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Cláudio Manoel da Costa
Sonetos
VI
Brandas ribeiras, quanto estou contente
De ver-vos outra vez, se isto é verdade!
Quanto me alegra ouvir a suavidade,
Com que Fílis entoa a voz cadente!
Os rebanhos, o gado, o campo, a gente,
Tudo me está causando novidade:
Oh! como é certo que a cruel saudade
Faz tudo, do que foi, mui diferente!
Recebi (eu vos peço) um desgraçado,
Que andou até agora por incerto giro,
Correndo sempre atrás do seu cuidado:
Este pranto, estes ais com que respiro,
Podendo comover o vosso agrado,
Façam digno de vós o meu suspiro.
VII
Onde estou? Este sítio desconheço:
Quem fez tão diferente aquele prado?
Tudo outra natureza tem tomado
E em contemplá-lo, tímido, esmoreço.
Uma fonte aqui houve; eu não me esqueço
De estar a ela um dia reclinado;
Ali em vale um monte está mudado:
Quanto pode dos anos o progresso!
Árvores aqui vi tão florescentes,
Que faziam perpétua a primavera:
Nem troncos vejo agora decadentes.
Eu me engano: a região esta não era;
Mas que venho a estranhar, se estão presentes
Meus males, com que tudo degenera!
XIV
Quem deixa o trato pastoril, amado,
Pela ingrata, civil correspondência,
Ou desconhece o rosto da violência,
Ou do retiro a paz não tem provado.
Que bem é ver nos campos, trasladado
No gênio do Pastor, o da inocência!
E que mal é no trato, e na aparência
Ver sempre o cortesão dissimulado!
Ali respira Amor sinceridade;
Aqui sempre a traição seu rosto encobre;
Um só trata a mentira, outro a verdade.
Ali não há fortuna que soçobre;
Aqui quanto se observa é variedade:
Oh! ventura do rico! oh! bem do pobre!
LXXII
Já rompe, Nise, a matutina Aurora
O negro manto, com que a noite escura,
Sufocando do Sol a face pura,
Tinha escondido a face brilhadora.
Que alegre, que suave, que sonora
Aquela fontezinha aqui murmura!
E nestes campos cheios de verdura
Que avultado o prazer tanto melhora!
Só minha alma em fatal melancolia,
Por te não poder ver, Nise adorada,
Não sabe inda que coisa é alegria;
XCVIII
Destes penhascos fez a natureza
O berço em que nasci: oh! quem cuidara
Que entre penhas tão duras se criara
Uma alma terna, um peito sem dureza!
Amor, que vence os tigres, por empresa
Tomou logo render-me; ele declara
Contra o meu coração guerra tão rara,
Que não me foi bastante a fortaleza.
Por mais que eu mesmo conhecesse o dano,
A que dava ocasião minha brandura,
Nunca pude fugir ao cego engano:
Vós, que ostentais a condição mais dura,
Temei, penhas, temeis, que Amor tirano,
Onde há mais resistência, mais se apura.
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