Ariadne Quintella
A poesia de Soares Feitosa
Palavras, vazios, sinais. Signos e simbolismos. Idéias. Estes elementos estão
presente na poesia de Soares Feitosa, que em diferentes momentos desloca-se
no espaço e se aproxima do romanceiro, que moldou a expressão poética ocidental.
Foi aos 50 anos que esse autor despertou para a literatura, através
da poesia. Nela, o cruzamento de imagens que após passar por um demorado
processo de maceração, brotaram de repente sem que o autor se apercebesse.
Não importa buscar qualificacões para a composição poética de Soares
Feitosa, ou ter preocupação de encaixá-lo entre os poetas concretistas.
Oportuno mesmo é descobrir o que se esconde lá dentro, numa miscigenação
de idéias quase sempre carregada de simbolismo e que revela os seus valores.
O corpo da Mãe Terra, como diria Millie Uydert, está vivo e foi construído
segundo o mesmo padrão cósmico do homem que ela carrega no colo. E foi
justamente essa energia telúrica, capaz de criar os verdadeiros artistas,
que impregnou o espírito de Soares Feitosa, fazendo-o retroceder, em
determinados momentos, ao seu pé-de-serra, escondido no mapa do Ceará.
Importam as distâncias se a vida é a mesma em toda parte?
Daí ele fazer o contraponto entre o sertão onde nasceu e a Grécia para onde
é levado pela mesma estrada. Os deuses do Olimpo ocupam seu imaginário ao lado
da raposa, esquálida, cinza, fulva, até do sibite que é nosso compadre e
tem filhos para criar.
O autor nos conduz por ravinas, malocas e locas, tocas, ocas e precipícios,
onde é comum a presença de espinhos, garranchos e pedregulhos. Numa linguagem
rica em metáforas, a poesia de Soares Feitosa também é uma denúncia, embora
aquele jogo de palavras seja, aos olhos do leigo, ilógico. Na figura dos
engodos e das esperanças, do sofrimento e da resistência, das desigualdades
sociais do urso panda e da raposa, o primeiro alimentado a pires de leite
e nectarinas e a outra, vítima de perseguição no Maciço do Baturité onde
a água, quando aparece, é sempre música e a comida é pouca para dividir
com os bichos.
Apesar da adversidade, sobrevive a resistência do homem nordestino nos versos
soltos de Soares Feitosa, porque fugir não é destino. É fugaz alternativa
do ficar e lutar.
Depois, quem pode escapar do estigma de ser nordestino, baiano ou
paraíba ? A resistência do autor foi forjada muito cedo e alimentada
pela luz do sol que ofusca de brilho esta região. Por conta disso,
ele não despreza as papas de farinha de trigo que comeu, a carne de
bode, a coalhada e os cheiros e sons da infância. A lagartinha
removeu lentamente as dunas e fez desmoronar tudo, mas Almofala
é a cidade ressuscitada pela mesma lagarta que habita o imaginário
do poeta. Ali hibernam as primeiras inquietações da adolescência
num universo de sortilégios e onde a inspiração vagueia do tema
lírico ao filosófico, para fazer valer a força da palavra que
desabrochou em verso.
Mas, como diz o próprio poeta, nada é último, só Ele quando voltar,
resta ao leitor aguardar e ver que esta edição não seja definitiva.
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