor Marcelino Freire. Ateliê Editorial. 82 páginas. Informações pelo site www.atelie.com.br

 



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08/05/2006