Caio Porfírio Carneiro
A invenção poética de Majela
Colares
Com estes dois livros de poemas,
Outono de Pedra (Giordano, SP, 1994) e O Soldador de Palavras
(Ateliê Editorial, SP, 1997), Majela Colares, firma-se no contexto
da nova geração de poetas brasileiros.
Outono de Pedra constata e evidencía a
saga de um povo, a sofrida gente nordestina. O autor, em versos
vibrantes e coloridos exibe, uma consistência poética exuberante.
As metáforas, a diversificação
rítmica, a expressão criadora, que vai da balada ao visual plástico,
encantam e seduzem.
Apesar de todo o aparato cênico e
beleza metafórica, a poesia de Outono de Pedra guarda uma dimensão
impressionista: a imagem vem ao vivo e instantaneamente. Por mais
que poeta disfarce – e disfarça bem num jogo lúdico curiosíssimo – a
memória da terra, do homem e do tempo perdido é muito forte. Pouco
temos visto petas cantar nosso dias e seu passado perdido com tanta
dignidade criadora, como se observa em passagem como esta, em Outono
de Pedra:
Muros sombrios, limites
fantasmas de coronéis
No subsolo gargalham
choramingam velhas mágoas
na memória do porão
sopra um vento frio e brando
com o cheiro melancólico
condensado nas narinas
pesadelos ancestrais
(muita terra, poucos donos
de tão longe este refrão)
Nos poemas de O Soldador de Palavras,
Majela Colares soma, com incrível habilidade, a melhor vanguarda com
a melhor tradição lírica. E sempre aquela referida ressonância de
balada, que encanta em qualquer poesia. Suas “preocupações
técnicas”, de que fala César Leal, tem sutilezas tão filigranadas
que se tornam tangenciais ao longo do seu como dizer poético.
A essencialidade técnica, visual e
rítmica, só vem ao vivo e vai à alma do leitor se o poeta for poeta.
Pois, do contrário, tudo vira “laboratório”.
A poesia deste poeta é de nobreza
simples, aquela simplicidade “difícil” que está em Drummond, em
Pessoa, em Murilo, em Jorge de Lima, até em Bandeira, quando Majela
se mostra mais descritivo: “MEIA FACE DE SOL – A TARDE FINDA / NOS
LIMITES DO CÉU E DA CALÇADA...” (pg. 32).
Toda essa “difícil” simplicidade se
percebe ao longo de muitos poemas de O Soldador de Palavras, poemas
de dimensão e grandezas próprias, de variada roupagem e variação
estética. “Um poema de passagem” (p.45), reflete com precisão esta
simplicidade “difícil” – já observada anteriormente – no domínio da
palavra:
Tinha a voz da palavra em teu silêncio
e a presença.... tinha imagem,
eram sombras – um poema de passagem
tinham formas rondando o pensamento
no semblante uma miragem
eram rastros – um poema de passagem
tinha um gesto pousado sobre a fonte
neste gesto uma linguagem
eram versos – um poema de passagem
José Alcides pinto afirma, com
clareza, em recente apreciação critica sobre a poesia de Majela,
que: “nada nesta poesia soa arbitrário, comprometendo-se seu rigor
obsessivo unicamente com a poesia, longe de toda previsibilidade,
com a construção de uma voz própria na esteira de seu discurso, ao
mesmo tempo, nitidamente pautado pela tradição”.
Assim percebemos a invenção poética de Majela Colares.
* Ficcionista e crítico
literário
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