Iracema M. Régis
Psi, a penúltima
Retorno à
leitura do livro de poesia "Psi, a penúltima", 252 páginas, Soares
Feitosa, poeta cearense, Edições Papel em Branco - Salvador - Bahia,
que classifico de jovem Poeta, por ter começado a escrever e editar
sua poesia há tão pouco tempo; e de poeta maduro, entrado nos anos,
pelo fato de sua obra, tão profunda, retratar a grandeza de um autor
universal, dado ao ofício de toda uma vida.
Essa retomada
da leitura embebedou-me de alegria mais uma vez e provocou-me reação
diferente: no primeiro momento. ao debruçar-me sobre a poesia de
Soares Feitosa, ocorreu-me logo chegar ao final do livro e expressar
minha opinião sobre o mesmo. Ledo engano, pois o breve passar d'olhos
não me satisfaria e a presunção de emitir pontos de vista, conceitos
ou algo semelhante, caiu por terra. A empreitada é longa e
prazerosa, sem pressa de chegar a lugar algum, o que possibilita
fazer pausas, tomar gosto e até tecer certos comentários, como me
animo a fazer: aprecio sobremaneira várias nuances do fazer poético
de Feitosa - a gama de informações transmitida, muitas vezes num
fragmento de poema é complementada através de "notas de rodapé",
que, no "Psi, a penúltima", transformam-se em páginas tão saborosas
quanto os versos. Essas notas explicativas nos põem em contato com o
inundo real do artista, que no poema transmuda-se em ficção. O poeta
elucida o leitor a respeito de termos e expressões regionais por ele
largamente utilizados, e também nos coloca lado a lado com as. suas
vivências pessoais, fatalmente as da infância. Falando da família,
dos amigos, da ambiência, da chuva, do sol, das enchentes, dos
acidentes geográficos, da fala do povo, contando histórias de menino
e outras coisas miúdas, que passariam despercebidas para a maioria
dos mortais, o autor faz um retrato da cultura regional nordestina,
mas não de forma isolada: situa a sua história no universo pessoal
de cada um de nós.
Prosseguimos
nossa excursão pelo tecido artesanal de “Psi” (sim, porque todo o
livro é uma obra de artesanato) Além da inovadora disposição do
texto - títulos e versos. pasme o leitor com essa intervenção entre
as páginas 172 e 173, Soares Feitosa plantou um punhado de sementes
de imburana-de-cheiro, acondicionadas num saquinho de papel, onde
está escrito "Conteúdo: sementes de imburana-de-cheiro torradas e
moídas pelo próprio autor. Sem conservantes nem produtos químicos. A
mancha oleosa, por fora do envelope, é do próprio óleo essencial da
imburana. Pode cheirar"). É o imprevisível. a surpresa gostosa, como
a poesia tratando ora de um assunto, outra de outra, um feito de
humanidade, um flash de vida, que nas mãos do poetas maior
converte-se em algo profundo, suscetível a questionamentos, porque
uma vez o poema feita, criado, é um objeto de arte.
Por tudo vê-se
um autor à vontade, que vai da linguagem mais simples do homem sem
cultura, à Grécia de Platão; do real ao imaginário presente nestes
versos de Convite à Saudade “[...] mestre besouro olhou e olhou/,
avoou de uma árvore a outra,/ fez um cocuruto de vôo, mais alto,/
voltou num rasante e disse: - Compadre Moleque, não vi nada,/ e se
tivesse visto lugar tão bonito, como você sempre fala,/ onde corre a
Grota da Palha,/ onde tem sabiás - árvores cheirosas -,/ onde tem
sabiás - pássaros amigos/ que não comem besouros pretos -/ eu
também, compadre Moleque,/ teria voado para lá...”
A viagem
continua.
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