Rodrigo Magalhães
A volta do
pato. Mais um. De chita.
Caiu-me no
colo: escrever sobre um pato. Não sobre o pato ordinário da ciência,
mas sobre aqueles patos antigos, imaginados, que se colorem na
infância. Patolino, Pato Howard, Pato Donald – os naturais e os
excluídos de Patópolis.
E fazia
tempo que eu não via um pato assim. Porque eu me criei entre essas
fantasias, mas elas, perdidas, não me visitam mais.
“Que é
isso, vô?” – apontava um esticado no chão. “Embuá”. A voz grave
cumprindo a descoberta: embuá. Acocorado, horas a fio, os olhos
fixos iluminando o embuá. Ele subia as paredes, eu não entendia.
Ele, tantas pernas, não tropeçava, eu não entendia. Havia, ainda há,
muita inocência para as perguntas. “Que é isso, vô?” – a lagartixa
acesa. “Que é isso, vô?” – a joaninha amiudando.
O novo pato
chegou para esses deslumbramentos. Chegou para as crianças
propriamente ditas e para as nossas, de dentro. Chegou em linguagem
de poeta para o entendimento do menino. O Pato de Chita, como o Pato
Donald, não veio só.Trouxe o cachorro Toti, o Sol trovador, uma
Maria, o Mestre Jabuti e as águas – muitas e pingando. E a aventura
do pato é múltipla: ora corre em verso, ora se estira em prosa, ora
cordeliza o metro, ora se concretiza... concreto. E há momentos
vários, Bandeira, em que um poema fala de manias do Belo Belo: um
pássaro vem e bica/a manhã clara//balança/as asas//vai/o
pássaro//minha vó chama da cozinha//já vou vó//ao pé da saia. E
o menino de dentro, lendo pelo adulto de fora, arrepia-se. Amiúde.
O livro,
acima de tudo, cumpre a sua função: a de devolver. Devolve um rosto
encantado à infância. Devolve o cheiro das guloseimas, os enredos de
Lobato, as cores dos almanaques, a quem se deixou crescer. Chega com
autoridade de livro, sem abandonar a graça de brinquedo.
“Vô, lê a
Fazendinha pra mim!”, “Olha quanta fruta!/Manga, pitanga,
oiti,/abacate doce, sapoti,/maçã, pêra, uva nos cachos,/tudo de
jenipapo pro ar!...”.
Leia Rodrigo Marques
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