Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

 

 

 

 

 

Rodrigo Magalhães



A volta do pato. Mais um. De chita.

 

 

Caiu-me no colo: escrever sobre um pato. Não sobre o pato ordinário da ciência, mas sobre aqueles patos antigos, imaginados, que se colorem na infância. Patolino, Pato Howard, Pato Donald – os naturais e os excluídos de Patópolis.

   E fazia tempo que eu não via um pato assim. Porque eu me criei entre essas fantasias, mas elas, perdidas, não me visitam mais. 

  “Que é isso, vô?” – apontava um esticado no chão. “Embuá”. A voz grave cumprindo a descoberta: embuá. Acocorado, horas a fio, os olhos fixos iluminando o embuá. Ele subia as paredes, eu não entendia. Ele, tantas pernas, não tropeçava, eu não entendia. Havia, ainda há, muita inocência para as perguntas. “Que é isso, vô?” – a lagartixa acesa. “Que é isso, vô?” – a joaninha amiudando.

  O novo pato chegou para esses deslumbramentos. Chegou para as crianças propriamente ditas e para as nossas, de dentro. Chegou em linguagem de poeta para o entendimento do menino. O Pato de Chita, como o Pato Donald, não veio só.Trouxe o cachorro Toti, o Sol trovador, uma Maria, o Mestre Jabuti e as águas – muitas e pingando. E a aventura do pato é múltipla: ora corre em verso, ora se estira em prosa, ora cordeliza o metro, ora se concretiza... concreto. E há momentos vários, Bandeira, em que um poema fala de manias do Belo Belo: um pássaro vem e bica/a manhã clara//balança/as asas//vai/o pássaro//minha vó chama da cozinha//já vou vó//ao pé da saia. E o menino de dentro, lendo pelo adulto de fora, arrepia-se. Amiúde.

  O livro, acima de tudo, cumpre a sua função: a de devolver. Devolve um rosto encantado à infância. Devolve o cheiro das guloseimas, os enredos de Lobato, as cores dos almanaques, a quem se deixou crescer. Chega com autoridade de livro, sem abandonar a graça de brinquedo.

  “Vô, lê a Fazendinha pra mim!”, “Olha quanta fruta!/Manga, pitanga, oiti,/abacate doce, sapoti,/maçã, pêra, uva nos cachos,/tudo de jenipapo pro ar!...”.

 

Rodrigo Marques, ago/2003

Leia Rodrigo Marques

 

 

 

 

 

17.05.2006